Número 12 é a sua cara

- De que tipo de corpo ele gosta? - Indagou a biomodeladora, sentada em frente ao painel semicircular do compositor holográfico.

- Corpo... eu trouxe a minha amiga Raniva-Sur para servir de modelo - explicou Zorava-Hava, enquanto a interpelada erguia-se e graciosamente colocava a palma da mão sobre um dos sensores biométricos do modelador. A biomodeladora dispensou-lhe um olhar analítico e rodou o programa de composição preliminar.

- É um bom projeto este seu... meio rodado, mas é um bom projeto - admitiu.

- Meio... rodado? - Raniva-Sur pôs a mão contra o peito, esforçando-se para não franzir a testa.

- Já vi muitas iguais à você por aí - prosseguiu a biomodeladora, exibindo alguns projetos básicos em hologramas tridimensionais . - Veja aqui, essa número 12 da Myra Malachi... é a sua cara.

- Parece mesmo com você - avaliou Zorava-Hava, computando as proporções da imagem escultural que rodava preguiçosamente no ar, desenhado em linhas azuis fluorescentes.

- O número 12 da Myra Malachi é um clássico - defendeu-se Raniva-Sur. - Robôs que adotam o sexo feminino, geralmente escolhem este projeto ou um dos seus derivados... faz sucesso entre homens biológicos. Eu, pelo menos, não tenho do que reclamar.

- Como eu disse, - atalhou a biomodeladora - é um bom projeto. E, sem dúvida, os homens gostam. Mas também pode ser uma faca de dois gumes: induzir ao cansaço visual. Afinal, anda-se por aí e tropeça-se em meia dúzia de ex-robôs com o mesmo conceito básico, variando só nos apetrechos...

E num tom conciliador para Raniva-Sur:

- Mas eu gostei do que fez com seu cabelo. Ficou muito bonito.

Raniva-Sur sorriu, ajeitando as longas melenas cacheadas, cor de ferrugem.

- Ah, isso é meu... não fazia parte do projeto original!

- Sem dúvida. Suas colegas geralmente usam o cabelo no estilo "boi lambeu", variando somente na cor - avaliou a biomodeladora.

E, novamente para Zorava-Hava:

- Bom, então sabemos que o seu homem gosta do modelo 12 da Myra Malachi, o que provavelmente comprova que ele está com seus hormônios em ordem. Mas não queremos que ele goste demais, ou senão vai ficar com sua amiga, que já é um modelo 12.

Raniva-Sur deu uma risadinha maliciosa.

- Nada contra essa ideia, irmã.

E cutucou o braço metálico da robô de longo de seda ao seu lado.

- Me faça mais atraente do que ela... se isso for possível - retrucou Zorava-Hava num tom delicado, mas firme.

- Por isso você está aqui... - retrucou a biomodeladora - eu sou uma artista, não uma filial da Myra Malachi!

Deteve-se por alguns instantes nas curvas de Raniva-Sur, que havia sentado-se novamente, pernas cruzadas. Depois, começou a digitar no painel semicircular, fazendo com que as teclas se acendessem e brilhassem sob seus dedos ágeis. A imagem holográfica suspensa começou a mudar, sutilmente.

- Eis - declarou ela por fim.

- É... perfeita - computou Zorava-Hava, medindo automaticamente as proporções.

- Meio cheinha, não? - Inquiriu Raniva-Sur.

- Esse projeto meu, foi baseado numa mulher real - descreveu a biomodeladora. - Pela descrição que me enviou do seu homem, ele é chegado a coisas "vintage", não é? Como a própria espaçonave que pilota... que coisa exótica, uma espaçonave sem inteligência artificial!

- Uma mulher real? - Zorava-Hava inclinou a cabeça metálica, como que para ver melhor o holograma que flutuava à sua frente.

- Uma mulher real, uma atriz, do início do século XXI. Suas medidas: 1,68 m de altura, 90 cm de busto, 60 cm de cintura e 86 cm de quadril. Cheinha? Sim. Mas se ele gosta da sua amiga, vai gostar de você muito, muito mais... - sugeriu a biomodeladora.

Zorava-Hava virou-se para Raniva-Sur.

- O que acha?

A jovem cruzou os braços, uma sobrancelha erguida.

- Estou começando a ficar com inveja de você, irmã.

- [21-06-2018]