Cabeça Cheia

Chego em casa exausto. Sento no sofá e ainda nem começo a tirar os sapatos. Apoio os cotovelos nos joelhos reclinando o corpo para frente em seguida esfregando as mãos no rosto como se tivesse acordando de um pesadelo.

“Quem dera se eu pudesse acordar disso tudo.”, penso. As palavras ecoam em minha cabeça, vagando nas paredes do meu crânio latejante. Viver sempre foi estranho demais para mim. Tenta-se por anos ter uma vida decente, formar uma família, criar um legado, essas coisas... mas para que tudo isso? Não vamos morrer um dia? Então por que nos sacrificamos tanto para melhorar a vida?

“Preciso de um psicólogo...”, minha cabeça volta a me perturbar - talvez eu realmente precise. Afinal, estou de novo me questionando sobre os motivos de por que estou vivo e isso não é boa coisa. Talvez minha depressão esteja querendo voltar só para destruir o que sobrou da minha vida; isso explicaria a falta de ânimo.

Pego na minha carteira o cartão do meu psicólogo, uma ou duas consultas e eu melhoro, desabafar sempre é bom. Em seguida pego o telefone... mas não consigo discar.

“Preciso mesmo disso?”; quanta contradição uma mente humana pode gerar? Devo ter sérios problemas de espírito (ou seria apenas psicológico?), parece que estou sonhando (ou seria um pesadelo?). Culpa minha, é o que ganho por me isolar de tudo e todos. Faz anos que não tenho um relacionamento amoroso decente, estou longe da família e nem entro mais em contato com amigos.

“Eu não quero a ajuda deles... Nunca quis.”, dessa vez penso por mim mesmo. Ninguém nunca me ofereceu ajuda antes e eu nunca pediria nada para um bando de hipócritas. Posso me virar sozinho, sempre fiz tudo por mim mesmo, superei as piores dores da minha vida com a companhia da minha solidão.

“Quer passar o resto da vida sozinho?”. Talvez... Qual o problema? Tudo bem que é impossível viver isolado no mundo de hoje, mas a sociedade anda uma bosta mesmo. Violência, corrupção, caos... Essas coisas que causam depressão em massa. Não entendo como se consegue viver numa sociedade dessas, preferiria me ver morto...

“Todos morrem um dia...”; acho que estou sendo repetitivo, mas é verdade. E assim voltamos àquela questão: “Pra que vivemos?” Não existe um motivo exato para nossas vidas. Até poderia dizer que a religião existe pela falta de um motivo na vida das pessoas... e Ele não existe. Se existisse por que criaria uma raça inteira cheia de indivíduos que andam por aí sem nunca ter feito nada de bom na vida? Seria ilógico demais para Alguém que julgam ser supremo em todos os aspectos... Mas talvez exatamente por isso que ele não pode ser entendido, por sermos apenas meros mortais e incapazes de entender o divino.

“A única verdade universal é que nascemos para morrer e nada mais.”. Então pra que adiar esse mal irremediável? Por que nos apegamos tanto a essa vida cheia de miséria, morte e egoísmo? São tantas perguntas e cada uma delas com respostas tão diferentes... Estou cansado de não compreender nada, queria poder parar de pensar.

“A morte é o que você procura, é neutralidade. Na morte não existe vida, menos ainda pensamento.”; mas eu quero viver. Não gosto muito da minha vida, tenho muitos problemas para me socializar com as pessoas, nunca me apaixonei, sou depressivo e pessimista, mas eu quero viver. Quero tentar, nem que tenha que começar tudo de novo... Pelo menos existe algo que ainda me motiva a continuar vivo, um senso de desafio, de medir minhas capacidades, encontrar meus limites e superá-los.

Silêncio.

Não há mais pensamentos que tentam me levar ao fim da minha vida. Não há mais conflitos comigo mesmo, nem ao menos uma gota de raciocínio, apenas cansaço e tranqüilidade. Pensar cansa e estou realmente cansado, mas sinto como se tudo tivesse acabado. Ainda sinto um extremo desânimo, a última coisa que me incomoda, o último “problema”. Não quero cuidar desse problema sozinho como sempre fiz, estou cheio de resolver tudo por mim mesmo. Pego o telefone e ligo para o psicólogo.