The dark side of the room

"Se lembra quando tudo aqui era só uma estrela?" Sim, eu me lembro. E me lembro como se fosse hoje, tipo sonho-de-cochilo, aquele que você tem quando dorme no sofá com o pescoço torto. Você acorda sentindo o pescoço doer, mas sem sentir o resto do alma.

Tudo é real antes que se prove o contrário. Mas o contrário do real não é aquilo imaginado. O inverso do fixo não é necessariamente variável e não existe nada tão grande assim que não tenha sido pouco um dia. Mas tudo ainda é muito menos do que parece...

As coisas não tem peso, parecem ser mutuamente dualizadas, uma mistura de ausência de gravidade e a sombra do foco da luz, uma mistura de surrealismo, repleto de Alices correndo e desviando de buracos, relógios derretidos e bigodes retorcidos.

O chão é o que se pode ver, até onde se pode tocar. Se há chão, ele parece distante, além dos olhos e muito mais perto do que eu consigo perceber. Tudo embaixo do meu nariz escapa do meu campo de visão. Não sei se por falta de óculos ou medo de tornar periférico o que devia ser centro.

A cada instante o mundo move meio metro para dentro de um buraco negro que ninguém consegue ver, nem eu, mas a gente sente tudo balançar e a carne sendo arrancada do corpo. Mas o grito entala, a boca não consegue assustar o acaso, tudo se esvai escorrendo pelos dedos, o que torna pior ainda o desespero de não se ter mais nada à frente do espelho. O desespero de não ter nem ao menos espelho.

Acordei e senti doer o pescoço. Mesmo tudo tendo sido tão idêntico, os segundos aqui passam largos, sinistramente ritmados. Lá tudo era justamente como deveria ser: sensível e mutatório. Aqui tudo é estaticamente pálido, como um espantalho de destinos. Os braços abertos sempre apontam para o horizonte. Mas nunca se enxerga o horizonte por detrás do escuro das pálpebras.

Fernando Cesar
Enviado por Fernando Cesar em 18/12/2012
Código do texto: T4042317
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