INVASÃO DE PRIVACIDADE

Entre conversa de vizinha, Dona Rute garante que Tonico ainda é bom de cama. Reflete um pouco e corrige: “Era, melhor dizendo, porque hoje só pega no tranco, e olha lá!" Poucas noites deixavam passar em branco. "Ah, Aqueles tempos!" E suspira com saudade.

Agora ficam até quinze dias em jejum e ficariam um mês, ou mais, se ela não tomasse a iniciativa, obrigando-o, praticamente. Parece mentira! E cochichando para si mesma: “Acho que ele tem uma amante”.

- Como disse, Dona Rute?

- Oh, desculpe! Estou aqui, falando comigo mesma. É que os tempos mudam, né?

Na última vez em que tentaram dar uma zinha, há duas semanas, teve que se valer de um truque baixo: estavam a sós, era uma tarde chuvosa. Ela dera uma dúzia de indiretas, insinuara-se de mil e uma maneira e ele nada. Suspeitou até que seu velho, como dizia, estivesse ficando brocha, ou pior ainda. Já ouvira falar de homens que viraram a mão depois de velhos. Teria que testá-lo.

Uma amiga, que vivenciava o mesmo drama, andara fazendo experiências sobre o fenômeno e passou-lhe o segredo.

Dona Rute, a princípio, riu-se da amiga, mas como estava a perigo e disposta a resolver o problema, acabou concluindo que valeria a pena. Isso lhe custava. Ficava ruborizada com a ideia, que ao mesmo tempo a excitava.

Não contaria nada jamais a ninguém.

Foi ao quarto, pegou o cd que a amiga lhe emprestara e que escondera sob o colchão, para não correr o risco de que algum filho visse e pensasse besteira. Correu os olhos pelas fotos mais provocantes, da capa e aquele calorão, de corroer as entranhas e que só nos bons tempos sentia, tomou-lhe de assalto, completamente. Abanou-se toda, suspirou alto, se benzeu. Se ao menos tivesse um daqueles consolos de viúva, que a revista anunciava, para uma ocasião como esta, caso o marido não correspondesse às expectativas.

Esse pensamento ia de encontro a seus princípios e ficava ruborizada. Mas voltava a pensar, como extremo recurso, caso o velho pendurasse a chuteira para valer.

Voltou à sala decidida a levantar o moral do marido, que agora dormia de boca aberta e roncava. Colocou o disco no aparelho, bem à frente dele e o ligou. Dirigiu-se ao banheiro, tomou banho, vestiu uma camisola transparente, bem sensual e se achou bonita, desejável, ainda. Pôs o perfume que ele gostava e quando regressava à sala, encontrou-o já no corredor, agitado. Tomou-a ao colo de qualquer jeito e carregou-a para a cama. Na afobação, apenas abriu a vista do pijama. Ela, apesar de extremamente excitada, não esqueceu o crucifixo da cabeceira. Sempre que faziam essas bobagens, virava o Cristo de cara para a parede. Era o que estava tentando fazer. Com a visão coberta por Tonico, no entanto, que roncava em cima, parecendo uma locomotiva e lhe dificultava os movimentos da mão, só tocava no santo, balançando-o de um lado para o outro e o danado não virava.

Nessa luta, Tonico soltou um gemido rouco, mais forte e caiu para um lado, resfolegando feito um pato. Para ele estava resolvido.

Dona Rute teria que esperar pelos menos mais quinze dias, se tivesse sorte.

Para garantir, mudou o Cristo de quarto.

MCSobrinho
Enviado por MCSobrinho em 05/06/2020
Reeditado em 08/06/2020
Código do texto: T6968705
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