Nunca no Brasil

     Encontram-se, de manhãzinha, por acaso, na porta do hospital:

     - Surpresa, fazendo o que por aqui?

     - Esperando meu irmão. Fez uma cirurgia na rede pública, na época da Covid, e deixaram a traqueia aberta. Hoje vem pra fechar.

     - Ahn?! O que?

     - Verdade. Ali vem ele. Depois conto em detalhes, temos hora marcada, precisou até da Justiça. Tchau!

     Vira-se para seguir caminho e avista uma senhora conhecida, andando em sua direção:

     - Uê, hoje é dia de ver os sumidos. Que tá fazendo aqui?

     - Vim assinar o documento que aprovou minha cirurgia. A da hérnia, colocar a tela, a que te contei...

     - Uê, outra cirurgia?

     - Não, a mesma. Só que agora é que autorizaram. Um pequeno detalhe: era urgente, já fiz há um ano e meio, em hospital particular... Mas tenho de vir aqui assinar que fui informada da autorização na rede pública. Se eu quiser operar de novo... O que você acha? 

     Não, isso não foi no Brasil, claro que não. Esses dois estão delirando, inventando coisas. Gente da oposição. Continua a caminhada matinal, encontra o Niltinho:

     - E aí?

     - Beleza. Novidade?

     - Olha o que escutei agorinha na porta do hospital...

     Niltinho ouve, mas não dá tempo de piscar, emenda com sua história:

     - Mas então escuta essa...

     E ele, depois de ouvir o relato inimaginável:

     - Não acredito: levaram a menina pra fazer cirurgia no braço esquerdo e fizeram no direito?

     - Simplesmente assim.

     Ainda bem que isso só acontece na Dinamarca, Noruega, Suécia, Suíça e outros lugares menos adiantados, nunca no Brasil.

 

Nota: os relatos apresentados são, lamentavelmente, baseados em fatos verídicos. Não representam, no entanto, a regra de comportamento padrão do servidor público na área da saúde.