Forrester (o nome do mundo)

[História vinculada: "Mudança permanente"]

Forrester havia marcado o encontro numa estação espacial em órbita de Gopasa-IV, uma super-Terra coberta por oceanos, na fronteira do Espaço Conhecido; a estação era habitualmente usada como entreposto, para negociar com culturas alienígenas vizinhas, menos desenvolvidas. Como em toda região de fronteira, ali nem sempre as leis dos mundos centrais da Confederação eram cumpridas ou seguidas, e os homens da lei ou tinham muito trabalho, patrulhando vastas regiões com pessoal reduzido, ou simplesmente não apareciam durante longos intervalos de tempo. Ambiente perfeito para aventureiros e "empreendedores heterodoxos", como autodenominava-se Forrester.

- Então, você está voltando do Território Qyamun - comentei, tão logo nos vimos num reservado de bar, frente a duas cervejas toralianas que brilhavam nos copos altos num tom de laranja profundo.

- Levei anos conquistando a confiança deles - replicou Forrester, tomando um longo gole e passando a língua pelos lábios para remover a espuma branca. - Creio que finalmente meu esforço foi recompensado.

Retirou de um bolso do casaco de pseudo-camurça, um tubo plástico com tampa metálica, contendo um líquido verde, e o depositou sobre a mesa.

- Imagino que seja a amostra que me prometeu - avaliei, sem tocar no objeto.

- Fito-serotonina pura, extraída do mundo-floresta de Laqsih, no Território Qyamun - declarou ele.

- Quanto conseguiu retirar de lá, exatamente? - Indaguei, sem aparentar grande interesse.

- Nada que despertasse as suspeitas dos qyamun... cerca de um quarto de tonelada.

Aquilo não era nada impressionante, e ambos sabíamos disso. Onde estava o truque, perguntei-me.

- Você não me fez percorrer 400 anos-luz para me empurrar 250 kg de fito-serotonina, certo? - Questionei, tomando um gole de cerveja.

- Esse carregamento é só para estudos - admitiu Forrester. - Não, sequer está à venda.

Perante o meu silêncio, resolveu desembuchar:

- Imagine que pudesse abastecer o mercado com quantidades ilimitadas... ou quase isso... de fito-serotonina? Não estou falando da porcaria sintética, mas disso aqui...

Ergueu o frasco com o líquido verde.

- Ditaríamos o preço do mercado - avaliei. - Mas como conseguiria essa proeza? Conseguiu fechar um acordo de exploração do mundo-floresta com os qyamun?

- Não. E duvido que alguém consiga - reconheceu.

- Então, qual é a mágica?

Eu havia mordido a isca. Forrester abriu um vasto sorriso.

- Está curioso agora, não é? Como eu lhe disse, levei anos construindo uma relação de confiança com os qyamun... a minha primeira formação, em engenharia florestal, também muito me ajudou. Para os qyamun, eu sou apenas o dr. Forrester, um estudioso de mundos-floresta... e que está montando um viveiro de mudas para melhor estudar a realidade destes planetas.

- Um viveiro de mudas - ergui os sobrolhos. - Contrabando. Biopirataria.

Forrester deu de ombros.

- Laqsih é sagrado para os qyamun, mas não se importam que pesquisadores - como eu - levem mudas e sementes para estudo. A ideia do viveiro é legítima... o que eu não lhes contei, foi sobre a escala do mesmo.

- Vai criar sua própria floresta num outro planeta - conjecturei.

- Não, Gardner - retrucou ele, muito sério. - Pense grande: eu vou criar meu próprio mundo-floresta... e gostaria de tê-lo como patrocinador e sócio.

Tive que reconhecer que, ao menos, Forrester não poderia ser acusado de falta de ambição. Um planeta inteiro, produzindo fito-serotonina?

- Há muita coisa que teremos que avaliar... - redargui. - Sobre o planeta-candidato, nem vou perguntar, porque é óbvio que já o encontrou, e fora do Espaço Conhecido.

Forrester apenas balançou a cabeça em concordância.

- É um empreendimento muito, muito grande... - ponderei. - E que, se for concluído, nos dará tanto poder quanto o de alguns dos estados soberanos da Confederação.

A resposta de Forrester voltou à minha mente tempos depois, quando compreendi seu real significado; naquele momento, contudo, pareceu-me apenas um arroubo megalomaníaco:

- Gardner, este projeto poderá nos colocar no controle da própria Confederação.

- Você pensa realmente grande - repliquei, erguendo meu drinque. - Brindemos a isto.

E tocamos os copos.

- [06-02-2019]