Sensibilidade à Flor da Pele

“SENSIBILIDADE À FLOR DA PELE” 1

The after day:

Uma nova Chance. Seria um dia predestinado a me tornar feliz? Tinha esperança que à noite me fosse generosa, que Sany correspondesse aos meus apelos. Eu já tinha tudo que um homem poderia querer, exceto um grande amor, mulheres passaram por meu destino sem deixarem marcas. Sany já as deixara simplesmente por existir. O seu carisma e o seu recolhimento me atraiam, era uma mulher misteriosa bastante para me atrair e cativar. Não era uma criação da minha mente, era inimaginável. Ela não poderia fugir por entre meus dedos. A sorte estava lançada, minha última cartada, o dia “D” da minha vida.

Às quatorze horas segui para o apartamento de Sany, não sem antes de ter passado em dois amigos para deliberar a conclusão do plano. Acreditando que seria o melhor caminho para conquistar Sany definitivamente; atiçando sua sensibilidade. Logo que cheguei à portaria Emerson me entregou a chave e transmitiu o recado que Sany tinha deixado para mim ela voltaria às quatro horas e esperava encontrar o serviço pronto e que esperasse para o acerto final.

- Você tem uma cópia da chave do apartamento? - Perguntei a Emerson, pois meu plano precisaria de uma.

- Tenho! Os condôminos deixam uma cópia comigo para eventuais situações de urgência.

- Ótimo! Nós vamos precisar de uma.

Emerson sabia do meu plano, contei a ele para que nada desse errado, ele também me ajudaria de alguma forma. Coloquei Emerson a par dos últimos detalhes e subi para o apartamento.

Levei as ferramentas para o quarto onde começaria o serviço, mas meu ânimo não me permitia naquele momento, eu teria que esperar mais um pouco para que tudo desse certo.

O quarto era mobiliado bem simples; Ao pé da cama de casal uma banqueta apoiava-se em um tapete geometricamente bordado, o jogo de móveis em estilo clássico sem ser luxuoso, demonstrava a personalidade de Sany; Sóbria e elegante. Na penteadeira uns frascos de perfume foram dispostos simetricamente, ao centro um porta retrato emoldurava seu rosto cheio, estas gramas a mais não lhe tiravam a beleza, o cabelo bem cuidado dava uma expressão jovial ao seu rosto, era um conjunto belíssimo; Os olhos, o nariz levemente afinilado e a boca bem feita lhe emprestavam um quê de rainha. Enfim, era uma mulher de extraordinária beleza. Uma porta dava acesso ao

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banheiro, abri apenas uma fresta que descortinava seu interior, mas me recusei a bisbilhotar mais, tornei a fechar a porta sem dar vazão a minha curiosidade, que por certo me fariam abrir as portas e gavetas.

Olhei o relógio, eram duas e vinte. Resolvi não iniciar o serviço, achei melhor aguardar um horário mais viável, que me aproximasse de Sany. Para isto teria que avisar ao Emerson, o que evitaria um possível desencontro de informações. Do interfone falei com ele:

- Emerson, quero que você me faça um favor: Quando D. Sany chegar você diz a ela que acabei de subir, como se eu tivesse chegado um pouquinho antes dela, você esta me entendendo ?

- Claro! Sr. Marcondes, o senhor pode deixar que eu aviso, fique tranqüilo, vou ficar vigiando ela chegar para não ter problema.

- Obrigado.

Fiquei no apartamento aguardando o horário que fosse favorável às minhas pretensões. Este atraso proposital me faria ganhar mais tempo com Sany. Exatamente às três e cinqüenta, prevendo a sua chegada comecei a trabalhar, aí então, quando chegasse e desse o início do meu plano veria suas reações, e não tinha outro jeito; o plano só iria dar certo, se eu seu início eu estivesse perto, uma condição primordial.

Com a furadeira fiz três pequenos espaços, na parede para as buchas que prenderiam os parafusos do suporte dos trilhos, ouvi o ferrolho da fechadura girar, Sany adentra a sala e veio caminhado em minha direção, trajava um conjunto branco que lhe acentuava as formas, o verde sequinho da blusa, dos sapatos e o vivo maravilhoso de seus olhos completavam sua elegância. Com um sorriso que lhe iluminou o rosto, gracejou:

- Mais um pouquinho eu chegava primeiro.

- Eu me atrasei. – Disse sem dar-lhe maiores explicações.

- Tudo bem! Vou me ajeitar com um livro, enquanto você faz o serviço. – Dito isto, encaminhou-

se até a estante, pegou um livro predeterminado e depois me perguntou:

- Você gosta de ler?

- Claro... gosto! Quando me sobra um tempo eu leio sim.

Sany me mostra a capa do livro e lhe acentua o nome: “Como Era Verde o Meu Vale” - , depois comenta: Esta história foi adaptada para o cinema e ganhou o Oscar de 1941... Mas o livro faz o mais o meu gênero. Não o deixe de ler, é um ótimo livro.

Depois encaminha até o sofá, acomoda-se da melhor maneira possível, tendo o cuidado de não ser provocante, e sem me dar mais atenção passa a

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absorver a história. De vez em quando, assim como quem não quer nada me olha discretamente, procuro surpreendê-la, mas é inútil.

Uma hora depois os trilhos estavam colocados, quando me dirigia ao quarto no afã de terminar o serviço, faltava pendurar as cortinas, o interfone dá sinal de vida. Sany atende:

- D. Sany, é o Emerson, eu preciso falar com o Sr. Marcondes.

Eu que já esperava a ligação me encaminhei para junto de Sany.

- É para você. - Me diz passando o interfone.

- Pode falar Emerson!

- Sr. Marcondes, a encomenda chegou, que faço?

- Pode mandar subir!

naquele momento meu sonho emocional já havia voltado ao sofá e a sua “viagem”. Logo que desliguei o interfone

comecei a raciocinar com seria a sua reação, de outras mulheres eu sabia, mas e Sany?... Não sabia, ela era uma mulher bem diferente, especial! Das outras eu já conhecia os comentários e eram os mesmos de sempre; “são lindas, que bonitas”! Apenas comentários . Mas de eu esperava mais do que isso, eu esperava sensibilidade, era o mínimo a esperar de uma mulher como Sany .

Quando a campainha tocou, protestou:

- Não sei o que pode ser, eu não dei endereço a ninguém e você esta aqui dentro! Exclamou contrariada e concluiu. – Deixe-me abrir a porta senão não vou descobrir quem é.

Levanta e abre a porta para ficar boquiaberta, a sua frente, encobrindo o rosto do entregador uma cesta, de dentro dela sobressaíam rosas brancas, ao centro um príncipe negro; rubro e perfumado.. Admirada e surpresa, pega a cesta, coloca na mesa da sala, vai até o quarto e volta com a gorjeta na mão, agradece ao entregador e fecha a porta. Por um momento fica observando a cesta incrédula, depois abre cuidadosamente o celofane, tira um pequeno envelope e de dentro retira um cartão, pousa seus lindos olhos verdes sobre ele por um instante, depois olha para mim e eu sinto a terra desaparecer sob meus pés. Seu olhar é enigmático, só depois de ouvir o sussurrar, é que compreendi:

- Porque o destino caprichosamente o trouxe até aqui?... Porquê? – Exclama emocionada.

Devagar tentando disfarçar sua emoção, leva a mão aos olhos e tenta esconder suas lágrimas que

umedecem, pouco depois já refeita da surpresa, me olha nos olhos e me pergunta:

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- Porque eu? Você não deveria! Mal me conhece... – Torna a pegar o cartão que havia colocado sobre a mesa e o lê em silêncio:

Sany

O Bouquet do vinho,

O perfume das rosas,

O mais puro cristal,

Assim como eu;

Eternamente

Vão reverenciar

Sua exuberante beleza.

Marcondes

Depois volta a me olhar e diz:

- Você esta criando uma situação insustentável, eu quero ter o direito de decidir meu destino, mas você está sendo uma pedra no caminho. Mais do que a mim não quero lhe ferir, você mal me conhece, há coisas em minha vida que você não compreenderia. Quando sinto seu olhar, os seus olhos me transmitem sua emoção e não a sinto como uma ameaça, eu acredito neles piamente, pode até estar me enganando, mas o que eles transmitem me atinge a alma e isso me dói, pois quero retribuir e não posso, minhas dúvidas prevalecem. Eu tenho notado suas investidas discretamente e muito mais suas peripécias para se aproximar. Não sei se devo deixar que aconteça, tenho medo de tomar uma decisão que venha ferir a nós dois... - Sany está emocionada, sua voz embargada foi um murmúrio de palavras sofridas.

A emoção não é só peculiar às mulheres, homens se emocionam também, e eu, naquele momento deixara que Sany me contagiasse. Tive de engolir seco para me disfarçar e tentar minimizar as suas angústias. Então deitei a falar o que saia do coração, sem manipular as palavras, apenas deixando-as fluir:

- Ferir-me? Só se você não deixar eu participar de sua vida. O que sinto por você não é paixão; é diferente, é maior e duradouro, é o Amor! Desses que nos faz fazer ou dizer coisas que nos escapam como tolices só pra agradar o ser amado, mas que também nos faz dividir suas angústias e seus temores a ponto de o sentirmos. O amor não cria obstáculos, os ultrapassam. O amor é sentir o olhar da pessoa amada mesmo não a vendo. O amor é sabermos estar ante uma vontade de Deus e agradecê-lo por nos a ter concedido. Amor é isto e muito mais, somos eu e você.

Sany escutou calada, apenas um suspiro lhe escapou... Depois desabafou:

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- Estou paralisada! Não sei aonde minha emoção vai me levar, a seus braços? Ou a minha solidão, não sei... - Fiz gestos como se a fosse abraçar, mas sua mão espalmada em meu peito me recusou, não insisti. Prosseguiu....-

Meu destino reservou este momento sem me avisar, estou atônita, não sei o que pensar. Eu tenho motivos de sobras para não me envolver, mas ele me trouxe você, e isto é imperdoável, não estou pronta para o amor. Estou sendo empurrada assustadoramente e meu coração lentamente está se abrindo contra minha vontade. Tenho que pensar, refletir minha vida. Não quero dar um passo que me leve ao desespero, não quero sofrer... – Estava visivelmente emocionada.

- Você não tem o que refletir, o passado? O medo do futuro?

Não! Não há o que refletir, se seu coração está lhe mostrando o caminho para a felicidade, pra que pensar, refletir! A gente tem que seguir o caminho que o coração manda, não há como recusar o amor.

- Não! Eu tenho que refletir, ter um tempo... A motivos que me obrigam a isto e não vou dividi-los com você.

Depois nossas emoções calaram, ficamos apenas nos olhando, foram os minutos mais longos de minha vida, eu estava fascinado por aquela mulher. Fui eu quem tomou a iniciativa; olhei para o relógio, as horas aproximavam rápidas das da noite:

- Já são quase seis horas, eu preciso que você me dê uma resposta...

- Resposta? De quê?... - Sua pergunta foi displicente.

- De um convite para jantar comigo...

- Jantar?- Perguntou sem uma intenção premeditada. e refletindo disse;- Não sei se valeria a pena

Não desisti, voltei a insistir calorosamente:

- Será um jantarzinho à-toa, depois mais nada, lhe juro!

Sany não quer se dobrar assim impensadamente, mesmo porque ela estava evitando ser feliz, eu a poderia fazer e não tinha nenhuma dúvida quanto a isto, ela já estava vendo em mim uma grande possibilidade de mudar sua vida totalmente, mas estava relutante. Então inesperadamente olha-me firme e diz:

- Nós vamos jantar, mas somente isto e nada mais. - Foi clara e objetiva.

- Eu tenho que fazer uma reserva, às 9 horas está bom pra você?

- Pra mim esta ótimo, aonde vamos?

- Ao Giácomo.

- Giácomo? Não conheço.

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- É italiano...Um restaurante ótimo por sinal.

- Está bem! Você é quem sabe.

Depois de concordar, A Sany que havia tomado um suco, vai até a cozinha deixar o copo, quando voltou eu não havia saído do lugar, veio com atraso a minha surpresa, àquela hora eu descobrira o que ela representava, apenas o sim para um jantar me paralisara. Então passou a mão em meu rosto e disse:

- Você tem que colocar as cortinas...

Estava desligado completamente e ela era a causa, mas me recobrei parcialmente, então disse balbuciante:

- Uns vinte minutos... Eu tenho que ir em casa... - Sany notou meu estado, apenas sorriu e disse:

- Você tem pouco tempo...

Depois de mais ou menos vinte minutos as cortinas estavam penduradas e eu recuperado da minha “esperada” surpresa. Sany vendo que era chegada a hora de me retirar, reiterou sua condição:

- Não esqueça; Será somente o jantar, nada mais, na volta você não passa da portaria. Está certo assim?

- Claro, eu prometo, não vou forçar nada.

- Eu acredito. - Disse-me confiante.

Depois de um até já, fui até à portaria. Onde Emerson me emprestou o telefone, liguei para o Giácomo, um amigo dono de um Restaurante, um italiano bonachão, mais do que um amigo. Era mestre nas artes culinárias e de experiência comprovada na arte dos vinhos. Eu já tinha lhe contado sobre Sany e lhe colocado a par da situação. Giácomo era fiel da balança de meu plano, sem ele até que poderia ganhar as afeições de Sany, mas com ele o meu sonho seria realizável. Giácomo se prontificou a me auxiliar magnificamente como nunca o fizera antes. Seria uma obra digna dos melhores mestres, coisa de pai pra filho. Comentou que aquele seria o meu dia, o do meu sucesso, e por conseguinte não ficaria de fora por nada neste mundo...

- Giácomo?

- E aí menino, deu tudo certo?

- Claro! – Exclamei despojadamente alegre. – Não poderia Ter sido melhor. Ela concordou com o jantar!

- Então está mantido o horário?

- Claro! Às oito e trinta, não vá atrasar.

- Ora, e desde quando eu sou homem de atrasar, você me conhece. De minha parte esta tudo pronto, só falta agilizar!

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- Obrigado mesmo meu anjo da guarda! Olhe, eu confio no seu bom gosto... Pensando bem você se arriscou, poderia perder todo o seu trabalho, eu nem sabia que ia dar certo! – Exclamei, mostrando-lhe nossa imprudência.

- Eu tinha certeza que daria certo, não corri risco nenhum, e tem mais; hoje eu vou exagerar.

- Você vai... Olhe o que você vai aprontar.

- Magias, meu filho!... Magias, até logo mais. – Despediu-se e desligou o

telefone.

Ainda fiquei com o telefone na mão enquanto repetia; magia meu filho... O que será

que o Giácomo iria aprontar, se precisasse de uma noite imprevisível era só procurar o Giácomo.

Vôo para casa, no sentido exato da palavra, a ansiedade fazia meu coração

disparar, meu pé direito tinha perdido a sensibilidade para a velocidade, sentia o pulsar do meu peito, naquele momento vivia uma emoção que ainda não tinha sentido; Uma sensação gostosa.

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Subi a escada que me levaria ao apartamento como se ela estivesse me levando para o céu, dizem que o homem é forte, mentira! Minhas pernas estavam trêmulas a sensível Sany atingira até minha coordenação motora, se alguém me visse naquele instante, notaria minha emoção. Não subestimei meu coração; Era amor mesmo, desses que a gente fica espreitando a vida inteira para senti-lo e eu o estava naquela hora.

Às oito horas em ponto eu estava sentado na sala, ainda não a vi. Quando cheguei, ao tocar a campainha, Sany de dentro da sala me pediu para esperar um pouco e que depois entrasse, do lado de fora ainda ouvi a porta do quarto fechar, aí então entrei.

De dentro do quarto me ofereceu café:

- Marcondes! Tem café novo na cozinha... Olhe, deve ter suco na geladeira...

- Prefiro café, ...

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- Você fuma?- perguntou

- Não! – Respondi-lhe, a seguir fui até a cozinha, apanhei uma média no armário e coloquei dentro um pouco de café, voltei à sala e sentei-me frente à televisão, ligo-a, bebo o café. Olho o relógio; oito e cinco. Fátima Bernardes noticia qualquer coisa sobre o Iraque, sobre uma guerra que não acabou, não dou importância. Acima da porta do quarto o tic-tac não para, ela não deve demorar. Fiquei brincando com a média, o dedo indicador na asa tenta fazê-la girar, de vez em quando paro e retorno minha atenção ao televisor; alguém bebe Coca-Cola, é Janeiro, é Angra.(Queria que fosse Araxá) O Tic-Tac não para. Esqueço a televisão e passo a vigiar a maçaneta do quarto, a média continua a girar no meu dedo. A qualquer momento a porta abrirá. O Tic-Tac não para. Não tiro os olhos da maçaneta, oito e dezessete, o Tic-Tac continua. A maçaneta continua imóvel, a média não, de repente a maçaneta gira, o Tic-Tac para, meu coração dispara, a média voa em direção à porta do quarto e vai espatifar-se aos pés de Sany. Sem jeito me levanto, caminho até a ela, posto-me ajoelhado sobre a perna esquerda, fazendo o que deveria Ter feito sem o auxilio da média, tento juntar os cacos, mas ela não deixa:

- Deixe! Depois eu junto isto, não preocupe... Estou atrasada? - Olho para o

relógio, não ouço mais o Tic Tac, ele parou às oito e dezoito, olho para o meu, oito e vinte e um, então lhe respondo:

- Não! Estamos dentro do horário. – Depois elogio sua beleza: - Você está linda...

Maravilhosa. – Digo-lhe olhando nos olhos e ainda ajoelhado. Sany segura meu braço e levanta-me:

- Obrigada! Você é muito gentil! – Exclama encantadoramente charmosa.

Estava esplendorosa; sexy, charmosa. O porte, a elegância e a graça, tudo isso somado me levou a loucura. Sua beleza era inigualável...

Quando passamos pela portaria, vi o Giácomo conversando com o Emerson, ultrapassamos os limites da portaria, olhei discretamente em direção ao Giácomo, ele triscou a ponta da orelha esbanjando seu sorriso bonachão, eu tinha entendido o elogio. Conduzi Miss Sany até o carro, abri-lhe a porta, ela entrou e eu fechei a porta suavemente. Já ao volante, pedi-lhe que pegasse a

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chave no porta-luvas, apenas uma tênue luz alcançava o interior do carro. Ela apalpou o seu interior, mas não conseguiu achar, pediu-me para acender a luz do porta luvas, então lhe disse que estava queimada, mas que procurasse uma caixinha onde se encontrava as chaves: volta a apalpar o porta-luvas e desta vez acha uma caixinha:

- Achei! – Exclama segurando a caixinha, abriu-a e dentro dela encontrou um pequeno estojo, fica por um momento pensativa, depois diz: - Eu não vou abrir! Aqui não tem chave nenhuma, isto só pode ser uma jóia... Eu não vou aceitar de jeito nenhum! – Exclama decidida em seu propósito.

Vendo que Sany iria colocar a caixa de volta ao porta-luvas, não perdi tempo;

- Abra! Não é nada de valor é apenas uma lembrança por este nosso primeiro dia... Juntos!

- Mas... – Sany retira dentro da caixinha o estojo e fica indecisa.

Então eu volto a insistir:

- Abra... Você vai ver que é uma coisinha à-toa, quase nada. – Então Sany abre o estojo e depois murmura:- Como é lindo... – O brilho da pedra incrustada no ouro encanta-a de sobremaneira, depois olha para mim e diz recusando meu “humilde” galanteio:

- Eu não posso aceitar, é uma jóia cara, me desculpe, mas não vou aceitar! – Exclama pesarosa pelo anel, mas digna por seu ato momentâneo.

Eu volto a insistir:

- É um presentinho... Uma lembrança à-toa, fique, você me fará muito feliz! – Exclamei na esperança que mudasse de idéia.

- É muito bonito, mas não vou aceitar. – está irredutível.

- Bem!... Se você não quiser ficar com ele, use-o só esta noite, depois então me devolva.

- Então eu vou usar só esta noite, somente para te agradar. – Disse colocando o anel no dedo anelar da mão esquerda.

Fiquei pensativo por um momento, ela admirava o anel maravilhada, tentei que ela ficasse com o anel para sempre brincando com sua sensibilidade:

- Pois é! Você pensou que eu comprei este anel para você, e não foi.

- Não? Então porque você o está me dando?

- Pra você enfeitar seu dedo. Quem o usaria seria eu!

- Como?

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- Você apenas iria “usá-lo” , adoraria que você ficasse com ele, pois enquanto você e eu trocássemos palavras carinhosas de nosso amor, eu o ficaria girando em seu dedinho, brincando, apenas pela simples emoção de não soltar a sua mão.

- Você é terrível!...

- Eu não! Nem um pouco, o amor é que nos faz assim, quase que tolos.

- É uma tolice apaixonante. – Disse Sany girando o anel.

O carro já tinha rodado uns dez minutos, quando aconteceu o “inesperado”; Um pneu estoura e me deixa irritado. Esbravejo uma indiscrição:

- Droga! Logo hoje? Onde vou encontrar uma borracheira? Só comigo é que acontece essas coisas! – Exclamo demonstrando estar muito irritado.

Sozinha descobre um pneu encostado a um poste:

- Olhe ali no poste... Um pneu! Deve ter uma borracharia por aqui. – Diz confiante.

- Que sorte a nossa! – Exclamo demonstrando surpresa.

- Será que esta aberta? - Pergunta notando que não há nenhuma porta aberta por perto.

- Deve ser aquela porta em frente ao poste. Está fechada, mas tem uma luz acesa, deve Ter alguém lá, vou ver. – Eu sabia que tinha, naquele mesmo dia eu tinha tido uma conversa com o Tonhão.

Bato à porta, esmurrando-a perguntando ao mesmo tempo.

- Tonhão você está aí?

- Claro! Você chegou na hora combinada, tudo certo já vou sair.

Tonhão e eu caminhamos em direção ao carro, ele já sabia de cor seu papel, iria gastar uns vinte

minutos. Tonhão olha o estepe e depois diz:

- O sobressalente está furado também! O Sr. poderia puxar o carro até o poste por favor?

Vou com o carro manquitolando até o poste, mais um pouco e o pneu estaria pronto. Depois de sua farsa Tonhão entrega os pneu, passaram vinte minutos de uma farsa combinada, Sany continuava impassível...

- Ta pronto moço, o preço é quinze reais! Diz Tonhão.

Reviro os bolsos na ânsia de encontrar a carteira, ela não estava em meus bolsos:

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- Pasmem! Esqueci a carteira. – Digo chutando o pneu que acabara de ser trocado,

demonstrando toda minha raiva.

- Onde você deixou a carteira? - Pergunta-me sany.

- Sei lá, se não foi lá em casa, foi na sua. sany tira o dinheiro da bolsa e paga ao Tonhão sob meu olhar de desprezo.

- Não precisava, eu ia deixar um pneu com ele e ia buscar o dinheiro.

- O quê?! – Pergunta sany irritada. – Você ia buscar o dinheiro! Eu não acredito no que estou ouvindo.

- Claro! Meus problemas eu mesmo resolvo e tem mais; Eu nunca pedi favor a mulher alguma e você não ia ser a primeira! – Exclamei mostrando minha indignação por ela ter pago o serviço.

- Ora,... Não tem nada de mais uma mulher pagar por você, ainda mais que você não tem culpa

de ter esquecido a carteira.

- Você deve é de estar brincando, vê lá se vou ficar devendo favor à mulher, não teve uma,...

- Marcondes! – Exclama recriminando e pela primeira vez a vejo irritada pra valer. – Você esta sendo egoísta e machista...

Tonhão toma o partido de :

- A moça está certa, não tem nada de mais a Sra. pagar por ele. – Depois me olhando disse: - O Sr. esta sendo egoísta com a moça e tem mais...

Não o deixei terminar:

- Vai cuidar da sua vida seu...

- Marcondes! – Grita indignada ao sair do carro e estava irritadíssima. – Seu machista! Cretino! Além de louco é ignorante, tome seu anel, rode ele onde você quiser, no meu dedo, jamais! Estava bom demais para ser verdade. – Disse contrariada, jogando o anel a meus pés.

Tonhão ali por perto era o apoio perfeito:

- A moça ta certa. – E exagerando a voz disse: - O dedo da moça não deveria receber nunca um anel de cara como ele. – Disse apontando para mim.

Sany tenta me segurar, mas Tonhão em desembalada carreira chega a borracharia primeiro, fecha a porta rapidamente, ainda cheguei a tempo de ouvir sua gargalhada:

- Valeu Tonhão! Fico lhe devendo este favor. Obrigado!

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- Que nada irmão, você merece.

Volto ao carro, estava indignada, tinha pegado o anel e o estava segurando com a ponta dos

dedos, como se houvesse perigo de se contagiar:

- Tome esta porcaria de anel e me leve para casa, estou cheia com você... – E então sussurra timidamente. – “Besta...”

Escolho uma fita nervosamente a coloco no toca fitas;

- Qualquer porcaria serve! – Exclamo enquanto altero o volume até o máximo, Sany o abaixa, o “Bolero de Ravel” ecoa pelo interior do carro, em dez minutos estou no prédio; freio o carro bruscamente, antes de Sany descer lhe peço:

- Se minha carteira estiver lá em cima, jogue-a na escada. – Sany desce do carro e bate a porta com força.

- Será um prazer! – Depois entra no prédio e disse ao Emerson em voz alta:

- Que noite! Ainda mais com um cavalo ao lado! – Exclama desapontada, sem parar cruza o hall da portaria e sobe as escadas.

Eu já estava chegando a portaria quando ela desapareceu no fim da escada:

- Ela vai ter uma surpresa e tanto! – Exclama Emerson sorridente.

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Sany abriu a porta e ficou boquiaberta, não precisou acender a luz; - Meus Deus, ele é louco mesmo! – Ficara extasiada com que estava vendo; Uma fila de candelabros colocados ao centro da mesa em toda sua longitude iluminavam discretamente a sala, as peças de cristais refletiam o bailar das chamas. A mesa estava posta; iguarias exalavam o aroma do mais inimaginável arte de um mestre, em uma mesa menor os vinhos aguardavam suas horas e junto a eles a sobremesa para serem regadas com o mais fino El Doce. Giácomo sempre teve o hábito de ser perfeccionista, mas tinha exagerado, havia flores por tudo quanto é lado; Tulipas, rosas e sobre a mesa em cada vazio uma orquídea, e mais, as guarnições de linho e as pratarias da mais fina prata compunham a magia. Eu havia deixado um cartão preso à carteira:

13 Sany

Perdoe-me mais esta tolice.

Por você a cometeria de novo, só

Pelo simples prazer de a ver feliz.

Marcondes

Sany aparece no hall da escada, joga a carteira e desaparece, apanho a carteira e leio no verso do meu cartão:

Marcondes,

Empreste-me o anel,

Mesmo que seja só por esta noite.

Sany.

A porta daquele ambiente paradisíaco estava aberta, envolvendo o ambiente: Guilherme Arantes interpretava EXTASE, a visão era da mais pura magia. Sany estava de pé, seus braços estendidos me ofereciam abrigo. Caminhei em sua direção, tomei suas mãos e as afaguei, meu olhar encontrou os dela, ficamos nos fitando tão profundamente e envolvidos por um silêncio tão íntimo que o bater de nossos corações toavam como tambores a anunciar o que nos reservava o destino. A brisa que entrava pela janela soprava gentilmente as chamas das velas e matizavam os lindos olhos de Sany, soltei sua mão, tirei do bolso o anel e lentamente o coloquei em seu dedo anelar da mão esquerda, ela nem por um segundo deixou de me flertar e nem eu a ela. Estávamos tão envolvidos, que aquele momento nos passou desapercebido, foi tão espontâneo; um reflexo de nosso envolvimento. De repente, no calor da emoção começaram a brotar dos lábios de Sany frases murmuradas com tanto sentimento que me atingiram a essência da alma; Seu hálito morno e perfumado fazia-me estremecer. Por mais que o quisesse o poderia ter imaginado, tão afável: Era inimaginável, seus lábios eram o sinônimo da sensualidade:

- Passei a vida toda ávida por amor, por uma voz que pudesse preencher o vazio

de minha alma, que me cativasse e dissesse coisas que tocassem fundo meu ego e que mesmo sem ser tocada, despissem minha alma de preconceitos, que me fizessem descobrir o porque de não ter vergonha ou pudores de dizer; Eu

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Amo-te, de dizer a mim mesma que sou mulher e que fascino a um homem que me ama. Que mesmo sem nos tocarmos já me entregara, e que meus olhos me traiam quando lutava arduamente para dizer não. Que fez minha sensualidade aflorar só porque eu; calada, estava amando. Só posso lhe dizer que uma mulher que sabe amar um homem como você, torna o amor indestrutível. Agora sou apenas Sany, que soa saindo de seus lábios como uma dádiva a minha alma de mulher.

Seus últimos murmúrios foram sentidos por minha pele, estávamos abraçados,

docemente envolvidos, senti naquele momento que Sany era a mulher da minha vida, não me enganara; Acabara uma procura incessante.

Então o óbvio aconteceu; Nossos lábios se tocaram sucessivamente até que se envolveram apaixonadamente. O êxtase era presente fisicamente e aos nossos corações incidental.

Conduzi Sany até a cabeceira da mesa que dava visão à porta de entrada, inesperadamente ele surgiu vindo pela área de serviço: Giácomo se encaminha até a estante e troca a fita do aparelho de som, acendeu-se o tema Luzes da Cidade, depois vai até ela e lhe reverencia revestindo seu ego de lisonja:

- Bella... Bella! – Exclama encantado, depois lhe segurando suavemente o queixo

Endeusa-lhe: Nem Michelangelo, Da Vinci ou Rubens, tiveram o privilégio de pintar um rosto tão expressivo; Belo e magnânimo quanto o seu, devem estar remoendo de ódio por não terem nascidos nesta época. Sany lhe agradece lisonjeada, depois olha pra mim e pergunta:

- Quem é ele?

- Meu anjo da guarda! Giácomo.

Então se lembra:

- O restaurante, a reserva...

Giácomo pega o vinho na mesa, vai até ela e mais uma vez a gratifica por sua

beleza:

- Para a mais doce das criaturas, o aroma da alma do meu melhor vinho;- O vinho ia de encontro ao fundo da taça, borbulhante exalava o aroma dos deuses. depois de me servir, sempre com um sorriso que lhe faziam pronunciar as bochechas, passou a ser o mais perfeito dos garçons. Sua missão foi coroada com um beijo na face dado por Sany. Giácomo ajudara a tornar aquela noite inesquecível.

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- Tanto que era um homem sensível, que aprendi com ele que a vida é uma suave sensibilidade de Deus.

Depois de sua magnífica performance, Giácomo se despediu e se dirigiu a porta, .Sany notou que antes de sair estivara no quarto e ao sair exclamara: “Esta tudo certo!!” O que seria que queria dizer?

- O nosso quarto!- Exclamou Sany

- Não acredito...- Mas sabia que Giácomo era imprevisível....

- Vamos ver...-Preocupou-se Sany

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Abri lentamente a porta do quarto, acendi a luz para ficarmos maravilhados,

Giácomo fizera milagre: Havia uma mesinha, no centro um balde aconchegava uma garrafa de champanhe, de um dos lados uma cesta com uvas, do outro um arranjo floral. O piso do quarto estava coberto de rosas vermelhas, sobre a cama pétalas de rosas brancas, ao centro e sobre elas uma orquídea branca e um cravo vermelho. Ele exagerara mais uma vez. Tiramos nossos sapatos, nos lábios se tocaram... Plóc, a rolha da champanhe foi pelo ares.

Lá embaixo; Na rua, Giácomo encostado em seu velho carro, deixa escapar por

entre os dedos o arame que prendera à rolha ao gargalo, depois entra no carro, pressiona uma fita cassete, liga o velho Mustang vermelho e sai devagar...

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UM OLHAR À ESPREITA, FELINAMENTE SEMPRE SAIRÁ DA PENUMBRA DE NOSSAS VIDAS E DESAPARECERÁ AO DESPREZO DE NOSSOS OLHARES SE NÃO ESTIVERMOS SEMPRE ATENTOS.

Marcondes Filho

F I M