Garoto arranja emprego

- Darryon, acorde! Você vai se atrasar para o colégio!

Darryon despertou sobressaltado, com a mãe batendo na porta do seu quarto. Gemeu. Estava no meio de um sonho tão bom, que envolvia uma boazuda da escola...

- Já ouvi, mãe! - Gritou de volta. - Estou acordado!

Disfarçando a frustração, afastou o lençol e a colcha e girou o corpo para sentar-se na cama. Olhou para o relógio digital na mesinha de cabeceira: sim, iria se atrasar se não cuidasse logo da vida.

Quinze minutos depois, já vestido, o rapaz sentou-se na mesa da cozinha, onde a mãe, Joyce, já havia servido o desjejum à espera dele. Ela sentou-se diante do filho, uma caneca de café nas mãos.

- Você foi dormir tarde ontem à noite - sentenciou. - Não sei pra quê tem um rádio-relógio, se nunca levanta quando ele toca.

- Acho que faltou energia durante a madrugada, - desconversou Darryon - e ele perdeu a programação.

A mãe tomou um gole de café e balançou a cabeça, antes de responder.

- Parece que isso vem acontecendo muito ultimamente. Sabe, você não vai poder contar comigo pelo resto da vida para fazer o serviço de despertador, filho.

Darryon encarou a mãe, apreensivo:

- Mãe... você está com algum problema de saúde?

Joyce riu baixinho.

- Não que eu saiba, Darryon; mas não é disso que estou falando. Acho que está na hora de você começar a ter responsabilidades; e com isso não estou me referindo apenas a levantar na hora, mas também a ajudar nas despesas da casa.

Darryon continuou a mastigar um pedaço de panqueca, enquanto ouvia a mãe em silêncio.

- As contas não se pagam sozinhas, você sabe. Eu tenho o meu emprego, mas as gorjetas na lanchonete não estão boas; aliás, nada anda bem desde que elegeram aquele bagre.

Darryon sabia que a mãe estava se referindo a Ronald Reagan, embora não soubesse de onde ela havia tirado a expressão "bagre".

- Bom... no que eu posso ajudar, mãe? No fim do ano, termino o secundário e...

- Creio que você poderia começar a trabalhar em alguma coisa agora, antes mesmo de terminar o colégio - sugeriu ela. - Nem eu, nem seu pai, gostaríamos de ter que antecipar isso, mas seu pai não está mais conosco, portanto somos só nós dois pra remar nessa canoa.

Darryon balançou a cabeça afirmativamente, embora estivesse temeroso do que a mãe iria propor. Finalmente, ela deixou claro o que tinha em mente:

- A barbearia do senhor Foster. Você poderia começar como aprendiz, depois das aulas; e quando terminar o colégio, iria para uma escola de barbeiros.

Darryon conhecia bem a barbearia de Ambrose Foster, pois afinal de contas, era lá que ele e boa parte dos homens do bairro cortavam o cabelo. O pai também era um frequentador habitual, e provavelmente teria gostado de ver o filho num emprego convencional; todavia, Darryon não estava tão certo de que aquele era o seu destino manifesto.

- Não sei mãe... não consigo me imaginar trabalhando como barbeiro - ousou pensar em voz alta.

- Consegue se imaginar como chapeiro, lá na lanchonete? - Questionou Joyce, num tom surpreendentemente duro. - Aliás, estão precisando de lavador de pratos. O que você escolhe?

Darryon terminou por reconhecer que um futuro num salão refrigerado e perfumado parecia bem mais promissor.

Na fim da tarde do dia seguinte, a mãe o levou até a barbearia, que estava com talvez um terço das cadeiras ocupadas, dado a hora. O próprio Ambrose Foster, um homem na casa dos sessenta anos, cabelo ralo e já inteiramente branco, fechou o jornal que estava lendo e veio recebê-los.

- Como eu prometi, senhor Foster - disse Joyce com um sorriso. - Aqui está o Darryon.

- Senhor Foster? - Disse o rapaz, estendendo a mão, a qual levou um aperto caloroso.

- Fez a coisa certa, garoto! - Foster concluiu o cumprimento com um tapinha amistoso nas costas dele. - Você pode começar amanhã, depois da escola?

- Bem, sim senhor - declarou Darryon, um tanto surpreso com a velocidade dos acontecimentos. - Mas o que exatamente eu vou ter que fazer?

O dono da barbearia fez um gesto amplo abrangendo o salão.

- Inicialmente, deixar tudo limpo por aqui. Não se deixe enganar pelo pouco movimento de agora, aqui costuma ficar bem cheio à noite; vou precisar de alguém varrendo, trocando os lenços de pescoço, lavando os banheiros, esse tipo de coisa. Eventualmente, você vai ter que ir até a pizzaria, buscar alguma coisa pros rapazes comerem, caso o expediente vá até mais tarde. Ficou claro?

Bastante claro, pensou Darryon, apenas balançando a cabeça. Ambrose Foster precisava de um faz-tudo e pelo visto, a mãe o havia anunciado como alguém pronto para enfrentar o desafio. Diante do silêncio do rapaz, o barbeiro-chefe acrescentou, num tom motivacional:

- Trabalhe duro e será recompensado!

Ainda não haviam falado em valores, mas Darryon tinha plena certeza de que haveria muito trabalho esperando por ele.

- [23-03-2024]