Estrelas

Eu vivia sozinho num espaço amplo, muito grande e escuro.

Corria e me divertia na mera descoberta da auto existência. Nada me faltava, pois cada momento de vida era o que me bastava.

Porém, passado muito tempo, comecei a sentir o peso de ser único. Senti agonias e necessidades.

Deus, então, vendo meu desalento, resolveu ter comigo. De presente, deu-me uma imensidão de estrelas, uma mais bela e brilhante do que a outra. Miríades e miríades, porém cada uma singular e exuberante.

A alegria voltou a preencher meu ser, e eu brincava com as estrelas. Reunia-as em constelações novas, criava histórias com seu movimento e posição, vivia em prédios e dormia em camas de estrelas. A escuridão não mais existia, e minha vida era plena de luz. Por vezes, o próprio Deus, tirando férias de seus tantos e misteriosos afazeres, vinha brincar comigo entre as estrelas.

Mas, após mais uma eternidade, voltei a me sentir incompleto. As estrelas não mais me bastavam, e a sua luz me deixava farto.

Acorri a Deus, mas Ele não podia me dar mais nada naquele momento. Ouviu-me e dispensou-me de mãos vazias de novidades.

Vagava dia após dia entre as estrelas, e conhecia cada uma delas o suficiente para não querê-las mais. Sentava e chorava, tristemente satisfeito.

Certa feita, um homem acercou-se de mim. Sentou-se ao meu lado e me fez a companhia que tanto me faltava. Senti-me melhor, e voltei a caminhar, e ele caminhava comigo.

Conversávamos sobre tudo, me abri para ele e sua presença era muitíssimo agradável.

Mas algo ainda me faltava.

Então, este homem meteu a mão no bolso de sua calça e me mostrou uma dúzia de belas e lustrosas balas.

Confesso que suas cores e seu perfume me deixaram muito ambicioso, e desejei muito tê-las. Pedi que ele me desse as balas, porém refutou. Disse-me que eram únicas e não havia outras.

Insisti, implorei, e nada. A escuridão pouco a pouco voltava a tomar minha existência, e não havia momento em que eu não cobiçasse aquelas balas.

Por fim, ele permitiu, mas por um preço: que eu lhe desse as estrelas em troca.

Titubeei por um breve instante, mas logo fiz o negócio. Ele despejou as macias balas em minhas mãos, e partiu com as estrelas.

Na escuridão, mal podia conter minha alegria e saciedade. Botei logo todas as balas na boca, e como seu sabor era maravilhoso! Por muito e muito tempo eu as degustei, e a multidão de sensações e sabores era maravilhosa.

Mas as balas foram aos poucos perdendo o gosto. Por fim, nada mais eram do que pedaços esponjosos de nada em minha língua. Fiquei triste, e as cuspi fora.

Mais uma vez caí no desalento. Sentei-me e chorei, desconsolado. Chamei pelo homem, mas ele desapareceu. Implorei por Deus, mas Ele não me respondia.

Vaguei pelas imensidões procurando as estrelas, e não as encontrei.

Estava mais uma vez só; saciado, farto e triste.

Hoje caminho perdido, reunindo qualquer quinquilharia que me aparece pelo caminho. De vez em quando algum desconhecido surge e trocamos alguns artigos baratos e novidades passageiras. Minha vida tornou-se transitória e fútil. Lamento cada instante pelo tudo que abandonei.

Por mais que eu procure, nunca mais encontrei nenhuma estrela. Nem o homem que as levou. Nem Deus.

Eudes de Pádua Colodino
Enviado por Eudes de Pádua Colodino em 12/11/2015
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