TUDO, NUM SEGUNDO, NADA.

Estava encostado a porta da entrada, num dia normal, de uma semana normal, sem maiores pesares ou grandes esperanças, quando não se espera nada além do que a rotina leciona, as surpresas não tem lugar, e só aguardam que o protocolo diário seja cumprido, sem mais e sem menos. Gastava o pouco tempo livre que seu itinerário lhe reservava conversando futilmente sobre assuntos sem importância, que naquele momento, eram a melhor maneira de deixar a mente livre da tecnicidade exigida nos momentos de afazeres. Falava sobre futebol, as noticias de destaque que provocassem preocupação nas pessoas de qualquer canto do mundo, exceto ali, exceto naquele momento de descontração, observava as pessoas que ali passavam, sem se perguntar quem eram, ou o que sentiam, simplesmente olhava uma e outra pessoa, geralmente as que chamassem mais atenção, seja pela beleza ou pela ausência dela, seja pelas roupas ou pelo simples necessidade social de cumprimentar os conhecidos que se aproximassem. Balançava os braços, coçava a cabeça, se espreguiçava despretensiosamente. Mal sabia que num instante, tudo mudaria, mesmo estando alheio a tudo que por ventura pudesse provocar a mudança repentina daquela situação. A essa mudança, sem motivo e sem autor, dão o nome de acaso, porem, há aqueles que não se conformam com essa definição demasiada simples e por sua vez bastante cômoda, preferem atribuir tal mudança a qualquer manifestação metafísica que de alguma maneira se correlacione com os seus protagonistas em alguma linha do tempo ou universo paralelo. Destino. Sim, o destino, insufla romantismo e esperanças naqueles que nele confiam. É, por sim, ele, o causador de todos os fatos inesperados. Para contento dos leitores e brevidade do texto que já se delonga, ater-me-ei aos fatos. Estava ele, portanto, naquele instante, gozando da mais pura ociosidade, dignas apenas dos velhos aposentados que nada fazem a não ser burlar todas as filas em que puderem entrar. Quando de repente, ela surgiu, saindo de uma sala próxima e tomando a sua direção. O primeiro nome era Milena, os demais ignorava completamente. Ainda que não fosse e, mesmo estando bem longe de ser, era ela a criatura mais perfeita que habitava a vastidão do planeta. Nem alta, nem baixa, a pele alva, parecia ter luz própria, e contrastava fascinantemente com os longos cabelos, tão escuros e brilhosos quanto uma Ágata Negra lapidada. Silhueta esguia, caminhar flutuante. A delicadeza emanava de todo o seu ser, rosto delgado e olhos tão grandes. No instante em que a viu, arregalou os olhos, suas mãos esquentaram, e a chama da ansiedade, que nunca se apaga dentro do peito, já se transformara num fogaréu incontrolável, que o consumia na mesma velocidade com que ela se aproximava, seu coração disparou, arrepios estremeciam sua espinha desde a base até o topo da cabeça, que estava quente, imediatamente gotas de suar cobriram-lhe a face. Ela era maravilhosamente linda, mesmo sabendo que a opinião geral não era essa, não se importava, era sim, perfeita, no jeito de andar, flutuando suavemente com seus pés pequeninos. Inusitadamente seu perfume se adiantara, chegando antes dela ao encontro, um aroma floral doce e angelical, digno apenas das frutas maduras que só se colhem nos jardins dos deuses. Além do perfume, o vento ainda a agraciou com um leve movimento nos longos cabelos, um afago gracioso dedicado a toda sua beleza pela própria natureza. Cada detalhe nela era perfeito. Quando se aproximou o suficiente para iniciar um dialogo e os olhares finalmente se encontraram, só tinha aquele segundo da atenção dela para dizer tudo que pensava naquele momento, mas só conseguiu dizer um fraco, tímido e quase inaudível:

-Oi Milena!

[rh.03.12.07.23:17]

Ricardo Henrique
Enviado por Ricardo Henrique em 08/12/2007
Reeditado em 30/12/2007
Código do texto: T769999