A Filha Substituta

A casa já não era mais a mesma desde que a filha se fora. Insistira para que ela aguardasse ao menos até concluir os estudos, mas tudo em vão: Ruth estava empolgada com a possibilidade de poder trabalhar antes mesmo de se formar.

- Não entende, mãe? Tenho que aproveitar essa oportunidade de ganhar experiência... e algum dinheiro!

- Mas é no Canadá! - Protestara, tentando inutilmente fazer valer sua autoridade de mãe. - E você vai perder as férias de verão.

- Aqui é Búfalo, mãe - replicara Ruth, rindo. - Basta atravessar uma ponte, e estamos no Canadá. E quanto as férias... não foi você mesma quem vivia dizendo que eu deveria planejar passar algum tempo no estrangeiro?

O Canadá, definitivamente, não contava como "estrangeiro", pois como Ruth dissera, nem estaria assim tão longe; além do que, prometera vir em casa de 15 em 15 dias, pelo menos.

Acabou concordando, a contragosto.

Os primeiros dias de ausência foram os mais difíceis, depois lentamente foi se adaptando à nova rotina: tomar café da manhã sozinha, jantar sozinha. Às vezes ia almoçar no centro da cidade, só para poder ter alguma companhia. Se o marido ainda fosse vivo, a solidão seria mais suportável, e pegou-se pensando o que faria depois que Ruth se fosse em definitivo.

Aquilo parecia ser uma prévia da sua vida futura, e foi então que concluiu que precisava de alguma atividade que preenchesse seus dias.

* * *

A campainha da porta tocou. Ela foi atender. Viu-se diante de uma jovem pouco mais velha do que Ruth, roupas simples, sorriso franco, uma bolsa grande de viagem no chão.

- Bom dia, eu sou Abigail - identificou-se a moça.

- Abigail... ah, sim! Eu sou Imogen - estendeu a mão para a recém-chegada. - Fez boa viagem?

- Sim, fiz, o trem é bastante confortável - declarou Abigail.

- Entre, por favor.

A jovem pegou a bolsa e a acompanhou para dentro de casa, olhando ao redor como que fazendo um reconhecimento do ambiente.

- Você vai ficar no quarto de hóspedes, lá em cima - disse Imogen apontando para a escada que levava ao andar superior.

- A senhora disse que tem uma filha - indagou Abigail.

- Ruth. Arranjou um emprego de verão no Canadá - explicou Imogen, subindo à frente da hóspede. - Deve vir aqui em algumas semanas, aí você poderá conhecê-la.

- Quando a senhora falou que tinha um quarto para alugar, achei que fosse o dela - ponderou Abigail.

- Ah, não. Ruth vai voltar - afirmou Imogen. - Mas eu queria uma companhia... a casa ficou muito grande para uma pessoa só.

- A senhora não teve outros filhos?

- Não. Só a Ruth mesmo. Pronto, esse é o seu quarto - disse Imogen, abrindo a porta do quarto de hóspedes.

Abigail parou sob o batente, apreciando o cômodo.

- Acho que vou gostar de morar aqui - declarou.

- Seja bem-vinda - replicou Imogen com um sorriso.

[Continua]

- [24-07-2020]