SEXO E AMIZADE

Logo que ele se mudou para o meu prédio, eu pirei. Fiquei obcecada. O Marcelo era tudo para mim. No início, ele nem sabia que eu existia. Não me dei por vencida. Eu tinha condições de virar o jogo, tinha certeza. Só precisava de uma ajuda do destino, das circunstâncias e de Deus. Para mim, nada nunca foi impossível.

A primeira vez que conversamos foi no elevador. Fui eu que puxei assunto, claro. Era de manhã cedo, segunda-feira. O Marcelo estava com uma cara horrível de sono e de mau humor. Eu, eufórica e com os olhos brilhantes. Finalmente chegara o momento de partir para o ataque. Falei sobre o tempo, final de semana e que era segunda-feira. Tudo isso em 30 segundos. Ele quase nem abriu a boca, mas pelo menos balançou a cabeça concordando com tudo o que eu dizia. Quando o elevador chegou no térreo, ainda segurou a porta para que eu passasse. Um gentleman. Saí do prédio, caminhando bem devagar. A minha esperança é que ele saísse com o carro da garagem e me oferecesse uma caroninha. Seria a glória. Mas aí também já era demais. Ele passou, sim, por mim. Passou reto, sem nem olhar para os lados. Não me abati. Eu iria conquistá-lo, nem que fosse a última coisa que eu fizesse nesta minha encarnação.

Minha obsessão – que eu chamava de paixão – começou a chegar às raias da loucura. Discretamente, comecei a vasculhar o lixo dele. Queria descobrir os seus gostos para um dia poder usar isso a meu favor. Vinho branco e embalagem de comida congelada eram o que mais existia por ali. Sim, o Marcelo estava precisando urgentemente de uma mulher de forno e fogão. Eu.

A virada aconteceu em um dia que eu menos esperava. Nos demos de cara na fila do caixa do supermercado. Minhas pernas tremeram, as palmas das minhas mãos ficaram suadas e eu acho que até vermelha fiquei. Tentei me controlar, mas as coisas giravam ao meu redor. Não sabia até aquele momento que eu era capaz de ter aquelas reações por causa de um homem. Inacreditável. Começamos a falar sobre o preço das coisas, dos aumentos e quando eu percebi, já estávamos bem à vontade. Voltamos a pé para casa, eu rindo de tudo o que ele falava e o Marcelo parecia também estar apreciando minha companhia. Nos despedimos no elevador. Achei que o olhar dele estava diferente quando ele murmurou um “até a próxima”. Entrei em casa saltitante, enxergando coraçõezinhos vermelhos por toda a parte. Agora vai, pensei, agora VAI!

Como em um passe de mágica, começamos a nos encontrar mais seguido e cada dia eu ficava mais encantada. O Marcelo era tudo de bom. Bonito, inteligente, culto. Solteiro. Não podia ser de verdade. Será que era um ET? E quando finalmente ele me convidou para ir ao cinema, foi o ápice de tudo. Quase chorei de tanta emoção.

Eu jurei para mim mesma que bancaria a difícil. Nada de transar no primeiro encontro. O Marcelo era diferente, bem diferente dos outros caras que eu já saí. Decidi que não seria mais uma na vida dele. Não iria transar e ponto final.

Não resisti. Apesar de morarmos no mesmo prédio, fomos parar em um motel antes mesmo do filme acabar. Foi maravilhoso, muito mais do que eu havia sonhado. Depois de tudo consumado, eu fiquei olhando para ele, apaixonada. Confesso que tenho um terrível defeito. Sempre me apaixono pelos caras que eu transo. Deve ser alguma carência, sei lá. Com o Marcelo não foi diferente. E ele percebeu. Vendo a minha expressão de tonta apaixonada, ele foi logo dizendo, sem perdão:

- Olha, Amanda. Você é uma garota muito legal, mas o que aconteceu aqui entre nós dois foi apenas sexo. Entendeu? Só sexo. Não pretendo me prender em ninguém.

Cruzes. Fiquei olhando para o rosto dele, com meu sorriso apaixonado congelado no meu rosto. Filho da mãe. Depois de eu haver escolhido o nome dos nossos três filhos, ele me vinha com aquela. Doeu.

Fiz de conta que não era comigo e troquei de assunto. Bem capaz que eu iria deixar que ele percebesse que meu mundo tinha desabado. Me culpei, claro, de sair transando com ele logo de cara. Mas se eu não tivesse feito isso, outra estaria ali no meu lugar. Voltamos para casa e cada um foi para o seu apartamento. Passei o resto da madrugada sozinha na cama e chorando. O que era para ser uma noite feliz, virou uma chuva de lágrimas.

Dali para frente, saímos mais algumas vezes. Eu queria não me apaixonar, mas me apaixonei. Ele não. Em uma noite de sábado, eu o flagrei da minha janela saindo com uma ruiva. Fiquei escondida atrás da minha cortina até que o Marcelo voltasse. Foram três horas de tocaia e dor nas costas. Enfim, ele voltou. Com a ruiva. E ela só saiu de lá na segunda-feira de manhã, ao lado do infeliz. Foi o fim. Decidi partir para outra. O Marcelo até que me ligou algumas vezes para sair. Não me dei ao trabalho de atender telefonema nenhum. Ele que vá se danar.

Patrícia da Fonseca
Enviado por Patrícia da Fonseca em 26/04/2008
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