Labaredas

Finalmente, tudo econtra-se pacificado, ao menos na visão do público externo: risadas espalham-se como um atestado de alegria, o ouvir silencioso como uma retomada da antiga paz dos exércitos, a escritura como uma resurreição da capacidade de expressar-se coerentemente. Lamenta-se apenas que poucas pessoas consigam ver a alma e se assim fosse, olhariam com infinita desconfiança os velhos sinais de bonança.

Ver a alma em chamas, labaredas infindáveis e contínuas é algo que não encontra eco na capacidade de muitos que apenas contentam-se com a superfície. E onde reside a riqueza dos homens e mulheres? Apenas no profundo dos seus seres, na coloração ígnea daquilo que a boca e os olhos não ousam revelar às almas não preparadas.

Alegria, tristeza, dor ou gozo, nada é tão representativo quanto a angústia, aquela que movimenta, a que fez o progresso e o atraso, a glória ou a perdição de uma humanidade que, às vezes, nos esquecemos de ver-nos como participantes.

Busca-se o céu mas o que é o céu? Será o paraíso desvelado pelos textos quase sagrados é uma realidade ou apenas uma mistificação que nos é imposta para que sigamos vivendo? Quem é mais realista: aquele que angustia-se até a medula , sem hipótese de solução ou aquele que procura a salvação vinda de cima e que não encontra eco dentro de si?

Qual é a virtude de alguém ou de qualquer grupo que classifica a angústia como demência e classifica como "normal" a guerra, o assassinato, a tortura, a privação, a fome, o desprovimento do mínimo?

Pacificação vã a dos sorrisos que se esvaem sem ordem, no momento adequado! Felizes aqueles que se angustiam pois são os que movem-se e movem o mundo!

André Vieira
Enviado por André Vieira em 08/04/2008
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