De ônibus é melhor

Envolvi minha esposa num abraço forte e sussurrei-lhe ao ouvido para abrir as pernas, no que ela atendeu prontamente. Em seguida pedi-lhe para ficar de costas, ela retrucou, preferia estar de frente. O tempo estava abafado, dia de verão, pela manhã fez um forte calor e agora à tarde ameaçava chover, as janelas estavam abertas, não havia vento para amenizar o desconforto, o suor escorria pelo rosto, pelo corpo inteiro, continuávamos abraçados, beijei levemente seu pescoço, seu ombro, tentei tornar a viagem para casa menos estressante. Era hora do rush, o ônibus estava cheio, todos apertavam-se mutuamente, éramos sardinhas enlatadas, pelo menos era como me sentia. Abracei-a todo o transcurso da viagem para protegê-la do esfrega-esfrega dos passageiros, uns sem intenção, outros nem tanto.

Nós tínhamos deixado o carro na concessionária para a revisão semestral, voltávamos para casa de ônibus, fomos forçados a escolher este horário, pois estávamos saindo dos nossos locais de trabalho. Não tínhamos outra opção. Minha esposa tirou folga no dia seguinte, devido a dificuldade em chegar ao trabalho, pois tinha de pegar três transportes, de carro chega em quinze minutos.

Era umas três horas da tarde quando entramos no ônibus, na ida para a concessionária, íamos pegar o carro. O ônibus estava quase vazio, vários bancos livres a escolher, sentamos, envolvi-a com meu braço sobre seus ombros e, durante todo o trajeto, fomos conversando, por que não dizer, fomos namorando, nem notamos a proximidade do ponto de descida, passamos direto, descemos no ponto seguinte, caminhamos uns três quarteirões de volta, rindo da situação, nada nos tirou o humor e a alegria. Na concessionária ainda aguardamos umas duas horas até liberar o carro. Ficamos na poltrona, ora conversando, ora bebendo água, ora assistindo televisão.

Após os acertos financeiros recebemos o carro, minha esposa dirigia, como no dia anterior a tarde estava abafada, muito calor, prenunciava chover, abri a janela do meu lado para refrescar, sentimos o carro, estava melhor, sempre depois de uma revisão o carro parece que cria um novo ânimo.

Durante o trajeto fomos conversando, nem percebermos que a conversa tomou um rumo desagradável, transformando-se em discussão, de repente parei, pensei, não encontrei um bom motivo para estarmos discutindo, fiquei sem acreditar naquela situação, interrompi minha esposa em suas conjecturas nada suaves e, calmamente, disse:-lhe: ---- Sabe que andar de ônibus é melhor? Peguei-a de surpresa, ela não quis entender o que eu estava dizendo, apenas deu uma risada meia de deboche e, replicou: --- Então vá você de ônibus, se quiser paro no próximo. A raiva ainda estava em sua voz, ela pensava que eu queria debochar dela, então respondeu no mesmo tom. Continuei, calmamente, minha declaração:
--- Sabe por que andar de ônibus é melhor? Andar de ônibus é melhor porque, quando ele estar lotado, agente se agarra um ao outro, queremos proteger um ao outro, fiquei com ciúmes de você, não queria que nenhum daqueles marmanjos se esfregassem em você. Andar de ônibus nos aproxima, não ligamos se estamos suados, suor escorrendo pelo corpo inteiro, o incômodo do empurra-empurra, o mal cheiro de pessoas saindo do trabalho, viajamos mais de uma hora abraçados e nem reclamamos. Agora, não faz nem vinte minutos que estamos neste carro, você num banco eu noutro, começamos a discutir, não estou vendo motivos para tal.

Passamos o resto da viagem sem conversarmos.

À noite, em casa, nos reconciliamos, prometemos um ao outro não vender o carro, nem discutirmos mais, então envolvi minha esposa num abraço forte e sussurrei-lhe ao ouvido para.... ela atendeu prontamente.