O baú

E lá estava ela outra vez revirando o baú. Aquela criança pequena com as mãos gordinhas mexendo em tantas coisas. Seus olhinhos curiosos brilhavam com certos objetos. Às vezes ela pegava alguma coisa escondia na mãozinha gorda e olhava para trás e quando percebia que não havia ninguém observando soltava risadinhas e colocava as mãozinhas na boca pra abafar o som.

Com certas coisas lá de dentro do baú ela suspirava. Pareciam feitos de sonhos. E tinham coisas lá no fundo que ela tinha que enfiar quase o corpo todo pra alcançar. E puxava coisas lá do fundo. Olhava com curiosidade... Com espanto... Até que mexeu no que a fez chorar.

Pegar aquilo doída... Coisas guardadas que lembravam tempos ruins. E ela olhava e forçando pra não chorar respirava fundo enquanto as lágrimas rolavam nas bochechas rosadas. Parecia estar arrependida de mexer naquilo. Olhava as palmas das mãozinhas e via que isto a tinha realmente machucado. Mas não queria levar uma bronca então se fazia de forte pra não chorar e jogava tudo de volta lá dentro.

Mas a curiosidade não a deixava e lá ia outra vez revirar aquele baú. Coisas mofadas a faziam espirrar mas ela não se importava estava gostando de ver aquelas velharias. Estava lá na ponta dos pés de novo enfiando as mãozinhas gordas tentando alcançar outra lembrancinha quando ouviu uma voz:

- De novo aí menina?

Ela se virou e ficou de costas para o baú e com olhos arregalados e respiração ofegante pelo susto ficou imóvel esperando a bronca do velho de barbas brancas.

- O que eu te disse sobre esse baú?

Ele olhou com cara fechada e a menininha com medo apenas ficou calada com os olhos baixos fazendo círculos no chão com o pezinho.

- Preciso repetir mocinha?

Ela olhou para o homem que agora sorria e retribuiu o sorriso. Ele abriu os braços e a garotinha correu até ele deixando o baú se fechar sozinho.

Ele a pegou no colo e com carinho ela deitou a cabecinha em seu ombro.

- Vida... Vida... Não se apegue ao passado ou vai se atrasar para o futuro.

A menininha sorriu concordando com a cabeça e ele a colocou no chão. Ela correu para a porta aberta onde a iluminação machucou os seus olhinhos, mas os ela esfregou com as mãozinhas e acabou se acostumando com a claridade. Saiu correndo mas parou e olhou pra trás. O velhinho sorriu e a menina disse:

- Tá bom Deus... Já entendi... O futuro está me esperando. Vou correr até ele!

A vida sorriu e saiu saltitando enquanto Deus novamente fechava a porta daquele passado mas sem a chave pois sabia que ela era teimosa e iria voltar lá, mas ficou observando, como sempre, sua querida menina ir em direção ao futuro.