CORDEIRO EM PELE DE CORDEIRO

Era uma vez um casal de cordeiros, Everaldo e Anastácia, que já estavam juntos há algumas estações. Eles eram muito felizes. Tudo era como uma relação entre cordeiros deveria ser.

Numa bela manhã, Anastácia percebeu que Everaldo parecia angustiado com alguma coisa:

_Everaldo, o que aconteceu?

Ele respirou fundo, mas não disse nada. Anastácia insistiu:

_Tem algo para me contar, querido?

_Não, é só que... num sei se eu digo.

_Você sabe que pode falar qualquer coisa pra mim, né?

_Sei, amor. É que é meio complicado.

_Estou esperando...

Everaldo tentou achar palavras, mas recuou:

_Ah... não consigo. Deixa pra lá.

_Não vou me contentar até descobrir. Você sabe como sou curiosa, né?

_Eu tenho que contar, mas não sei se você entende.

_Se você me falar eu entendo.

_Depois a gente se fala, Anastácia. Agora é hora dos machos tomarem banho.

Os machos tomavam banho de manhã, e as fêmeas de tarde. Essa era uma das leis do rebanho. Anastácia, que estava disposta a fazer de tudo para descobrir o que era, decidiu então ir até o riacho para escutar o que Everaldo conversava com os amigos.

Chegando lá, para surpresa dela, não encontrou seu namorado junto dos outros machos. Foi então procurar discretamente em partes mais distantes do riacho. De longe avistou um cordeiro à beira do riacho.

Ao se aproximar um pouco, viu que não estava em pé, nem deitado, mas esticado no chão. “Meu Deus, é o Everaldo morto!”, pensou. Enquanto corria desesperadamente em direção ao cadáver, lágrimas escorriam de seus olhos e eram levadas pelo ar que batia em seu rosto.

Em pratos e com o coração pulsando forte, Anastácia abaixou-se e beijou seu companheiro. Começou a ser tomada por crises existenciais enquanto acariciava-o carinhosamente com seu rosto.

Até que ouviu:

_Anastácia?

Era a voz de Everaldo. “Pronto. Agora estou tendo alucinações!”, e chorou mais. Ouviu novamente:

_Anastácia! Está fazendo o que aqui? Por que chora tanto?

Percebeu que a voz não vinha do cadáver, mas do riacho. Ficou então procurando de onde vinha a voz. Ela soou de novo:

_Eu estou aqui, Anastácia.

Avistou algo saindo do riacho. Era, sim, a voz de seu namorado. Mas Anastácia se assustou ao ver o corpo de onde saia a voz. Perguntou:

_Quem é você? O que fez com o Everaldo?

_Sou eu. O que está acontecendo?

Everaldo estava tão confuso com a presença de sua namorada ali, que demorou a entender o que se passava. Quando, enfim, caiu a ficha, explicou:

_Anastácia, calma. Era isso que eu tinha para te falar.

Com a expressão mais confusa que se possa imaginar, Anastácia não conseguia falar nada, apenas esperou ele continuar:

_Essas manchas vermelhas pelo meu corpo são uma doença de pele. Elas fazem meus pêlos caírem. Por isso uso esse casaco perto de você.

Com a vista embaçada pelas lágrimas, Anastácia não havia percebido que o que parecia um cordeiro esticado era somente um aglomerado de fios.

_Quer dizer que por sua culpa fiquei aqui me derramando em lágrimas, e ainda fui enganada sobre essa doença horrorosa por tanto tempo?

_Benzinho, eu ia te contar...

_Agora é tarde! Se tivesse contado não teria me magoado tanto. Nunca mais apareça na minha frente.

Anastácia chutou o casaco que há pouco beijara. Everaldo jogou então sua última cartada:

_Mas, mas... Volta aqui! Não é contagiosa!

Moral: Para quaisquer tipos de relacionamentos darem certo, não é bom que tudo seja mostrado, mas é essencial que se saiba o que está sendo escondido.

Cláudio Theron
Enviado por Cláudio Theron em 06/12/2007
Reeditado em 12/01/2008
Código do texto: T767214
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