Praia

Praia

A pequena se desprendeu de si, puxando e depois largando o baldinho para água e areia, ele rindo e vendo a menina rir e balançar as mãos para o alto, com o gritinho próprio da alegria infantil. A praia, aos três anos de idade, chamando e ela pedindo. Ele evitando ir, porque o adulto sempre pensa ao contrário da felicidade, ou, no caso dele, foi sim uma infelicidade ter ido logo depois da vida da sua Isis, ali, no momento, gritando e pedindo por ele para vir mais depressa.

— Querido, não a deixe sozinha, por favor, vá logo. Ouviu a mãe, atenta a esses detalhes, uma das pessoas que sofreram profundamente com a falta da Samira, sua nora querida, apesar de triste, muito triste que ficava, longe da praia. Essa específica praia que quase os deixou alucinados quando fugiu ou simplesmente desapareceu. As incontidas idas aos lugares que poderia estar ou ficar, foram infrutíferas as buscas.

— Papai, vem logo, parando e segurando as mãos, pequeninas e exigentes, na cintura. Vem logo, vovó. E voltou a correr. Ele fez, ao sinal da mãe, correr atrás da pequena, pegar pelas pernas, sentindo a alegria nessa gritaria, sozinhos na praia imensa.

— Clécio, cuidado, falou a mãe, vendo o filho, feliz nesse lugar triste, girar a menina com ela grudada em seu pescoço, puxar, pegar pelos braços e continuar girando e girando, ficando tonto primeiro, porque a exigente pedia mais e mais.

— Mais, mais, pedia com a gritaria infantil. A avó chegou perto. Ele baixou e ela pegou na mão da pequenina e a fez sentar-se. Ele olhou as duas paixões da sua vida, nesse momento, sorriu, beijou a pequena e a mãe, na testa, jogou um pouco de areia nelas duas e foi saindo, atrás dos badulaques, chapéu de sol, a mini barraca, mesmo ao final da tarde, para evitar o sol e as possíveis queimaduras. Cuidado extremo com a pequena, sempre ela, o alvo principal de suas preocupações. Olhou em volta, nessa mesma praia, sozinha, lendo um livro, ela veio e se foi. Sua querida sereia, como a intitulava, chamada Samira. Puxou o ar, ao lembrar, fortemente salgado e com a areia incrustada, arranhando o seu amargor. — Papai! Ele se voltou e a viu sorrir, dando adeusinho. Ele fez o mesmo, sumiu do olhar das duas, na duna formada, cheio de algumas gramíneas próprias do local. Foi até o automóvel, mesmo estando com uma casa ali perto, cerca de seiscentos metros. Todo o cuidado é pouco, na estrada que passa e que foi proibida a construção perto da areia. O marco divisório é a estrada, larga, para ida e vinda de todos os turistas, ou, como ele, distante mais de dois anos dela, depois do acidente. Ou simplesmente ficou triste com o casamento e a sua Samira resolveu ir embora de vez. — Vovó, eu quero ir, ainda ouviu, distante e se preocupou em agir rapidamente. Ele sabe o quanto ela é exigente, mesmo com a pouca idade. E o faz aos gritos, alguns perfurando os ouvidos de tanta força na garganta. Voltou e viu as duas se digladiando, a menina querendo fugir da avó e fazendo força com o braço direito puxando e o esquerdo tentando tirar a mão dela, a exigente.

— Querido, por favor, ela quer ir sozinha na água, falou agoniada. Ele chegou, deixou as traquitanas ao lado e a pegou no colo, depois que a avó largou.

— Eu quero, papai. Ele a abraçou. — Eu quero ir lá, apontando. E o imenso mar, no terror dele, esperando por ela, levando embora também. Apertou a menina mais fortemente nos braços e a deixou ficar de pé, na areia. Chutou um pouco nela e a sentiu rir com todas as células do corpo. Fez o mesmo com a sua amada e a viu repetir também, chutando de volta. E correu. Ele atrás. Alegria maior não existe, ainda mais ao ver a sua amada correndo na sua frente, tentando evitar pegar. Ele fez o mesmo, levando a pequena e abraçando, largando ao sentir que assim a fazia mais feliz. Ela, na água, chutando e ele devolvendo. Parece mais do que estar em seu elemento, a água, como fazia na piscina, ao aprender a nadar, facilmente, com dois anos de idade. Como uma sereia, indo ao fundo e preocupando o professor. A única criança entre todos eles que o fazia, pondo os braços à frente, parecendo brincar com a água e a fazendo obedecer. Saia da frente, eu estou nadando e quero atingir o outro lado da piscina.

— Já chega, agora? Vamos voltar para ficar com a vovó.

— Não, eu quero nadar, já disse. E o pezinho direito a frente, demonstrando a sua exigência. Ele riu, olhou a calma do mar, oferecendo-se. Confirmou, ela correu e ele atrás, mais para o fundo. Ela mergulhou, a água demonstrava que a recebia com alegria. Sim, ouvia o riso da esposa nesse mesmo ato e o fato que parecia acontecer igual. A sua pequena sereia, nas águas límpidas, fazia os mesmos movimentos. Ela voltou. Foi o que o seu pensamento o fez ver. E se assustou com alguma presença, invisível, porque era uma sensação e não uma realidade. A pequena voltava, com a água salgada na boca e espirrava nele, pulava em seu colo, corria mais adiante, voltava. Ele sentou-se para apreciar e chorar um pouco, em alegria e tristeza. — Vou mais para o fundo, gritou e saiu correndo. Não foi o tempo suficiente entre gritar o não, como sempre, a ver saltar e mergulhar. Gritou horrorizado. Correu e mergulhou no mesmo lugar. Não a viu mais. Levantou-se.

— Mamãe! A velha senhora quase morreu de susto com o grito de desespero e o iniciar chorar e procurar chegar mais cedo a fez tropeçar na areia, ficar suja dela, não é essa a preocupação maior e vir, aos trancos e barrancos, na areia fofa, chegar ao mar e ver o desespero do filho Clécio.

— Clécio, o que foi, onde está a Isis? Ele apontou para todos os lados, chorando.

— O mar levou.

— O que está dizendo, não acredito, tirando o sol do rosto e tentando enxergar. — Onde ela está, Clécio? Fala, pare de falar bobagens. Fala, gritou, batendo no braço do filho. — Eu quero a minha pequena, Clécio, não a deixe ir, corra, entre no mar e exija a volta da sua filha, batendo nele.

— A senhora perdeu o juízo, mamãe. Mergulhou mais vezes, indo à frente, retornando, mergulhando e a cada vez, perdendo as esperanças. O desespero tomou conta. Ouviu, ou pareceu assim, a voz da menina brincando e não a enxergando. A mãe soluçando, as lágrimas de sangue de sofrimento total, sentando-se na areia e baixando a cabeça. Abatida. O mar tirou a sua vida, ou o maior pedaço dela, o seu coração, a sua paixão de continuar vivendo.

— Mamãe, por favor, acalme-se, ela não pode ter sumido, não pode, falou sem nenhuma convicção. Vou busca-la, falou resoluto. E foi entrando no mar. Voltou-se e a mãe do mesmo jeito. — Vou buscá-la, mamãe, não se preocupe. Ao pensar em mergulhar a água recuou. Ele deu mais dois passos e aconteceu da água fugir ao seu contato. Mais dois passos e foi vendo que a mesma ficava ao seu lado. Olhou para trás e viu a mãe sentada, parecendo sem vida. A água do seu lado não o atingia. Começou a correr e viu um milagre ou, no sentido prático, uma ilusão. O mar temia a sua presença. Ouviu novamente a criança gritar de alegria e continuou. Mais e mais. A mãe desapareceu da sua vista. Ele de volta, o mar também. Atentos. A luta vai se iniciar? Brigar com quem? — Clécio! Ele se assustou com a voz, fazendo um giro completo, procurando encontrar em meio de toda a água que o circundava pela voz e pessoa.

— Samira! Estou louco, louco, isso não está acontecendo. — Samira! Isis, gritou, forte, colocando as duas mãos na boca, em concha. — Isis foi o retumbante desespero.

— Oi papai. E a viu, no meio do mar, das águas, brincando com peixes, caranguejos, formas de sereia e apertada as duas mãos com outras duas. — Oi papai! O grito, saindo da água e abraçando. — Vem, vamos brincar, ainda está cedo, não está? Ele apertou a mão esquerda da menina, tentando voltar à realidade. — Papai, está doendo a minha mão. Ele afrouxou um pouco. O canto da sereia, foi o que lhe pareceu, sair da boca da filha.

— Clécio!

— Samira! Isis!

— É a mamãe, papai, ela está aqui. Venha logo, vamos brincar, puxando e ele indo, sem atinar com mais nada. A água os envolveu. E ele viu, nesse final de vida, a sua querida Samira. E a filha Isis, brincando com os golfinhos. Perdeu a razão.

— Clécio, vamos embora, querido. Você vem para a praia e fica dormindo.

— É papai, já chega, vai ficar queimado na barriga, ouviu o riso infantil. Ele se levantou, quase batendo no rosto da mãe.

— Samira! A mãe se afastou dele.

— Querido, por favor, já chega. Vamos embora. Ele voltou à realidade, ao vê-la apresentar a barraca e as traquitanas da filha espalhadas. Um lindo castelo, com água do mar. E uma pequena sereia bem em cima.

— Olha papai, a mamãe, apontando e rindo. Ele tentou segurar mas acabou se emocionando e chorou. A pequena foi até ele e pediu o colo. Ele fez. — Gira, gira, pediu. Ele fez, o riso voltou e ele, no movimento, tentando encontrar uma resposta. De tudo o que aconteceu em seu sonho. Arrumaram tudo. E ao puxar pela filha, os dois, ao mesmo tempo, voltaram a atenção para o mar. Ele viu um pequeno pedaço dela sem água, um formato quadrado. Ficou abismado e mais forte na mão da filha. — Está doendo, papai. Afrouxou. — Vamos voltar amanhã para eu brincar com os meus amigos? E apontou para o mesmo lugar. E o grito dela. — Adeus! O canto da sereia no grito. E do mar, o som voltou com a mesma intensidade. Ele se arrepiou todo.

— Samira!

— Adeus mamãe. Ele parou. Chorou, a menina acompanhou. A mãe mais à frente parou também, preocupada. Sabe o quanto de tristeza essa praia marcou na lembrança para não mais esquecer. Chorou de mansinho. Não quer participar, precisa ser forte para o filho e a neta. Quer vê-los bem. Esperou. Ele a abraçou. Ela ouviu.

— A Samira está viva, mamãe. Está no mar.

— É vovó, mamãe está no mar. Ela chorou baixinho. Vai fazer de tudo para que ele se recupere. Só espera que a neta não sofra o tanto que o viu fazer.

— Tudo bem, eu sei. Ela está no mar. Não ouviu, mas eles sim. O canto da sereia, nessa praia que foi, mas agora não é mais, o motivo do choro triste, mas de alívio da certeza. Ela está e o mar o respeita. — Querido, na próxima vez não entre muito no mar, fiquei muito preocupada. Para ele não houve tempo de resposta, ao ouvir a filha.

— A senhora não vai dar adeus para a mamãe!? Segurou com a outra mão na avó e a fez parar. — Adeus mamãe, até amanhã. E a avó, na certeza de ajudar, o fez também. Três pessoas dando adeus ao mar, ou um simples até logo. Agora felizes. A certeza do amor voltou para ela, do pai a presença da esposa e a neta, a presença e o mimo da mãe.

Cilas Medi
Enviado por Cilas Medi em 03/07/2014
Código do texto: T4868442
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