A Primeira Dracopyre

Em um pequeno vilarejo, nos arrabaldes da grande potencia Inglaterra, em 1850, na plena Era Vitoriana, onde o senso de moralidade está em alta, os becos escondem diversas criaturas que se utilizam das sombras e das penumbras de casas e bares para cometerem as mais variadas obscenidades e atrocidades. E, entre elas, se encontra uma jovem moça chamada Amethist. Simplesmente Amethist.

De aparência jovem e angelical, de pele clara e cabelos negros como aqueles locais pelo qual ela anda, Amethist se mantém escondida sobre um manto escuro que se inicia como um capuz sobre seus cabelos ate o cumprimento de seus joelhos. Uma jovem que qualquer um gostaria de tomar posse para si como esposa. Porém, o que ela tem a oferecer mulher alguma, em nenhum momento, nem mesmo a mais recatada das mulheres daquele vilarejo, poderia oferecer. E, acredite, isso não deve soar como um majestoso elogio, mas sim como um perigo a todo e qualquer ser que se coloque em seu caminho...

Essa tímida garota, que, mesmo com sua beleza, poucos realmente já a viu sem aquele manto, carrega um fardo que poucos teriam o desprazer de fazê-lo. Não se sabe quando esse fardo lhe foi concedido, e nem o porquê dela ter sido a escolhida para ele.

Em seus momentos de fúria, agora controlada, ela se dispõe de uma metamorfose, em que se deixa dominar por essa criatura magnífica. A transformação leva somente poucos segundos para se completar, mas seu resultado a torna diferente da meiga garota de antes.

Seus olhos, que antes eram castanhos claros e de pura inocência, passam a serem vermelhos como chamas que consomem sua fragilidade e demonstram a cólera pela qual ela sente das pessoas ao redor. Seu corpo se desfigura e se torna como uma muralha forte e resistente. Suas unhas, bem cuidadas e zeladas, se tornam garras afiadas e capazes de separar, de um humano adulto, o tronco do restante do corpo em apenas um golpe. Sua força, antes de aparência frágil e delicada, aumenta de tal intensidade que seus golpes, desferidos contra uma parede, deixam marcas violentas e brutais. E sua coloração desperta o mais sublime dos sentimentos. Um dourado que, debaixo do luar, soa como o ouro de muitos reinos.

Todos aqueles que a observaram quando transformada, sentiram uma mistura de medo, horror e execração por aquela besta deformada, e ao mesmo tempo, ficam admirados pela cor que enche os olhos de desejo, pela forma como se esgueira pelos caminhos obscuros para surpreender e abater as vitimas, com inclemência, mesmo com os gritos ensurdecedores de suas presas ao eviscerar membro por membro, ate não restar nada.

Essa maldição, impregnada em seu sangue, recebeu o nome de Dracopyre. É isso o que ela se transfigura toda vez que sua fúria se torna predominante em seu espírito.

Por anos, ela condenou aqueles cujas atitudes eram animalescas, tanto com crianças sendo forçadas a trabalharem em minas de carvão e sendo surradas quando algo na rotina de trabalho saía errado como mulheres belas e meninas novas que se prostituíam por algum dinheiro vindo de bêbados e homens da alta sociedade.

Ela tinha como motivação a purificação daquele vilarejo e a proteção daqueles que não tinham forças para lutar, nem se defender, além de esquecidos pela rainha Vitória, protegida, guardada e acalentada dentro de seu protegido castelo. Ela tinha o desejo, que ardia em seu peito e alimentava sua cólera, de conquistar a justiça para todos independentes da classe deles. Tinha como desejo alcançar a rainha, e, com grande maestria, arrancar Vitoria de seu trono e de sua guarda e findar, tanto com seu reinado como com sua vida.

Amethist então soube que a rainha havia expedido uma ordem: uma ordem de captura da misteriosa criatura que desaparecera com varias pessoas. Vitoria deu a ordem de procurar em cada beco, em cada sombra, mesmo nos lugares mais inóspitos de seu reino, atrás dessa desprezível besta, a fim de acabar com o terror que esta causava a todos. Ela então se preparou. Vestiu seu manto, respirou fundo e sabia que se em algum momento, ela tivera uma chance de eliminar Vitoria, esse momento era agora. E partiu para seu propósito.

Entre passos rápidos e esgueirando sobre os muros e penumbras, ela alcançou o castelo. Seu peito começou a fervilhar de fúria. Sentiu toda a dor das pessoas que viu sofrendo em seu vilarejo. Era como se ouvisse, se presenciasse e como se marcasse cada agressão que os moradores recebiam em sua carne. Como se cada membro da vila sem se alimentar doesse em seu estomago. Cada noite, passando frio, congelasse os ossos e sua cerviz. Ela não queria, nem poderia deixar que as coisas ficassem assim. Que eles ficassem impunes pela falta de compaixão para com os outros.

Ela não conteve sua transfiguração. Irada, ela logo deixou a maldição a guiar pelo que deveria ser feito com todas essas verdadeiras bestas desse mundo imundo.

Alguns soldados haviam ficado no castelo, e ao observarem a imagem do Dracopyre, partiram para a batalha contra Amethist. Partiram contra ela com espadas, lanças, armaduras e escudos: como se algo a pararia. As espadas e lanças a acertavam, mas ela sentia como se fosse um ínfimo galho de uma arvore sobre sua resistente pele. Os escudos não passavam de simples proteções efêmeras contra suas garras, poderosas garras de metais que tilintavam ao se chocarem umas com as outras e que transpassavam esses escudos. Sua armadura não era de nenhuma importância em comparação às presas perfurantes de Amethist. Para ela. A armadura não passava de roupas feitas do pano mais fino.

Suas passadas entre os soldados derramavam mais e mais sangue, e esse liquido pulsante, entre suas presas, aumentavam ainda mais o frenesi de sua extrema violência contra esse exercito. A carnificina feita por Amethist era de se assustar. Entre as escadas e corredores do castelo, ela foi deixando um rastro de corpos empilhados, membros sumariamente arrancados, e um rio que se enchia a cada ataque dela com o liquido escarlate.

Enfim sua chegada à rainha. O cansaço se observa na face de Amethist, e, ainda cansada, guardava um resto de stamina para o ataque final sobre Vitoria.

Ela se preparou para dar um ataque, um ataque esse que faria a rainha expirar e, assim, completaria e saciaria seu desejo. Porém, a rainha, como uma ultima tentativa de manter sua vida, visto que ela não teria condições de nem ao menos alcançar Amethist, se utiliza de um pedido misericordioso por sua vida, em troca ela mudaria seu proceder e olharia com mais atenção para aquela vila e agiria de forma a recompensa-la por todos os momentos que foram esquecidos.

Amethist, então, julgou que a rainha estava realmente disposta a mudar seu proceder. E, como demonstração de confiança dela com Vitoria, controlou sua fúria e logo voltou a ser a jovem e delicada Amethist.

Porém, a rainha enxergou a chance de matar ela no momento que esta virou de costas e, sem nenhum arrependimento, tirou um punhal d’entre sua vestimenta, e acertou um golpe fatal, um golpe inesperado, um golpe incalculável, em direção ao seu peito, perfurando seu coração.

Amethist, em desespero ao ver sua vida se esvaindo, tenta usar sua transfiguração para tentar resistir ao ferimento, mas já era tarde. Seu fôlego de vida estava prestes a findar e o vento vermelho passava por entre seu corpo. Não havia mais o que fazer...

Como seu ultimo fôlego, observou a rainha se vangloriando pelo feito. Por ter matado a primeira Dracopyre, ela haveria de conquistar uma posição ainda mais imponente em seu reino. Seu corpo terminou, depois de todas sua batalha e dedicação, ensanguentado sobre o chão do castelo. Naquele momento, apesar da morte, o senso de justiça que demonstrava se tornou mais poderoso, tomou novas formas e abriu uma oportunidade de lutar pela justiça, pelo que é correto. O que aconteceu a Amethist foi o inicio de uma luta, luta essa que poderiam ter seus mortos e feridos, mas que a justiça sempre seria o principal direito de qualquer um.

Chavinski
Enviado por Chavinski em 14/01/2015
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