Um conto da vó

Como muitas histórias que circulam por aí, essa circulou e chegou até mim no dia em que fui passar o verão com a minha vó. Durante a noite, após o jantar, nos sentamos e ela veio contar uma história. No começo achei que era besteira, ouvir histórias da vó parece mais coisa de criança, mas depois as coisas começaram a ficar interessantes.

Tudo começa quando uma camponesa colhia maças numa estrada enquanto passava um cavalheiro caçando. Ele observou a bela moça, os seus cabelos castanhos que caiam sobre os ombros, o olhar triste e distante, a pele macia e um pouco queimada pelo sol. Diante de tamanha beleza, um súbito encanto foi despertado nele e logo se aproximou para conversar com ela.

- Olá bela dama, ao avistar-te não pude contentar-me em observar de tão longe tamanha beleza e tive que chegar mais perto para apreciá-la melhor.

- Senhor, sou uma pobre camponesa, rogo que me deixe ir em paz e dou-te todas as maças que carrego comigo.

- Não rogue por nada minha bela camponesa, eu que lhe rogo pela sua mão. Sou um nobre cavalheiro e quero-te como esposa. Diga-me até onde deve ir para ter a sua mão e eu irei. Nada é demais para possuir tamanha beleza em meus braços.

A camponesa não era só muito bela como também ingênua, estava levando o cavalheiro até os seus senhores quando ele pediu que parassem um pouco para beber água. Com o sol quase se pondo, então veio a sugestão:

- Porque não aproveitamos que aqui tem uma fonte de água limpa e descansamos? Logo cedo continuamos até a moradia dos seus senhores para que eu possa pedi-la como minha esposa. Pagarei bem por você e com certeza eles não irão negar.

A moça concordou e procurou algum lugar no meio das árvores onde pudesse se acomodar. Ela dormiu tranquilamente até que no meio da noite acordou com uns olhos espreitando-a, era o cavalheiro que velava o seu sono. Antes que ela tivesse a chance de dizer uma palavra ele beijou-a e tomou-a em seus braços. A moça nunca havia sido tão feliz, estava nos braços de um homem que há pouco conhecia, mas que já amava e saberia que seria muito feliz junto dele. Infelizmente, isso não é um conto de fadas. Quando a jovem acordou de manhã, o cavalheiro havia sumido e levado consigo as roupas dela.

Vendo-se desonrada e sem roupas ela procurou ajuda no vilarejo mais próximo. Quando se aproximava de um amontoado de casebres a moça foi recebida a pedradas, todos pensavam que ela era prostituta. Ali mesmo no chão, ela caiu morta. No meio de pedras e areia, o seu corpo nu e branco parecia um presente da paisagem e ali ficou para que os animais pudessem comer os seus restos.

Na manhã seguinte, logo cedo, todo o vilarejo escutou um canto fino e triste. Ele vinha lá das pedras, certamente algum animal veio para a ceia. Mas quando as pessoas saíram de suas casas para verem o que acontecia se depararam com um enorme clarão e depois só viram uma ave enorme, que parecia fogo, voando para longe dali.

Desde então, pessoas em diversas partes do mundo dizem ter visto a ave enorme que parece fogo, alguns dizem que ela ainda retorna para o antigo vilarejo até hoje, chora lágrimas de sangue, deita sobre as pedras e se desfaz. Mas a história ao certo, talvez nunca saibamos, foi assim que eu ouvi e é assim que estou contando.