A Espera

Sentou-se e bebeu o copinho de café rapidamente para não esfriar, pois detestava bebidas frias. Olhava para o relógio na parede branca e o via como um inimigo. Tinha vontade de arrancar o vidro da frente e mudar logo os ponteiros. Olhou para a mulher ao lado, estava lendo uma revista de fofocas. Ela tinha um nariz gigantesco e uma verruga enorme na ponta deste. Lembrou-lhe das bruxas que via nos livros quando era criança.

A mulher também o encarou, de maneira séria, mas logo desviou o olhar. Ao lado dormia um senhor que babava bastante. Olhou para o velho e imaginou o que deveria estar fazendo ali.

Enxugou as mãos nas calças, pois estavam molhadas de suor. A ansiedade era grande. Olhou novamente para o relógio, mas este parecia sempre parado. Tinha que estar ali e 15 em 15 dias e sempre ficava assim.

Pensava o tempo todo no que falaria ali dentro daquela sala. Respirava fundo e sentia como se, a cada segundo, aquelas paredes brancas iam ficando mais brancas e mais juntas. Fazia textos em sua cabeça e decorava-os como se fosse um ator. Na verdade, ali precisava ser um ator.

Tomou outro copinho de café, este acompanhado de um copo maior com água. Sentia o suor colar a camisa nas costas. A recepcionista levantou, ele então levantou junto, mas seu nome não foi chamado e sim o da mulher com cara de bruxa. O alívio chegou imediatamente, junto da decepção. Sentou-se e folheou uma revista sem ler nada.

Respirou ainda mais fundo e pensou em sair para fumar, mas poderia perder a vez, pensou ele. Já estava ali a meia hora e parecia estar a mais de três horas. Enxugou a testa com um lencinho umedecido.

Seu coração batia forte agora, pois os minutos já estavam ainda mais adiantados. Uma outra mulher chegou e sentou-se ao seu lado. Sorriu. Ele sorriu um sorriso simpático, porém amarelo. Já não se concentrava em mais nada, apenas no texto que vinha à sua cabeça.

A recepcionista, uma loura simpática, chamou seu nome. Ele deu um suspiro, agradeceu e se dirigiu até a porta da sala. Deu outro suspiro, enxugou as mãos, encarou um pouco a maçaneta a fim de buscar coragem para abri-la e entrou.

A jovem e simpática médica sorriu, perguntou como ele estava e pediu que se sentasse. Já conhecia esse ritual de trás para frente. Ele, como sempre, olhou as paredes e admirou os quadros de arte psicodélica. Tinha vontade de levar um daqueles para casa.

Olhou para onde deveria sentar-se ou deita-se se fosse mais confortável assim. Preferiu deitar-se, assim poderia disfarçar melhor o nervosismo. Ela pôs sua cadeira ao lado do divã. Encararam-se por alguns poucos minutos. O silêncio da sala, quebrado apenas pelo barulho do ar-condicionado, o deixava mais tranqüilo. A luz mais baixa também favorecia seu estado emocional.

“E então como estamos a respeito daquele problema?” – A médica psicanalista perguntou.

“A mesma coisa, doutora. Estou enlouquecendo, não sei mais o que fazer, ela está longe o tempo todo e é como se eu tivesse longe de mim mesmo. Escrevo poemas, faço cartas, mas nunca tive coragem de entregar nada. Não poderia jamais dizer a ela o que sinto, além do mais o medo de me machucar me impede de tomar qualquer atitude. Eu a vejo muito pouco, mas sinto o respeito dela por mim e isso me torna ainda mais impotente, pois jamais gostaria de quebrar isso. Deixa ela lá, como se fosse uma estátua ou uma das sete maravilhas do mundo, assim eu só a observo e penso nela. Sei que jamais nada irá acontecer entre a gente então fico assim só sonhando... Não tenho fotos dela e a vejo pouquíssimo mas minha memória é boa então consigo vê-la claramente na minha frente sempre que eu quero, e até mesmo quando não quero. Prefiro deixar isso totalmente a cargo do destino, ele saberá o que fazer...” – E a descrição do tufão de emoções continuou impregnada de melancolia e tristeza. Mas a médica já conhecia o caso todo. Ou quase todo, pois ele jamais mencionara o nome da mulher e nem de onde a conhecia.

Durante uma hora de sessão ele chorou e riu falando do seu grande amor platônico. A médica falou as mesmas frases de toda quinzena, porém ele sempre as ouvia como se fosse a primeira vez. Olhava os olhos brilhantes e sinceros da médica, sabia que todos os conselhos dela deveriam ser seguidos, mas também sabia de suas impossibilidades para segui-los.

Sabia que agora começaria a experimentar uma nova emoção: a felicidade misturada com a leveza. Depois do desabafo, de toda quinzena, sentia-se assim. Sentia também o conforto passado por ela.

Despediram-se de maneira formal, porém calorosa e ele saiu da sala. Ao ver a porta sendo fechada por ela, olhou para maçaneta e deu outro suspiro. Despediu-se da recepcionista com um largo sorriso e saiu do prédio.

Ao dobrar a esquina sentiu um peso enorme no peito novamente. Respirou fundo, sentia uma lágrima descer dos olhos. Lágrima de saudade, afinal só veria seu amor platônico dali a quinze dias. E sabia que o que o matava era a espera.

Malluco Beleza
Enviado por Malluco Beleza em 07/05/2008
Código do texto: T979574
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