Classe mundial

No caminho para o aeroporto de Barranquilla, a limusine que conduzia Frank Carmona foi interceptada por dois veículos utilitários, um à frente do primeiro carro da escolta, e outro após o o segundo carro com seguranças. Os atacantes eram profissionais e usaram armas antitanque. Os seguranças não tiveram tempo sequer para esboçar uma reação; em instantes, os veículos da escolta haviam sido reduzidos à escombros fumegantes.

Naturalmente, o motorista da limusine possuía curso de direção defensiva, mas nada pode fazer quando os quatro pneus - blindados - foram estourados com tiros de precisão. Os atacantes, cerca de 8, mascarados e vestidos de preto com uniformes que imitavam os das Forças Especiais, cercaram o carro, fuzis em riste. Um deles, que parecia ser o chefe e usava um Rolex no pulso esquerdo, gritou em inglês:

- Carmona! Para fora! Se não sair, nós o arrancaremos daí!

Carmona já havia acionado o sinalizador de emergência, para que a filial local da World Resources, Incorporated mandasse um grupo de Intervenção Tática Urgente, e portanto, tentou ganhar tempo.

- Quem são vocês? - Gritou de volta. A limusine, bem como seus vidros, era blindada, naturalmente. Teoricamente, isso lhe daria alguma proteção, embora ele tivesse dúvidas de por quanto tempo, já que os mascarados poderiam atirar à queima-roupa e com armamento de grande potência.

- Tempo esgotado, Carmona! - Gritou o líder.

Dois mascarados aproximaram-se, um de cada lado da limusine, munidos com marretas. Sem aviso, começaram a bater com toda a força nos vidros das portas. Estes não aguentaram muito tempo e se esfacelaram. Carmona viu-se frente à frente com uma pistola .45 apontada para o seu rosto.

- Saia! - Gritou o homem.

Carmona não teve outra saída que não abrir a porta e sair, mãos na cabeça.

- E o motorista? - Indagou o mascarado que o mantinha na mira da arma, para o líder.

- Não temos espaço para ele - foi a resposta seca.

O mascarado do lado oposto do carro aproximou-se e atirou uma única vez, para dentro da limusine. Um disparo certeiro, na nuca.

Um terceiro veículo, um automóvel de luxo prateado, surgiu à frente do comboio destruído. Carmona foi conduzido até lá, e enfiado no porta-malas após ser vendado, amarrado e amordaçado. Por fim, o grupo partiu no sentido inverso ao do aeroporto, cantando pneus.

* * *

Além da venda, um saco de pano preto havia sido colocado sobre sua cabeça, quando o retiraram do porta-malas. Ele foi conduzido, meio que arrastado, por dois homens, que o jogaram em uma cadeira de espaldar reto. Finalmente, o saco e a venda foram removidos. Ele piscou os olhos ao ser exposto novamente à luz. Luz fluorescente branca. Estava numa sala de talvez 4X4 m, piso e paredes de cimento, sem acabamento. O teto fora pintado de branco. Sentado em outra cadeira à sua frente, estava o líder dos atacantes, com seu Rolex no pulso, ladeado por dois mascarados com fuzis nas mãos.

- A companhia não vai negociar com vocês - avisou Carmona. - É nossa política. Não negociamos com sequestradores.

- Não queremos resgate, Carmona - atalhou o líder.

- Se querem me usar para ter acesso aos sistemas da companhia, tampouco lhes serei útil. Quando atacaram o meu comboio, emiti um alerta para a WRI. Imediatamente, todos os meus códigos de segurança foram revogados. Mesmo os biométricos.

O líder deu uma risadinha.

- Não queremos a droga dos seus códigos de acesso, Carmona.

- Então... o que querem de mim? - Indagou, surpreso.

- Queremos a verdade, Carmona. Queremos saber o que é realmente a WRI.

- Mas... vocês sabem o que é a WRI... é o maior conglomerado empresarial do planeta! - Exclamou Carmona.

- Não precisamos da sua propaganda institucional, Carmona. Queremos saber o que faz da WRI ser o que é. Como consegue não só criar novas tecnologias, como prever seu surgimento - antes de qualquer concorrente.

Houve um instante de silêncio. Finalmente, Carmona limpou a garganta.

- Se eu falar, me deixarão ir?

O líder deu uma gargalhada.

- Carmona, você já é um homem morto! Mas dependendo da qualidade da informação que me der, prometo que terá uma morte rápida...

O executivo engoliu em seco. Ele sabia que aquilo não era um blefe.

* * *

Irritado, Gary Kildall jogou o relatório impresso sobre a escrivaninha. Do outro lado da mesa, Bill Gates e Steve Jobs o encararam em expectativa.

- Foi para isso que gastamos 4 milhões de dólares?

- Eu avisei que os resultados poderiam não ser... alvissareiros - comentou placidamente Bill Gates.

- Universos paralelos! Que maluquice é essa! - Explodiu Kildall. - A WRI desenvolveu na década de 1970 uma tecnologia que lhe permite visualizar universos paralelos e assim... rouba... a tecnologia que está sendo desenvolvida lá? Isso parece lógico para vocês?

- Para mim, faz todo o sentido - ponderou Jobs. - O computador pessoal com interface gráfica, o tocador de música MP3 e até mesmo o telefone inteligente foram roubados de uma empresa que o meu similar em outro universo fundou, a Apple.

- E um Bill Gates paralelo transformou a Microsoft numa das maiores empresas de informática do planeta - observou Gates. - O navegador de internet que a WRI comercializava, lá ficou conhecido como Internet Explorer... e nem vou falar no Game Gear da WRI, que a Microsoft paralela denominou XBox. Esses FDPs nos roubaram tudo!

Kildall olhou para seus parceiros, tentando concatenar as ideias.

- E o que vamos fazer com essa informação? Não podemos simplesmente processá-los, até porque a conseguimos matando meia dúzia de pessoas!

- E, legalmente, eles registraram todas essas invenções - ponderou Jobs.

Silêncio. Finalmente, Bill Gates ajeitou os óculos e comentou, em tom casual:

- Eu tenho uma ideia...

- Desembuche! - Exclamou Kildall.

- Sabemos onde está localizado o principal centro de pesquisa da WRI, aquele onde, supostamente, fazem a tal pesquisa em universos paralelos. Correto?

- Sim, e daí? - Inquiriu Kildall.

- O que precisamos é de um atentado terrorista ao lugar. Algo que acabe com as instalações durante um bom tempo... um ano ou mais.

- Em um ano não poderemos recuperar as décadas de atraso perdidas... - disse Jobs.

- Não é essa a ideia. A WRI precisará reconstruir as instalações... lá, ou em outro lugar. E terá que repor os quadros que forem mortos no atentado... técnicos, cientistas... e aí poderemos infiltrar o nosso pessoal para roubar deles a tal tecnologia de observação!

Kildall e Jobs olharam para Gates, surpresos.

- É uma ideia louca, mas pode dar certo... - ponderou por fim Kildall. - E, pelo menos lhes daríamos um recado de que o seu segredo deixou de ser exclusivo!

- E pessoal... - atalhou Gates, como se tivesse se lembrado de algo importante. Com a atenção dos outros dois sobre si, prosseguiu:

- Vamos ver se fazemos parecer que foram os russos os autores do atentado. Afinal, que melhor alvo para a União Soviética do que a WRI, símbolo do capitalismo opressor?

- Gênio! - Exclamou Kildall, batendo palmas.

- [29-10-2017]