Elfos Negros - Amargura e Ressentimento II

Amargura e ressentimento - Parte II

A voz de Balatins desapareceu. Ele estava repreendendo Tuert quando viu os rostos de Mila e Gaulel, perderam a cor. Ele virou-se e pôde ver Filirrim ainda com as mãos na garganta. E viu Berforam rindo em meio às árvores que queimavam. A figura do elfo negro parecia sugar todas as sombras locais. O fogo não iluminava nada a três metros em volta dele.

Elfos são criaturas incrivelmente emotivas. E quando se enfurecem, parecem-se mais com um furacão. Os Bravos não conseguiram acompanhar Balatins. Em poucos segundos, ele já estava golpeando Berforam com sua espada. O elfo negro defendeu-se do golpe facilmente.

Lutar com o sangue frio e ainda com o incentivo de provar o sangue de um elfo deixou Berforam com mais vantagem ainda. Ele defendeu três ataques seguidos de Balatins e, depois, o desarmou. Apontou as lâminas circulares para o pescoço do elfo. Com um simples movimento cortaria sua garganta. Não o fez.

Os dois se fitaram. Um odiava sua deusa criadora, o outro a amava profundamente. Estava claro em seus corações, tão claro que cada um era um farol para o outro, avisando-se de suas crenças e de sua inimizade certa. Olharam-se atentamente. Observaram as roupas e as armas. Então Berforam saltou para trás e sumiu nas sombras.

- Maldito. Não pode me matar pois eu sou abençoado por Glórienn. Você teme o poder dela, não é? - gritou o sacerdote para a noite sabendo que estava sendo ouvido.

Seus amigos chegaram quando ele estava pegando sua espada no chão. Então ele viu Diamante das Trevas caída ao lado do corpo de um orc. Levou a mão à boca aberta de surpresa.

- Quem era o maldito assassino? - Gaulel perguntou, procurando o inimigo. Queria o sangue dele em seu machado.

- Um dos maiores seguidores de Glórienn que eu já conheci... – contou o sacerdote.

- O quê? - Mila perguntou cheia de surpresas. Ninguém estava entendendo. Um seguidor de Glórienn nunca mataria outro elfo. Sequer ergueria uma arma contra outro de sua espécie.

- Ele recusou a luz da deusa há anos atrás. E agora eu o vejo. Vi as marcas em seu rosto. Vejo sua espada negra que antes era de pura luz. Berforam o Alma Negra. Só pode ser ele. - Balatins balançou a cabeça para se livrar das memórias. Ergueu sua espada. - Tomem muito cuidado. Precisamos de luz. De muita luz.

Tuert ficou temporariamente sóbrio com o susto da morte de Filirrim. Ele se lembrou de uma magia. E não era nenhuma daquelas que lhe permitiam beber três vezes mais cerveja e vinho do que o normal. Nem uma outra que tornava a bebida cinco vezes mais forte. Essa criaria uma explosão de luz que iluminaria todo o local.

- Vou criar luz. Primeiro será como uma explosão que poderá deixá-los cegos se não fecharem os olhos. Depois a área toda ficará iluminada como o dia - Tuert disse enquanto retirava um espelho e uma vela de um bolso.

Ele levantou as mãos sobre a cabeça e as fechou. Elas brilharam e então houve uma grande explosão de pura luz.

Mila abriu os olhos devagar e viu tudo claro como o dia. A magia dera certo. Ela ainda via algumas manchas coloridas e tinha os olhos meio ofuscados como se tivesse olhado para o sol. Recuperou-se rapidamente. Viu tudo claro como o dia.

- Prestem atenção. Ele é bem furtivo - Balatins avisou.

- Vamos ver se é mais rápido que meu machado. Keen está do meu lado. Glórienn nos protege através de você. A luz de Azgher nos cerca. E nós seguimos a justiça de Kahlmyr. Quem pode nos vencer com todos esses deuses do nosso lado - Gaulel disse, terminando com sua típica gargalhada.

Mila duvidava muito daquilo. Se as histórias de Balatins eram verdadeiras, precisariam dos avatares daqueles deuses ali para ajudá-los.

*****

Eles estavam em círculo, iluminados por luz mágica. A explosão de luz quase cegara Berforam. Se seu manto não tivesse o protegido, teria de lutar apenas com seus ouvidos. Então eles teriam alguma chance.

O elfo negro subiu em uma árvore. Olhava o grupo como uma cobra pronta para o bote. Ele caminhou pelo galho e se aproximou o máximo que pôde. Então começou a gesticular e a entoar um cântico em homenagem à Tenebra.

- Brafivim Niantharenn iru gui.

Ele ordenou e as sombras obedeceram, pois quem mandava era um dos preferidos de sua mãe. Movimentaram-se como se a vida fosse parte de seus méritos. Transformaram-se em braços deformados, com dedos pontudos. O primeiro alvo foi Mila, agarrada e puxada com força. Gaulel falhou em segurá-la.

Ela esperneou e tentou se soltar inutilemte. Gritava enquanto era levada para cima das árvores. Os ossos estalavam, quebrados pelas trevas a ponto de rasgarem a pele e deixarem o sangue pingar. Logo ela estava diante de Berforam e sentiu um medo que quase retirou a dor das fraturas expostas. Seu coração quase parou. Depois começou a bater forte. Tão forte que por pouco não explodiu em seu peito.

As lâminas apontaram para a garota. Não emitiam brilho algum. Lágrimas escorreram de seus olhos verdes desesperados. Ela sabia que era o fim de suas poesias. Só esperava que alguém encontrasse seu diário com a história dos Bravos. Perto de sua morte e apenas pensava no que escrevera. Talvez aquele fosse seu mundo.

- Está preparada para a morte, peste? - Berforam sussurrou.

*****

Gaulel se desesperou. Só via trevas naquela árvore. Onde estaria a pobre Mila? Ela era como sua irmã caçula, não poderia perdê-la. Tantas vezes ele jurara proteger a coitada. Quando viu Balatins erguendo o arco de Filirrim gritou depressa.

- Não faça isso. Você pode acertar Mila.

Não adiantou avisar, pois era inútil conter com palavras um corpo dominado meramente por sentimentos que anestesiavam a razão. Ele atirou e o caminho da flecha abriu-se na escuridão, com as trevas se afastando até revelarem a forma da garota. O projétil fincou-se nas costas dela e o cadáver caiu da árvore com um baque surdo. Balatins nem prestou atenção. Era uma baixa de guerra em uma batalha para livrar os elfos daquela vergonha chamada elfo negro. Colocou outra flecha no arco e tentou acertar seu inimigo o inimigo que agora pulava de uma árvore para outra. Mesmo pedindo a bênção de Glórienn o elfo não conseguiu acertar. Berforam desapareceu na noite.

- Idiota. Idiota! - Gaulel gritava enquanto corria na direção da amiga. Quase largou o machado quando a viu caída em uma enorme poça de sangue. Seu corpo estava todo cortado, os ossos quebrados de um modo que a dor ficara marcada em seu rosto jovem. A flecha não a matara. O guerreiro segurou-a em seus braços, manchando sua armadura de sangue. Um osso raspou no metal, produzindo um barulho irritante. Beijou-lhe a testa em despedida.

Os olhos do elfo procuravam por Berforam e acabaram encontrando Gaulel. A razão não veio á tona, mas o sentimento de culpa conteve a raiva. Uma parte menos arrogante dele, com sentimentos que o aproximavam do grupo, o fez lamentar a morte de Mila. O sorriso dela ficou estampado em uma memória perturbadora que surgira apenas para atormentar seu ímpeto de guerra. Desviou o olhar cheio de vergonha.

*****

O elfo negro riu, caçoando de suas presas. Gaulel podia ouvi-lo e correu atrás dele com o machado. Aquela risada era uma provocação irresistível.

Berforam estava esperando. A ponta do lábio estava erguida, quase um sorriso. Os braços estavam cruzados sobre o peito. Os aji mostravam-se desafiadores. O sangue de Mila ainda escorria e pingava tanto no chão quanto no manto negro.

- Pela fúria dos deuses. Deveriam te chamar de Desalmado! Nunca vi tal frieza, tal maldade nem nos sacerdotes de Leen. Maldito seja! Encontrará a morte em meu machado - Gaulel ergueu o machado e depois deixou que caísse sobre Berforam.

O elfo negro esquivou-se como se fosse a ação mais normal do mundo. O machado se prendeu em um tronco, afundando metade da lâmina, tamanha foi a força do golpe. Berforam saltou para trás. Enquanto estava no ar, cortou de leve o peito do guerreiro.

- Você não é nada além de peste que adoenta o mundo.

Cortou mais uma vez quando o guerreiro tentou se virar, agora rompendo um dos tendões no braço esquerdo.

- Você não é nada além de lixo com o que os deuses se divertem.

Cortou uma terceira vez, agora para acabar com o jogo.