ELITE - AURORA, 2º ato

Ele era comunista, jovem, doutor recém-formado. De volta à cidade natal, encontrou uma fila de moçoilas casadoiras, ansiosas por serem eleitas sua esposa. Seu coração revolucionário, porém, levou seus sentidos a descobrir uma jovem que se escondia ao avistá-lo. Que mistérios ela guardava?

Não sossegou até obter algumas informações sobre ela quando, então, o desassossego aumentou, dando asas à sua imaginação, levando-o a pensar o quão corajosa ela seria, desbravadora do tempo e do espaço, conhecedora dos próprios desejos, disposta a pagar o preço que fosse para ter sua dignidade respeitada.

Aproximar-se dela lhe exigiu tempo, paciência, algumas flores e cartas, além da mediação da família que a acolhia. Isso tudo fazia seu interesse aumentar e os receios dela diminuírem. O primeiro encontro foi tímido, como de praxe naqueles tempos, às escondidas. Os demais tiveram que permanecer ocultos, pois a família do jovem doutor jamais aprovaria sua união com moça já desvirginada, mãe de duas crianças, fugida do pai e do marido, de origem humilde.

À medida que se conheciam, ele percebia que tudo o que havia imaginado sobre ela era fato. Ela experimentava, pela primeira vez, o carinho correspondido, a paixão recíproca, a sintonia no vibrar dos corpos, das emoções, dos olhares.

Ficaram juntos até a morte. As quatro crianças que nasceram dessa união, cresceram com as duas que já estavam lá. Todas participaram da cerimônia de casamento, após Aurora tornar-se viúva.

Talvez alguns leitores estejam pensando ser este um conto de fadas. Eu mesma, ao escrevê-lo, tive essa sensação. De tão bonito, inusitado, vibrante, ficamos a duvidar que mortais possam ser felizes assim, sendo guiados por seus corações que desafiam a lógica. Lembremos, no entanto, que são as fadas que nos imitam, tentando a todo custo ser corajosas como nós.