No Reino do “PAU EM BRASA” Capítulo II

Marcos Barbosa

CAPÍTULO II

A vida doméstica do cientista de "Pau em Brasa"

O Reino do Pau em Brasa estava muito agitado com as fantásticas descobertas do grande cientista, Dr. Diógenes Maubássi. Mas apesar das solicitações de entrevistas, dos compromissos sociais e das constantes perturbações do chefe do laboratório de pesquisas, naquele dia, aquele “homem de ferro” foi mais cedo para casa. Chegando, começou a escrever na mesa da cozinha e sua mulher assistia ao jornal pela televisão, acompanhada de algumas amigas. Terminado o jornal, após despedir as amigas, dona Maria Baladelli procurou o marido cientista.

— Dr. Diógenes Maubássi, vamos dormir. Disse a esposa, com os olhos esbugalhados de sono e argumentou: Você deve dormir cedo, senão depois fica na cama até as onze da manhã e aquele seu chefe antipático não para de telefonar toda hora.

— Você está me atrapalhando... Assim não dá!... Desse jeito eu perco a minha inspiração.

Dona Maria e a irmã de Dr. Diógenes Maubássi foram dormir. O cientista continuou a escrever em sua velha máquina. Somente ele e poucos homens do planeta poderiam se interessar por aquele artigo científico que escrevia. Eram artigos que deveriam ser publicados nos jornais de defesa de uma nova ciência revolucionária. Escreveu duas laudas e se deu por satisfeito. Dirigiu-se ao quarto de dormir, olhou longamente para o filho e prometeu a si mesmo que acordaria no outro dia bem cedinho. Abaixou-se suavemente e sussurrou no ouvido da esposa:

— Benzinho, eu sei que você está acordada, não precisa fingir. Diga francamente que você está chateada comigo porque eu te tratei mal agora há pouco. É que eu estava inspirado e não poderia perder o fio da meada. Você sabe que quando alguma coisa me atrapalha eu não consigo mais escrever.

— É... Ta certo. Você me trata assim como uma coisa né?... Tudo bem. Eu sou uma coisa que de vez em quando atrapalha o grande cientista. Deixe-me dormir, hoje eu não quero nada com você. Além do mais estou com sono e cansada, esta casa é muito grande e dá um trabalho incrível.

— Está bem meu amor. Durma com os anjos.

— Você sabe que eu não trairia você nem com os anjos... Meu querido... Por que de vez em quando você resolve ser bruto comigo? Eu gosto de você... Sabe... Eu acho que não mereço isso.

— Está bem Maria... Eu também te amo muito, mas queria que você entendesse os meus momentos de inspiração.

— Eu entendo sim. Eu sei que você vai conquistar os seus ideais e vai atingir todos os seus objetivos e ainda será reconhecido no mundo inteiro.

— Está certo. Eu concordo porque me apoio num ideal de lutar pelo bem da humanidade e você me incentiva muito a confiar mais em minha capacidade.

A conversa do casal prosseguiu noite adentro e quando perceberam já eram duas horas da manhã. Resolveram de comum acordo dormir sem fazer amor esta noite. Dr. Diógenes Maubássi levantou cedo, escovou os dentes, lavou o rosto e passou uma água nos cabelos difíceis de pararem penteados. Depois de fazer o seu desjejum de bolo de milho com banana, a irmã Meire pediu que levasse um pouco de bolo na loja onde dormiam os pais dos dois. As outras duas irmãs de Dr. Diógenes Maubássi esta noite não dormiram em casa. A Mírian estava hospitalizada e a Mariinha dormiu na casa da Bethy. Dona Maria, esposa do Dr. Diógenes Maubássi lavava as fraldas do primeiro filho do casal, já com quatro meses de idade e enquanto isto tia Meire já brincava com o sobrinho no terreiro, à sombra de um pé de abacate. Sentado numa poltrona abaixo da calçada, o cientista escreve com a velha máquina em cima de uma cadeira apoiada sobre a rústica calçada de cimento. Levanta-se e vai até a cozinha beber um copo d’água. Enquanto isto ouve um desabafo de sua irmã Meire:

— Sabe quem ganhou a casa do CPA, Dr. Diógenes ?

— Não, não sei. Eu só sei que nós não ganhamos. Aliás, não fomos SORTEADOS para comprar casa do BNH.

— Sabe quem foi?... - voltando ao assunto - Foi o Mauro da dona Escolástica. Ele tem uma enorme casa bem ali. E você sabe que quem tem casa não pode ser beneficiado com os sorteios da COHAB?

— Sei. Mas então porque você não denuncia que ele está burlando a lei?

—Eu ehm... E emparelhando os dois dedos indicadores num movimento, completou - ele é assim com os homens ói, assim com os homens.

Dr. Diógenes Maubássi voltou, mudou de lugar o seu “escritório” ao ar livre e notou que seu filho, Marco Aurélio estava sendo cuidado pela Joseane, uma menina de sete anos, filha de dona Margarete com o “seu” Chico. Vizinhos bons e prestativos, sempre prontos a dar uma mãozinha no que fosse preciso. Lá dentro da casa estava Lú... Luzinete, encerando o piso. Ela é filha de um vizinho do Dr. Diógenes Maubássi que além de ser um bom mecânico tem um conjunto de música caipira e toca quase todo domingo no programa de televisão Compadre Crispim. Baixinho - Mané, para dona Cidinha, sua esposa, - está crescendo a “olhos vistos” nesse meio artístico. Todos comentam o sucesso do “Baxim” aqui no IPASE, em Várzea Pequena, vila da fronteira na província de Mato Grande.

Neste sábado Dr. Diógenes Maubássi não tem expediente no laboratório e resolveu tirar o dia para escrever. Completou o texto iniciado no dia anterior e deu um título à matéria “EM DEFESA DE UMA NOVA CIÊNCIA REVOLUCIONÁRIA”. Satisfeito com a matéria escrita para um jornal de Mato Grande, pensou: “o ato da criação intelectual é como a gestação de uma criança. A sua manifestação no papel é equivalente ao parto. Ato final da criação”. Olhando a sua volta notou que estava rodeado de crianças. Olhou para uma delas e cumprimentou:

— Ôi Leomar, faz horas que você está aqui?

— Faz sim. Estou olhando você escrever.

— Ah... Sim. Você sempre me namorando, né? Olha... Você conhece a Lú? Ela estava ajudando a Maria na limpeza da casa.

— Eu também ajudei. Passei a enceradeira e espanei os móveis.

— Muito bem Leomar. Vocês são umas crianças ótimas. Por isso que eu gosto de vocês. E como vai o “Seu” Sabino e dona Maria? Faz tempo que não os vejo.

— Estão bem. O pessoal lá perto de casa reclama que desde que vocês mudaram nunca mais apareceram. É tão pertinho... Bem que você podia ir num domingo visitar os velhos amigos.

Neste momento chega um casal da Província de Rio Grande do sul para tomar chimarrão. Célio e Ení são caminhoneiros por profissão e trabalham com uma carreta nas estradas. Conhecem quase todas as províncias do Reino do Pau em Brasal e quando chegam aqui nesta Província de Mato Grande, passam por Várzea Pequena e habitualmente tomam o chimarrão duas vezes por dia com a família do Dr. Diógenes Maubássi. Contaram casos no estilo próprio dos Gaúchos, tomando mate, e nos surpreenderam com a notícia de que o Raphael, filho do vizinho havia tombado o caminhão na estrada. Célio e Ení ouviram a leitura do artigo que o cientista acabava de escrever. A mulher do gaúcho até pediu que repetisse alguns trechos depois da leitura. Logo depois chega o pai do Dr. Diógenes , Sr. Marcelo. Furou a roda de chimarrão e tomou algumas cuiadas para almoçar.

Depois do almoço, o pai do Dr. Maubássi passou pelo laboratório de fitologia doméstica do cientista e jogou fora algumas mudas de broto de arroz sobre os protestos do filho. A experiência deveria comprovar uma tese de conservação das propriedades vitamínicas do cereal. As vitaminas se desperdiçam com o processo de beneficiamento do arroz, mas com a germinação, estas vitaminas se fixam no grão, sendo total o seu aproveitamento pelo metabolismo do corpo humano. O mais difícil agora, era separar a casca do arroz germinado e transformar aquele embrião numa massa alimentícia para consumo imediato sem uso de aditivos químicos antinaturais.

— Esta é mais uma das suas “experiências sem futuro...” o que você precisa fazer é se firmar no emprego. Ouvi dizer que está pretendendo deixar o Laboratório de Pesquisas Tecnológicas. Você não pára mesmo em nenhum emprego. Fica marcando passo e não vai pra frente. Isto mesmo, não vai pra frente. Nada que você fez até hoje deu certo. – De fato o velho não acompanhava o sucesso profissional do filho, estava completamente desinformado sobre as atividades do grande cientista.

— Ora meu pai, o Senhor não sabe o que está falando. Se não tem capacidade para avaliar o que já fiz pela humanidade se não sabe reconhecer a importância do meu trabalho, das minhas invenções não me desestimule dizendo que o que eu faço não dá certo, não tem futuro, etc. e tal.

Depois de uma breve pausa, o velho resolveu mudar de assunto.

— Você não vai ver sua irmã hoje, no hospital São Tomé?

— Hoje não. Talvez amanhã. Pretendo passar o dia todo escrevendo.

— Amanhã não adianta mais, porque a Meire vai visitá-la.

— Está bem... Eu vou pensar nisto.

O período da tarde deste dia transcorreu tranqüilamente. A Meire, que é professora foi dar aulas na Escola Adalgisa de Barros e a Mariinha saiu com a Bernadete, uma amiga de Praia Grande que veio passar o dia em Várzea Grande. Nestas circunstâncias o Dr. Diógenes, dona Maria e o pequeno Marco Aurélio ficaram sozinhos na casa.

Dr. Diógenes continuou a escrever, após fazer o quilo do almoço. Passou a tarde escrevendo, lendo e relendo os seus escritos para corrigir algum erro de português que inadvertidamente aparece quando se datilografa com muita rapidez. Muita vez Maubássi escrevia uma palavra pensando em substituir a anterior e preocupado com a seguinte. Daí o surgimento das palavras truncadas. “Erro de caquilografia”, sempre dizia com humildade. Todas as vezes que fazia a autocrítica do texto, era assim: Disfarçava com excessiva modéstia, que era veloz para pensar e escrever direto na máquina de datilografia.

— Você quer um lanche, querido? Perguntou dona Maria Baladelli, já com um suco de laranja preparado e uma travessa com bolo de fubá de milho.

— Quero sim. Obrigado meu amor. Você é a melhor mulher do mundo... Veja, se não me lembrasse a hora de comer eu morreria de fome.

— Convide o moço que está trabalhando aí para fazer um lanche.

O pedreiro estava colocando a pia no banheiro, derrubada pelo cientista num momento de distração. Depois da segunda chamada em que o pedreiro não compareceu para o lanche, o Dr. Diógenes pegou a tigela de bolo e um copo com suco de laranja e levou até o banheiro, onde o suculento lanche foi prontamente devorado pelo operário. O Dr. Diógenes Maubássi percebeu que o rapaz estava esperando que insistisse, notando ser este um costume normal destas pessoas humildes.

Chegou a hora do chimarrão da tarde. Dessa vez, além do casal de gaúchos, fizeram companhia para a professora Meire um vizinho da frente, que sofre de anemia de Cooley, o Marquinhos. Certa vez o irmão do cientista, jornalista Marcelino Silveira, propôs divulgar pela imprensa o caso deste jovem, mas encontrou resistência por parte de sua irmã, que sofre a mesma doença e sente-se mal quando alguém fala nesse terrível mal hereditário. O objetivo de Marcelino era chamar a atenção do Reino do Pau em Brasa para um caso que poderia ser resolvido, senão aqui, talvez num Reino distante. Se o caso deste casal com anemia de Cooley fosse divulgado, ficaria uma pergunta no ar: “Qual instituição de saúde, do Reino do Pau em Brasa sentirá a responsabilidade de financiar o tratamento dos irmãos”?

— Eu concordo com a divulgação, mas a Suzi foi lá colocar minhocas na cabeça de minha mãe. Disse revoltado, o rapaz que sofre do mal do mediterrâneo.

A doença ganhou este nome porque é um tipo de anemia transmitido por hereditariedade às pessoas descendentes das raças mediterrâneas.

— Marquinhos, venha cá. Chamou a mãe do rapaz. Ele já sabia o que era. Despediu-se da rodada de mate-chimarrão e atravessou a rua.

O cientista deitou um olhar triste sobre o menino doente, enquanto este atravessava a rua Afonso Pena, em frente a casa 71, pensando na limitação da ciência e mais triste ainda ficou ao pensar que o seu conhecimento tecnológico não servia para ajudar aquele amigo.

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O escritor e jornalista Marcos Barbosa vai a publicar outros livros no formato tradicional, versão impressa e continuar a coleção UNI-VERSO E PROSA DE MARCOS BARBOSA.

Com quase trinta mil leitores no Recanto das Letras, criou coragem e lançou a campanha PASSANDO O CHAPÉU.

Os três livros de bolso, foram vendidos inicialmente nas bancas centrais de Brasília e em algumas bancas de revistas das capitais do país, a R$ 5,00 apenas, para atingir também aos trabalhadores de baixa renda.

Os contos publicados pela editora Ícone de Brasília são: A MORTE DO SOL E O BURACO NEGRO; O Herói de "Mensagem a Garcia" e um livreto de poesias SAGA DA HUMANIDADE, todos já lidos por muitos "freqüentadores" do RECANTO DAS LETRAS.

O objetivo é desenvolver uma estratégia de marketing para escapar da alta roda dos intelectuais e atingir aqueles que mais precisam de leitura, o homem comum, do povo.