Leitão à pururuca

Comunicavam-se pelo estômago.

- Você vem almoçar domingo aqui em casa?

A outra fez que sim, aproveitou para convidar para um cafezinho aquela mesma noite, na sua casa.

O domingo veio, o almoço foi lauto, a outra convidada não se despediu sem ter certeza de que a anfitriã iria a sua casa na quarta pra jantar. E ficou acertado um piquenique pro domingo seguinte.

- A gente leva farofa e frango. Vocês, o arroz e as frutas... Ou, quem sabe, é melhor fazer tudo lá, hein, que nem guisado de criança? Já fez?

- Com panelinha de barro... E quantas vezes...

Os maridos aceitam e acatam as opiniões femininas. Tiram do bolso, sem reclamar, o dinheiro das compras. E conversam sobre o Brasileirão.

- Quem puxa esse ano é o Inter, não?

- Sei lá, o Palmeiras não tá mal.

O certo mesmo é que se fará empadinhas e pastéis. Agora programam o aniversário do caçula de D. Duca.

- E não se esqueçam das guaranás... Vocês têm cascos?

Um dos maridos ri e diz:

- Meu cavalo tem.

Dona Maria do Rosário não gosta da brincadeira do marido, põe língua e segue a conversa:

Bom, o que importa é que no Natal vão matar a leitoinha. Talvez façam leitão à pururuca. Tá que é uma pipa. Dá até água na boca só de pensar,... assadinha, limões, pimenta...

- Será que fica bom com pimenta, Rosário?

Dona Maria do Rosário acha que sim e aproveita para ensinar a D. Duca a receita de bolo que uma prima, confeiteira de primeira em Jaguapitã, mandou pelo correio.

- Bom, então, Rosário, até domingo no almoço.

- Ué, esqueceu que vem aqui na sexta pra me ensinar a assar o pernil?

Na sala, os maridos se despedem. Ficou quase acertado que o Inter será o campeão, ameaçado de perto pelo Palmeiras. Mas o Cruzeiro também tem chances.

Quanto aos brigadeiros, os cajuzinhos para o caçula, as patroas decidiram que vão mandar fazer fora, que fica mais barato. E sobra mais tempo pra caprichar nas roscas da rainha.

Quando o marido de D. Rosário foi transferido para Brasília, Cascavel acabou. D. Duca tinha perdido sua única amiga, sua confidente, seus braços e suas pernas. Não havia mais ninguém para trocar receitas. Nas primeiras semanas de solidão, ficou com medo de entrar em parafuso. A solução era continuar cozinhando e ligando quase todo dia. Mas telefone ficava muito caro e não era a mesma coisa.

William Santiago
Enviado por William Santiago em 23/02/2023
Reeditado em 01/03/2023
Código do texto: T7726041
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