A FUGA E A SABEDORIA

Doloridas e marcadas pelas marés revoltas de agressões, Albertina sentiu uma fúria interna despertar. "Basta", sussurrou ela, as mãos cerradas em punhos trêmulos. O resquício de uma família quebrada, manchada pela traição e pela indiferença, era agora um eco distante, uma lembrança amarga que lhe empurrava em direção à decisão drástica que estava prestes a tomar.

Sob o véu da madrugada, enquanto as estrelas eram as únicas testemunhas do seu ato, ela se afastou da morada que deveria ser um lar e se aventurou para longe, determinada a escapar das amarras de sua história. A estrada de terra se estendia à sua frente, iluminada pelo pálido reflexo da lua. A névoa abraçava o caminho como se tentasse deter seu avanço, mas Albertina estava impulsionada por uma mistura de raiva e esperança.

Exausta, faminta e sedenta, ela finalmente sucumbiu às sombras de uma floresta densa. Seu corpo frágil cedeu à exaustão, e ela se viu caindo em um sono profundo. Enquanto seu corpo descansava, sua mente embarcou em uma jornada inesperada.

A floresta se abriu diante dela como um portal para um mundo de beleza irreal. Uma mesa farta com alimentos suculentos, taças transbordando de líquidos dourados e pedras preciosas cintilantes encheram seus olhos. Albertina sentiu-se deslumbrada, como se estivesse diante de um sonho que ela nunca ousou ter. Uma voz suave, como um vento sussurrante, atravessou o ar.

"Desfrute deste refúgio, por aqui você é bem-vinda para se saciar e descansar", disse a figura luminosa à sua frente, que se apresentou como Luzia.

Os momentos de encanto se dissiparam tão rápido quanto vieram. A realidade cruel da floresta retornou, e tudo o que Albertina viu e sentiu evaporou. A escuridão cobriu a beleza, as pedras preciosas perderam seu brilho, e a lua se escondeu timidamente.

O sol nascente penetrou o abrigo improvisado onde Albertina havia se recolhido. Uma voz conhecida, misturada com preocupação e alívio, chamou por ela. A névoa da ilusão se desvaneceu, e a verdade crua de sua situação a atingiu. Ela estava de volta ao seu mundo, aos olhos preocupados de seu pai traído, Hamilton, e à presença de uma prima que lhe transmitia uma mistura agridoce de sarcasmo e experiência.

Albertina acordou para uma nova perspectiva. A fuga não havia sido apenas uma fuga física, mas uma jornada interna que a levou a um encontro consigo mesma. O encontro com a sacerdotisa Luzia, embora fugaz e talvez até um mero sonho, iluminou caminhos ocultos em seu coração.

Os sete dias que se seguiram foram de aprendizado e reflexão, como se a floresta e a sacerdotisa Luzia ainda a envolvessem em seus ensinamentos. As palavras de sabedoria deixaram um rastro em sua alma, transformando-a de uma menina ferida em uma mulher determinada, com uma força interior que transcendeu suas circunstâncias.

Então, quando a prima Luzia a acordou de seu devaneio, Albertina respondeu com um sorriso tranquilo. "Sim, é hora de buscar a água na fonte", ela disse, levantando-se com um novo propósito. Seus olhos refletiam uma centelha de sabedoria além de sua idade, e a força que ela encontrou nas profundezas das sombras a guiaria para um futuro que ela estava agora pronta para enfrentar

Mc Marcos Viana
Enviado por Mc Marcos Viana em 31/08/2023
Reeditado em 02/10/2023
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