OS VENTOS

Os ventos

Os ventos são como pensamento, vêm e vão, uns fortes e te arrastam, outros são boa brisa, outros ainda chegam em um momento propicio de tanto calor, alguns te resfriam tanto que você adoece, quantas vezes deveríamos falar com nosso amor e guardamos as palavras, quantas vezes deveríamos guardar as palavras e falamos, naquele dia feliz eu a esperava na porta do banheiro, estava com o gosto amargo da cerveja na boca, aos cinquenta anos você tem que parar de beber por um motivo ou outro.

Ela tocou o cabelo ao sair do banheiro, depois mexeu na bolsa, estamos sozinhos, paramos em um café, existe um silêncio, o que não quer dizer que não falamos nada, é que de alguma forma os pensamentos são falas frenéticas.

-Quantas? - ela perguntou.

-O quê?

-Quantas de adoçante?

-Três – respondi, mesmo sabendo ela só coloca duas, ela me pergunta, depois de ouvir a minha resposta faz aquele olhar.

Levantamos, olho para o celular para ver que horas são, está quase na hora de partir.

-Tem certeza?

-De que?

-Dessa loucura de viajar assim... é uma loucura?

Ela pergunta pegando o meu braço.

-Sim e não. - disse sorrindo.

-Tá bom - ela sorri também – essa viajem custa caro, podemos desistir ainda falta muito tempo para o voo.

-Até parece que você quer desistir...

Ela deu de ombros e disse:

-Não sei, talvez pensar na velhice seja mais razoável?

-Para que serve o dinheiro? O velho que serei é mais importante do que o homem que sou agora?

-Acho que sim, ele é a garantia de mais tempo, pode estar fraco, talvez esteja doente.

-Ele será forte se eu for forte ou será um velho arrependido.

Ela bateu no meu ombro, talvez concordando ou talvez com vontade de dizer que eu era muito burro para entender o principio da realidade.

Esse era o momento que não pensava em dinheiro, e também não fazia o contraponto ao exercício de realismo da mulher que amava, sei que nesses anos juntos esse "pé no chão" já nos salvou tantas vezes.

Olhei o pôr do sol pela vidraça, já estávamos na área de embarque, os filhos crescidos e distantes, dava uma saudade nessa hora

-Estão bem, não se preocupe. - ela disse.

-O tempo passa de uma forma tão rapidamente cruel.

Ainda existia tanto amor que a vida tornou-se um lugar pequeno.

-Agora é aguentar umas cinco horas para os elefantes de aço voarem – disse, enfatizando o meu horror a voar.

-Hurum... e você vai ficar bem quietinho que quero dormir.