O confidente

Ah, meu abacateiro, confidente, que ouviu silenciosamente meus reclamos de tudo quanto foi natureza. Até do sapotizeiro eu falei só porque enjoei do sabor excessivamente adocicado dos seus frutos. E do tomate, que reclamei porque achei que ele jamais entenderia que, apesar de parecer, nunca seria caqui; nem seria da mesma família botânica, vamos assim dizer. Mas uma coisa que o velho abacateiro cansou de ouvir, nas minhas lamúrias, foi que fruto de cajueiro não é o caju e sim a castanha. Isso eu repeti tantas vezes que era como se eu quisesse convencer o abacateiro, a mim mesmo e ao mundo inteiro. Acho mesmo que a maior mágoa do meu confidente era porque eu não falava das saborosas vitaminas de abacate ou da guaca-mole que eu improvisava ao esmagá-lo ao leite. Tinha hora que eu ouvia direitinho o abacateiro perguntar: castanha é fruto ou fruta? E eu respondia: fruto, pois é resultado do desenvolvimento do ovário.... E eu que ainda desconfiava que meu confidente não conseguia me ouvir. Ah, dúvidas que a gente carrega pela vida a fora, por sermos muito céticos enquanto jovens, ou por sermos excessivamente crentes quando maduros. Maduros?!! Quem amadurece é fruto ou fruta? Melhor dizer ao meu confidente que prefiro parodiar Sócrates.