Um grande sonho! Um pequeno engano!

Um grande sonho! Um pequeno engano!

É uma estória trágica! Mas, não deixa de ser divertida! Aconteceu de fato, muito embora haja quem diga que não! Foi num bairro de loteamento de Bauru há mais ou menos 20 anos.

Jorge, o personagem principal de nossa estória, casado com Maria havia 5 anos, pai de duas crianças Thiago e Renata. Profissão caminhoneiro, seu maior sonho construir a casa própria.

Com um sorriso no rosto chegou certa vez em casa anunciando á Maria que havia comprado um terreno em um loteamento, para pagar a prestação. O rosto da mulher se encheu de um sorriso sem igual. Também ela tinha o grande sonho de sua própria casinha. Não mais se mudar todo ano. Não mais negociar o aluguel de casas velhas e com goteiras. A sua casinha enfim, parecia uma realidade muito mais factível, nas palavras e no sorriso de Jorge.

Correram para ver o terreno. Era num local afastado. De esquina. Na rua ainda não havia nada. Somente na avenida principal de ligação com outros bairros, havia um Bar na esquina. Umas duas quadras de distância. Nada mais. Porém, não importava. Era ali que construiriam a sua vida. A cidade chegaria depois. Melhor! Quando a cidade chegasse, eles seriam o ponto de referência do local.

E assim foi! Durante vários meses, Jorge passava seus finais de semana no terreno. No começo foi mais difícil. Como lá não havia nada, Jorge e um amigo que havia estudado o curso técnico de Edificações, tiveram que medir e marcar o local do terreno a partir da única referência que havia: O Bar na esquina da avenida. Daí em diante, Jorge fez uma cerca de arame farpado e levava para lá, sempre que podia, tijolos, areia, pedras, madeira, uma ou outra esquadria. Enfim, todo material que seria necessário para a construção. E nos finais de semana, ele e um cunhado, irmão de Maria, ou ainda algum amigo mais chegado, davam seqüência a obra. Em questão de seis meses, havia no local uma edícula com sala, cozinha, banheiro e dois quartos.

No dia da mudança, a maior festa. Jorge convidou os amigos e fez um churrasco. Maria estava que não se cabia, as crianças corriam soltas por todos os cantos. Enfim, o sonho se realizara.

Passaram-se os meses! A cidade foi chegando. Aos poucos, as casas foram aparecendo nas vizinhanças. Cada novo morador, era um motivo a mais de alegria para Jorge e família. Era o progresso que chegava. Logo, viria o asfalto e o esgoto. Afinal, tinham somente água encanada e Energia Elétrica.

Havia se passado mais que dois anos do término da casa. Jorge chegou um dia de viagem e viu movimentação ao lado de sua casa. Uma grande quantidade de material de construção havia sido depositado ali. De quem seria? Pensou. Se o seu terreno é de esquina, alguém colocou material na rua. Qual o motivo?

Por não haver mais ninguém no local, perguntou para Maria se sabia ou tinha alguma informação, como esta também nada sabia, resolveu ficar atendo a qualquer movimentação.

No dia seguinte, sábado pela manhã logo cedo, Jorge mal havia saltado da cama ouviu barulho de construção. Dirigiu-se até a cerca lateral como quem despretensiosamente verifica o que se passa. Cumprimentou o primeiro que lhe dirigiu a atenção. Porém, não conseguiu dar seqüência a um diálogo.

Olhou um pouco mais e viu que o terreno estava demarcado como que para se fazer o alicerce de uma casa. Mentalmente considerou que demarcaram uma divisa cerca de três metros de sua cerca lateral.

Durante algum tempo, ficou pensativo: Minha casa é na esquina, a rua deve ter uns doze metros de largura, o vizinho este enganado em sua medida. Está avançado uns oito ou nove metros para dentro da rua. Vai perder todo o serviço e o material.

Pensou em alerta-lo. Depois, sabendo que tem muitas pessoas que não gostam de conversas com vizinhos e muito menos quando o assunto envolve o local das divisas do terreno, achou por bem pensar mais um pouco no assunto. Afinal, se o vizinho era desse tipo de gente, bem feito para ele.

Mas, como Jorge sempre procurou fazer as coisas certas, sua perturbação aumentava a medida que o tempo passava e a construção do vizinho não parava.

Acercou-se do local, levou água gelada para o pedreiro, puxou assunto.

- De quem é essa casa? É para o senhor mesmo?

- Não! Disse o pedreiro! É do Senhor Yoshio. O senhor não o viu ainda?

- Não! Sou caminhoneiro. Passo a semana viajando. É bom ter uma casa vizinha...

- Ah é! Um terreno vago ao lado é sempre convite para os bandidos.

- Pois é! Ficarei mais tranqüilo quando estiver fora! Mas.... o Seu Yoshio mediu certinho esse terreno? Aqui no bairro as vezes acontece uma ou outra vez onde a medida não confere... Faltam os pontos de referência. Disse Jorge tentando descobrir até onde podia ir com o assunto.

- Olha, eu acho que está tudo certo sim! O Sr. Yoshio tem um parente que mexe com essas coisas e parece que ele mandou alguém aqui para medir certinho. Mas isso, só com ele mesmo.

- Ah! É Claro. Onde já se viu? Que coisa boba. Ele não gastaria numa construção se não estivesse tudo certo. Não é?

E ficou remoendo-se! Jorge não sabia o que fazer. Parecia que eram gente boa. Devo avisa-lo. Não posso deixar que perca dinheiro a toa. Afinal, quando eu e Maria construímos nossa casinha, se ocorre-se um erro desses eu gostaria que alguém me avisa-se. Afinal, tudo que temos está aqui.

E Jorge passou a ficar de olho na obra do vizinho, esperando o tal Yoshio chegar.

No segundo dia de vigília, viu chegando um carro e dele saltando um senhor de mais ou menos uns quarenta anos com traços orientais. – Deve ser o Yoshio. Pensou!

Chegou-se a rua como se fosse tratar de alguma coisa despretensiosamente, e meio que sem querer dirigiu seu olhar para o recém chegado, cumprimentando-o:

- Olá, Bom dia! Então o senhor é o dono da obra?

- Bom dia! Sim, sou eu mesmo, Yoshio. O senhor é....

- Jorge! Muito prazer.

- Pelo jeito do alicerce o senhor vai fazer uma casa até que grande. Não seu Yoshio?

- É! Preciso de uma casa maior. Tenho quatro filhos e minha sogra veio morar comigo no último ano. A casa terá quatro quartos.

Jorge achou que o momento era adequado e entrou no assunto:

- Então! Estive conversando com o seu pedreiro...

- É! Ele me disse!

- Pois é! O senhor sabe... minha casa é de esquina e,... fico até chateado de falar mas,.... deveria existir uma rua ao lado da minha casa. Portanto, senhor Yoshio, sua casa está no meio da rua. Não há casa vizinha da minha.

- É seu Jorge, eu já havia pensado nisso também. Mas não pode ser porque a minha casa é de esquina. Eu pedi para meu primo que trabalha na prefeitura providenciar a medida do terreno. Ele mediu tudo certinho e garanto que minha casa está no lugar certo.

- Olha seu Yoshio, quando mudei aqui não havia nada nesse bairro, somente o Bar lá na esquina. Era a única referência. Dele tiramos as medidas, eu e um amigo. Demarcamos tudo e fincamos as estacas. Olhe a casa que está ao lado da sua: Ela é a esquina. Onde está sua casa é a rua, depois vem a minha casa, e ao lado dela, aquele terreno baldio que ainda não sei a quem pertence. Talvez algum investidor esperando valorizar. Porém, tenho certeza que minha casa está no lugar certo.

- Ora! Está bem seu Jorge. Vou pegar as plantas e vamos averiguar como ficam as medidas. Se o Senhor estiver certo, alguém me vendeu um terreno na rua. Mas ao menos, ainda não gastei muito na construção.

Enquanto Yoshio voltou para casa com a promessa de trazer as plantas e as medições logo mais, Jorge não se cabia de contentamento. Havia com certeza evitado que alguém gastasse muito dinheiro em cima de uma coisa que não estava no local correto. Sentiu-se muito bem e essa alegria encheu seu dia de felicidade.

Ao final do dia, Yoshio retornou com um rolo de papeis do tipo que usam os engenheiros, e veio acompanhado de outro Japonês, Sergio, seu primo.

Chamou Jorge e apresentou-os:

- Jorge, este é o Sergio meu primo, ele que mediu o terreno para a gente construir. Trouxe também as plantas para que possamos conversar. O Sérgio trouxe uma planta do loteamento conseguida recentemente com os responsáveis. Nela já existem os nomes dos compradores.

Jorge cumprimentou Sérgio, mas não pode deixar de ficar curioso. Como foram cometer um erro desses com tanto conhecimento e condições que demonstram?

- Sérgio abriu a planta do loteamento e iniciou sua explanação a qual era seguida atentamente por Yoshio e Jorge.

- Lá está a Avenida Primeiro, contando noventa metros da esquina nesta direção, temos a Rua dois. Noventa metros dá nesse ponto. E foi até um local próximo, muito perto da cerca de Jorge, parando sobre o local. Virou-se para os dois que o observavam e continuou. Continuando a contar, acrescentamos doze metros e teremos o local da rua dois. Puxou uma trena, pediu que Yoshio a segurasse e marcou. Parou então no que seria a metade do terreno de Jorge que a essa altura, não entendia mais nada. Perguntou para Jorge:

- Qual a medida da largura de seu terreno?

Jorge meio gaguejando, prevendo o que viria a seguir, disse:

- Doze metros. É doze por trinta e três.

- Perfeito! Disse Sérgio. E tomando novamente a trena, descontou o que chamou de espaço da calçada e marcou doze metros em direção ao terreno baldio, vizinho da casa de Jorge. A medida deu exatamente na divisa do terreno com a casa ao lado.

Sérgio virou-se para Jorge e disse;

- Este terreno, é seu sr. Jorge. Sua casa é que está avançando para o meio da rua. O senhor está mais ou menos nove metros fora do local correto.

Jorge quase teve um troço. Ficou meio zonzo e foi socorrido por Yoshio e Sérgio. A mulher de Jorge que havia chegado próximo alguns minutos antes, não entendia o que estava se passando. Acodiu ao marido mas ficou atônita, tentando descobrir algo.

Jorge pensava consigo: Então o terreno é meu. Por isso que nunca vi ninguém visitando. E quantas vezes eu o capinei por causa de bichos xingando o dono, que sou eu mesmo. E agora? Como vou construir outra casa? Não sei se terei condições. E a Maria, vai me crucificar pelo erro?

O tempo passou, Jorge logo na semana seguinte, após verificar a veracidade de tudo que Sérgio havia lhe mostrado, cercou o terreno que na verdade era seu. Perguntou para algumas pessoas como deveria proceder e todos lhe disseram que deveria corrigir o erro o quanto antes. Porém, não era necessário que derrubasse a casa imediatamente.

Jorge plantou uma pequena horta na frente do seu “novo” terreno. As crianças gostaram pois aumentou o espaço para brincar. Assim que foi possível, Jorge aumentou a casa para o lado do novo terreno. Em questão de um ano aproximadamente, havia se mudado para a nova construção por completo. Aproveitou portas e janelas, telhas e madeiramento. Teve a boa vontade dos vizinhos que sentiram a sua dor e sua vontade de corrigir o engano. Como era amigo de todos e muito prestativo, houve um grande apoio.

Já faz algum tempo que não passo por lá e nem falo com Jorge. A casa dele realmente é de esquina, igual a casa de Yoshio. Porém, tem uma rua que separa as duas: A Rua dois. A estória pode ter terminado de forma inusitada, porém, é verdadeira. Aconteceu aqui em Bauru na década de 1980. Os nomes foram trocados para preservar as pessoas.

Redigido em 02/01/2006

Mauricio Gonçalves de Moura
Enviado por Mauricio Gonçalves de Moura em 17/01/2006
Código do texto: T99920
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