Vidas Breves III

Suas forças estavam acabando e ela mal conseguia se mover. Sua respiração, lenta e forçada não resistiria muito mais tempo, talvez nem o suficiente para o que desejava. Seu último e derradeiro desejo, ver pela primeira e última vez sua única cria.

Depois de todas as dificuldades ela havia chegado lá, naquele hospital público que todos chamavam de "açougue", mas que não era nada daquilo. As pessoas ali eram tão atenciosas..., tão profissionais. Todos falando com ela e tentando alegrá-la de alguma forma, mas ela mal conseguia focalizar os rostos à sua frente. Sentia sua vida se esvaindo com o sangue que já se acumulava na maca, às suas costas, molhando todo o avental. No meio da confusão ela ouvia o choro de uma criança, sua criança, que havia acabado de nascer.

Pensou em tudo que havia passado em sua vida, sozinha com o pai. Sua mãe havia morrido durante o parto e ela nunca a conhecera, deixando assim, uma grande lacuna a ser completada em sua vida. O pai tentara suprir essa falta, mas lhe era impossível, pois trabalhava feito um burro de carga para sustentá-la. Disso nunca pôde reclamar, o velho nunca deixou faltar nada que lhe fosse necessário. Agora, ali estava ela, como sua mãe esteve há vinte e três anos. Parecia um problema hereditário, sua avó também falecera da mesma maneira.

Quando fechou os olhos, se entregando ao seu destino cruel, pedia a Deus com toda a força que lhe sobrara que Ele a houvesse presenteado com um menino.