Cemitério do pequeno círculo vital

Ablonomerôulos era o nome do coveiro do cemitério da Vila Sem Fim e Sem Começo. Ele era o encarregado de embelezar as sepulturas vazias. Sim, vazias. Os mortos eram incinerados na caldeira que gerava energia para a Vila. As cinzas eram colocadas em um saco e Ablo as ia utilizando para adubar as flores ao redor dos túmulos.

Eh!?? Pra que sepulturas? Heranças, amigos. Heranças...

Os jovens podiam namorar nos recantos escuros. Ou então, fumar maconha, ou andar de bicicleta. Ou apenas conversar. O cemitério era uma espécie de clube, e os túmulos eram algo assim como cadeiras. É, cadeiras, pois Ablo era também dono do bar do cemitério e o pessoalzinho tinha que ter onde sentar.

Havia, na avenida central do cemitério, exposições de arte: quadros, serigrafias, poemas, cerâmica, photos, etc... Havia também uma barbearia e uma sapataria. As duas ao lado do armazém do velho comerciante alemão...

A escola era em cima do grande mausoléu destinado aos mestres. O único comércio com concorrência, era o das flores. Havia pelo menos uma dúzia de floriculturas na avenida principal e nas ruelas secundárias. E não poderia ser diferente, pois em outros locais o cemitério era conhecido como “O jardim”.

Um dia tudo virou cinza. Um Deus qualquer não gostou de tamanho desprezo pela sua querida Morte. Ablonomerôulos, considerado o maior culpado, e, para servir de exemplo a quem ousasse repetir tamanho pecado, foi poupado e hoje vive em uma favela de um cemitério qualquer da Terra.

Ela planta florzinhas em vasos de cerâmica. Trabalha em uma usina de reciclagem de lixo e ganha um salário, não podre, mas bastante fedorento. Têm 13 filhos e sua mulher é gorda, feia, chata e histérica. Ele está com sífilis e tuberculose.

È lógico que à noite sonha com os antigos companheiros. Sonha cô inferno, Não há dinheiro para comprar vasos. Ele os rouba no cemitério da cidade...

César Piscis
Enviado por César Piscis em 27/11/2008
Código do texto: T1305494
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