A revelação.

Há alguns dias, estava como sempre, sentada quieta na varanda de casa, apreciando o cair da tarde, quando vi aproximar-se a passinhos muito curtos, apoiado em sua bengala, um velhinho, muito simpático, cabelos nevados.

Ia tocar a campainha, quando me viu. Aproximei-me para saber o que o trazia, então ele começou a contar que há muito tempo, vinha ele muito feliz, montado em seu cavalo branco, para encontrar sua eleita, quando a montaria assustada com algo que atravessara a estrada repentinamente, disparou.

O cavaleiro também assustado, desequilibrou-se e caiu, ficando com o pé direito preso nos arreios. Foi arrastado sofrendo múltiplas fraturas, até os seus acompanhantes conseguirem parar a montaria.

Passaram-se muitos meses até conseguir uma recuperação parcial, mas não desistira de vir ao encontro de sua amada princesa encantada.

Na verdade, os longos meses a que se referia, haviam se transformado em anos. O príncipe parecia mais com um “biso”, daqueles que olham amorosamente para os filhos, netos e bisnetos, esperando que eles venham pedir a benção.

Lembrei da brincadeira que fiz, sobre meu príncipe encantado ter caído do cavalo e por isso ainda não ter chegado.

Ouvi sua história, avaliei minha vida tranqüila, lembrei da liberdade relativa que gozo...

Recuperada da pasmaceira que me invadira, perguntei ao cavalheiro se tinha certeza de que estava no endereço certo. Sim, porque a única moradora era eu e a princesa que morara na casa, há muito partira para outra esfera, o que não deixa de ser verdade.

Se algum dia fui princesa à espera do príncipe encantado, já o deixara de ser a um bom tempo. Desde que descobri que se pode ser princesa sem um príncipe para compartilhar. Que felicidade se cultiva ao longo da existência, sem esperar que outra pessoa no-la traga.

Senti os olhinhos do idoso cavalheiro se encobrirem por uma nuvem de tristeza. Agradeceu por tê-lo ouvido, equilibrou-se sobre a bengala e se afastou lentamente, ombros arqueados, a tristeza pesando...

Lá na esquina, embarcou em uma limousine branca e partiu. Boquiaberta, só vi o reflexo do sol batendo no espelho retrovisor. O motorista sorriu um sorriso maquiavélico... 25/08/2009