O MUNDO AVERSO - CAPÍTULO 3 – O POSTO AVANÇADO

CAPÍTULO 3 – O POSTO AVANÇADO

O frio havia chegada à região oeste, os soldados que viviam no Posto Avançado VII estavam preparados para esta mudança de temperatura, seguindo as ordens de Ozu o capitão que era assim chamado, pois antes de estar ali comandava um navio da frota real, alguns dos soldados foram mandados por ele para irem até a floresta que ficava próxima ao posto avançado para caçar alguns animais para obter pele para se aquecerem e se manterem vivos durante o inverno. Além disto, Ozu também havia ordenado aos membros para arrumarem o máximo que puderem o posto avançado, pois em breve iriam receber a visita de um mago e não queria dar uma impressão de desleixo quanto ao local.

No posto avançado viviam cerca de trinta soldados, ainda havia mais espaço para mais uns quinze soldados, porém não mais havia candidatos nos reinos para se aventurar em ficar em um local tão longínquo e perigoso.

O forte ou posto avançado era composto por seus muros com mais de seis metros de altura e com paredes espessas de pedra que eram quase que impenetráveis, um único portão dava acesso ao lado de dentro, para atravesse-lo era necessário abaixar uma ponte acima do poço que tinha mais de cinco metros de profundidade. Com um poço tão profundo e um muro alto, defender o local era uma tarefa muito fácil, porém isto se alguém fosse atacar o que raramente acontecia. Os postos avançados foram construídos pelos magos para ficarem distribuídos ao entorno do continente, ao todo eram onze postos avançados. O objetivo destes era analisar e investigar a misteriosa coluna de névoa que cercava o imenso continente, porém nem todo continente fora desbravado, existia uma região mais ao sul com uma densa floresta que pouco se conhecia, mas sabia que existiam algumas tribos por lá, porém iriam demorar mais alguns anos até pessoas serem enviadas a tal região remota.

Com relação ao posto avançado, Ozu ordenou uma verdadeira faxina no local, o chão antes disforme e lamacento foi todo reconfigurado com ajuda de carroças e pás para assentarem o local. Na entrada da grande casa foram colocadas algumas flores vermelhas chamativas, os tapetes azuis foram trocados por alguns vermelhos para combinarem com as flores, por dentro da grande casa todos os móveis velhos foram retirados deixando assim mais espaço no local, além de terem feito uma limpeza completa. Tamanho luxo ansiado por Ozu enchia de reclamações na mente dos jovens soldados.

A grande casa serviria para o encontro com o mago além de planejarem as prováveis excursões até a parede de névoa. Era utilizada a grande casa como uma espécie de quartel general e era chamada assim, pois tinha dois andares e cerca de seis quartos e uma grande sala central com mesas que geralmente eram utilizadas para festas e comemorações.

Do lado de fora da grande casa os soldados removiam a lama seca que estava disforme ao redor, para deixar o terreno mais plano e para fácil locomoção.

- Poxa Sylph, eu não vim pra cá para me tornar um mero faxineiro. – Uniz disse em tom de indignação.

- Como se aqui fosse muito agitado. – Comentou Sylph.

Ambos estavam removendo um pouco da lama que estava ao entorno da grande casa, ambos usavam suas pás para colher a lama e jogar em baldes de madeira e após despejavam a alguns metros mais afastados daquele entorno. Sylph e Unzi estavam encobertos pela lama seca e fria, suas botas pareciam pesar toneladas e a cada balde que levavam sentiam suas forças se esvaírem.

- Por que diabos temos que fazer este serviço? É só um mago qualquer que esta chegando. – Uniz olhou para Sylph que pode ver suas bochechas bastante avermelhadas, provavelmente por conta do frio intenso, além das bochechas os lábios de Uniz estavam muito rachados e sangravam um pouco.

-Cara, seus lábios estão fodidos. – Sylph fez uma cara de nojo ao comentar.

- E eu achando que meu bigode me ajudaria. – Disse Uniz passando seus dedos finos e gélidos pela extensão do seu bigode.

Ambos cravaram a pá na lama novamente e apoiaram os pés nas bordas para as empurrarem e afundarem para assim facilitar a saída da lama. Os dois sempre pareciam muito sincronizados em suas execuções, levavam e traziam o balde quase ao mesmo tempo e em todo este tempo, Sylph fazia isto embaixo das reclamações ásperas de Uniz.

- Mas me diga Sylph, você está aqui há quanto tempo? Uns três meses certo? – Uniz soltou um bafo ofegante e despejou a lama que esteva no balde no chão. – O que te fez vir aqui? – Completou.

Sylph franziu a teste ao olhar para Uniz, parecia queria falar e ao mesmo tempo não. Sylph deixou o balde no chão, bateu suas mãos na roupa para tenta remover um pouco da lama impregnada, suspirou e disse:

- Eu era uma pessoa vingativa sabe.

Quando disse isto a expressão de Uniz mudou repentinamente e logo começou a gargalhar histericamente, colocando suas mãos sobre a barriga e logo acabou dizendo:

- Sério você? – Sua risada se tornava cada vez mais estridente, como se não conseguisse controlar nem seu fôlego, logo começou a lacrimejar e seus olhos mal conseguiam ficar abertos “ai meu deus” disse em um tom abafado.

Sylph sentiu uma pontada na barriga, uma pontada de vergonha alheia por estar ao lado de Uniz.

- Hora pare com isto. – Ao falar isto parecia que tinha dado mais lenha para a fogueira de gargalhas de Uniz, que agora tentava abafar seus berros com a mão na boca.

Sylph fechou os punhos e socou direto no rosto, que cambaleou para trás dizendo “Ei, o que é isto?” caindo de bunda na pilha de lama que havia juntado. Ainda no chão olhou para Sylph que tinha um olhar bem diferente, estava bem mais sério e Uniz percebeu imediatamente percebeu isto.

- Tudo bem, me desculpa. – Se levantou e bateu a mão na bunda para tentar retirar a lama, mas era impossível. – Por que queria vingança?

Sylph suspirou, olhou para os lados para observar se havia mais alguém e comentou:

- Havia um mago, que em resumo matou meu irmão. – Sylph olhou para baixo, levou sua mão ao peito e começou a esfregar algo por debaixo da roupa.

- Seu irmão foi assassinado?

- Sim.

Ambos se entreolharam e Uniz sentiu o ar de seriedade de Sylph pairar.

- Me desculpe eu não sabia.

- Tudo bem.

Logo Uniz percebeu que Sylph massageava algo por debaixo da roupa.

- Isto em seu peito o que é? Um pingente?

Sylph não respondeu, apenas retirou a mão do peito e pegou a pá que estava no chão.

- Não importa mais, aquele mago foi morto há anos atrás. – Disse Sylph que em seguida se afastou de Uniz com o balde e a pá nas mãos, indo em direção a grande casa.

Uniz não o acompanhou, apenas o observou se distanciar, sabia que tinha tocado em uma ferida, uma ferida que não havia se cicatrizado. Ele pegou seu balde e sua pá e foi para ao lado de Sylph continuar seu trabalho, chegando mais próximo disse:

- Eu não perdi ninguém, mas estou aqui por que achei que iria me encontrar sabe. – Disse Uniz falando mais baixo, como se estivesse envergonhado. – Achei que iria descobrir quem eu sou de verdade. – Completou.

- Eu acho que estou aqui para fugir de mim mesmo. – Disse Sylph se virando para Uniz que agora percebera um olhar triste e distante de Sylph.

Ambos não se falaram mais, o silêncio tomou conta do ambiente dali em diante e após isto passaram o resto do dia a tirar a lama, limpar a casa retirando a poeira, organizar a refeição, preparar as velas e entre outras coisas.

A noite chegou e todos foram aos seus aposentos, com exceção de Senzei, Rarui e Uniz, que resolveram montar uma fogueira do lado de fora dos aposentos. Como Rarui era músico ele levou seu instrumento improvisado que ele deu o nome de “Toca Algo”, que era um pedaço de madeira com uma parte oca no centro e por cima algumas cordas feitas de fios de roupas velhas que estavam esticadas e cruzava o pedaço de madeira de uma ponta a outra, o som não era nada bonito quando ele tocava, mas poderia se dizer que era funcional, fazendo jus ao nome. Rarui cantava bem e isto meio que fazia as pessoas ignorarem o som desafinado daquele instrumento bizarro que ele com muito esforço tentava tocar.

Rarui era o mais baixo de todos, tinha um cabelo encaracolado e sardinhas no rosto, ele não tinha dois dos dentes da frente e tinha uma barba rala que dava para ver uma cicatriz no queixo.

A fogueira fora acessa por Uniz e Senzei que trouxe um pouco de carne mergulha em água que estava dentro de uma lata de ferro bem amassada, ele apoiou a lata em cima da fogueira com alguns gravetos e deixou a carne cozinhar. Rarui foi o último soldado a se juntar, estava com os demais há apenas poucos dias e aproveitaria a noite para contar um pouco da sua história por meio de suas músicas.

Logo pegou seu instrumento bizarro e começou:

Tão longe daqui para o sul dali é onde nasci

No Reino de Aldhagaz para lá a um tempo atrás

Eu percebi que nada iria fazer, prefiro morrer.

Do que ter nada além de pó a oferecer

Então resolvi que era de partir e por isto estou aqui

E por isto eu estou aqui

A última frase repetida mais umas sete vezes e conforme ia cantando, Senzei e Uniz se entreolhavam, pois esperavam algo muito melhor. A voz de Rarui era encantadora, mas a letra e o som do instrumento bizarro faziam uma combinação bizarra, mas ele continuava cantando:

Eu queria pescar e viajar, mas resolvi que iria nadar.

Ao tentar e quase me afogar decidi que iria desistir

Eu ouvi falar de um lugar onde era possível sonhar

Um posto avançado e bem isolado que me disseram que eu iria ficar maravilhado

Mas me enganei e de novo errei e por isto pensei

Por que eu estou aqui?

E desta vez ele repetia mais vezes a última frase e desta conforme fazia Senzei e Uniz continuavam se entreolhando com uma cara de desprezo para aquilo que Rarui estava cantando.

- Porra. – Gritou Uniz. – O que você esta fazendo? – Completou em um tom mais baixo, mas com muita presença.

Rarui engoliu em seco e logo parou de tocar, suas bochechas ficaram rosadas quase que imediatamente e logo deixou o instrumento bizarro no chão e comentou. – Nada, melhor eu parar. – Completou agora cabisbaixo.

Senzei deu uma risada alta e isto fez com que não deixasse brecha para um clima mais tenso entre eles e logo para mudar o rumo da conversa falou:

- Terui e Cazi estiveram na vila hoje de manhã, vocês ficaram sabendo do que eles disseram? – Senzei mudara completamente de assunto e quando falou isto perceberam que alguém se aproximara da fogueira, perceberam que era Sylph e Mizota.

Mizota era um soldado mais alto que Sylph, provavelmente o mais alto de todos lá, ele não era tão forte mas tinha ombros muito largos, além de um cabelo que ia até os ombros e uma longa barba que ia até o percoço.

- A vocês resolveram se juntar a nós? – Comentou Uniz se virando para eles.

- Tentar dormir com esta cantoria dos infernos não esta funcionando. – Disse Mizota.

- Resolvemos nos juntar a causa. – Disse Sylph.

- Sentem-se logo, Senzei estava fofocando algo. – Disse Uniz.

Senzei pegou alguns gravetos no chão e jogou na fogueira para mantê-la acessa conforme Sylph e Mizota se sentavam no chão frio daquela noite e iam se ajeitando para se juntar ao demais. Quando Senzei viu que todos se acomodaram continuou:

- Bem Terui e Cazi foram até a vila hoje de manhã e disseram algo, sobre alguns boatos que ouviam por lá. – Comentou Senzei.

- O que? – Disse Mizota.

- Bem aparentemente o reino de Dragouin esta se militarizando, reunindo mais pessoas para o exército.

- Isto não é contra as normas de paz entre os oito reinos? – Comentou Rarui.

- Sim, mas aparentemente estão ignorando isto. – Disse Senzei.

- Puta merda, agora fudeu. – Disse Uniz. – Uma guerra esta a caminho.

- E dai? Nós como soldados dos magos não podemos participar. – Disse Mizota.

- O problema se torna maior agora, pois o reino de Hadeleyste que divide território com o reino de Dragouin, acabou que resolveu mover suas tropas para o entorno do rio Cepphas, que fica próximo a divisa. – Disse Senzei.

- Puta merda é guerra na certa – Disse Uniz.

- Não precisamos ser pessimistas, os outros reinos devem dar uma resposta em breve. – Comentou Sylph. – Digo, são sete reinos contra apenas um reino na pior das hipóteses, certo?

- Errado, Dragouin possui uma vantagem gigante de terreno, pois seu território é abraçado pela cadeia de montanhas de Grauzdir. – Disse Mizota.

- Eles ficam isolados lá praticamente. – Disse Rarui. – Difícil para um reino invadir, mas não impossível.

- Mas suficientemente eficiente para conter um exército muito maior. – Disse Senzei.

- De qualquer forma, ainda é cedo para afirmarmos algo certo? – Disse Sylph. – Mas quem está no comando de Dragouin agora?

- Dizem que é o filho do rei Allberth, chamado Drehiiz. – Disse Rarui.

A fogueira soltou faíscas agitadas e Rarui pegou alguns gravetos ao seu lado e os jogou para manter o fogo acesso.

- Quero que se explodam nós não temos nada a ver com isto afinal. – Disse Uniz. Após se levantou e se esticou. - Eu vou é dormir.

Todos o olharam seguir rumo à escuridão da noite até sumir de vista, indo em direção aos aposentos, ninguém questionou sua decisão.

- Agora que lembrei, falando em guerra, tem aquele problema daquela mina abandonada. – Disse Rarui.

- Que mina abandonada? – Questionou Senzei.

Um grito faz com que o silêncio da noite se quebre, os que estão ao entorno da fogueira percebem que são os soldados que estão de guarda na muralha e novamente ouvem o grito e desta vez eles entendem o que esta sendo falado.

“CAPITÃO”

Um sino começa a ser tocado, bastante alto e estridente. A palavra é repetida e todos se levantam da fogueira, logo começam a aparecer soldados de todos os lados e até mesmo Uniz volta. Ouvem então outro grito.

“O MAGO CHEGOU”

Ozu chega em meio a multidão dando gritos de ordem a todos “ Se aprontem”, “Em fila”, “Fiquem em fila”, logo todos se juntam ao lado do enorme portão da muralha e fazem duas filas de solados, criando uma passagem em meio a eles. O portão se abre e a ponta se abaixa. Sylph está muito atrás da fileira de soldados e apenas consegue ver um pequeno vislumbre da ponte descendo.

Logo se ouve barulho de cavalos e então Sylph percebe que são duas pessoas montadas em dois cavalos, completamente encapuzas e impossíveis distinguir quem e como são. Elas passam cavalgando lentamente por meio dos soldados, vão até o final da fila e descem, são recepcionadas por Ozu que está em pé ao lado de mais dois soldados, logo faz um sinal apontando para a grande casa, logo caminham em direção a mesma e adentam o local, de forma simples e rápida.

Sylph apenas suspira e vê os soldados se desfazendo, a ponte subindo e o portão se fechando, logo retorna com os demais para a fogueira, onde ficam especulando a noite toda sobre os supostos novos convidados e como seria o tal mago ou mesmo o por que chegar tão tarde da noite desta maneira repentina.

Saah__
Enviado por Saah__ em 22/11/2018
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