Isolamento do mundo

Havia já sete dias que Jorge estava lá embaixo. Sete dias sem a luz do sol. Sete dias sem dormir em uma cama confortável. Sete dias sem comer algo que prestasse. Sete dias sem trocar uma palavra com alguém que não ele mesmo. Sete dias pensando e pensando e pensando em absoluto isolamento do mundo lá de cima. Fazendo, afinal, o desenvolvimento que ninguém vê, concluiu o operário, cogitando vagamente uma mudança de emprego.

Mas sua semana chegava ao fim, finalmente. Logo o vagão com o próximo operário se faria ouvir; o som de sua folga. E ele, Jorge, desfrutaria o retorno de rei a sua casinha de três cômodos: uma sala apertada de sofá fedorento, um quarto com goteira bem onde fica o pé da cama, e um banheiro que a cada descarga prometia explodir. E Jorge cogitou, em hipóteses esfumaçadas, assim que lembrou dos detalhes, que aquela casa não prestava muito não.

E cadê o próximo operário? Está atrasado, desconfiou Jorge. Uma hora, duas horas, três horas. Cadê? Quatro, cinco, seis horas de atraso, e Jorge começou a ficar perturbado. Bem, nada perco em ir de encontro ao vagão, decidiu ele, e pôs-se a caminhar trilho acima, na suave inclinação até a distante superfície. Foi quando pensou anuviadamente que a companhia pagava mal demais para nem ao menos ir pegá-lo onde tinha de ir pegá-lo.

Mas não encontrou o vagão com o próximo operário. Jorge andou todo o caminho de volta por aquele túnel quase sem fim, imerso em sua habitual solidão de sete dias. E quando chegou à saída o ar açoitou-lhe a face enquanto o sol ardia em todo o resto. O ar da cidade, o sol da cidade, ambos fritos no concreto abundante em torno. Ar, sol!, exultou o operário. Um ar puro, quieto. Estranho. Um ar sem buzinas, pois não havia carros. Ar que não passou pela multidão da calçada, pois não havia multidão na calçada. Jorgeu olhou no relógio de pulso: 15:47. Cadê o povo?, questionou o nada. Meio da tarde de uma segunda-feira e nada. Nada. Absolutamente nada ou ninguém a sua volta. Escutou que o vento dobrava a esquina ruidosamente, e outra esquina, e mais outra dobrada, sempre com um som que de tão sozinho Jorge podia acompanhar por quadras e quadras e quadras...

E então o operário cogitou, sombriamente, que alguma coisa estava terrivelmente errada.