A Superfície do Planeta

Mesmo fazendo uso da propulsão nuclear mais avançada disponível quando do seu lançamento, o Telescópio Espacial Ciclope levou um quarto de século para se posicionar em sua órbita de serviço - cerca de 1.000 Unidades Astronômicas distante do Sol. Apenas para que sirva de comparação, a distância média de Plutão para o Sol é de cerca de 40 U.A.. E o Ciclope era praticamente uma sonda de propósito único, visto que se destinava a observar um planeta bem específico, orbitando uma estrela classe G à 30 anos-luz da Terra. Não havia muitas estrelas singulares como aquela tão próximas do Sistema Solar, muito menos contendo um planeta semelhante à Terra em sua zona habitável. O mundo, batizado de Soror, era considerado uma "irmã" da Terra e um possível alvo futuro para colonização humana.

Posicionada a sonda na escuridão gelada do espaço interestelar, alguns dias se passaram até que ajustasse seu movimento ao de Soror. Além de distante, o planeta estava girando ao redor de sua estrela-mãe, o que tinha que ser compensado pelo telescópio para a obtenção de imagens dele. Um feito julgado impossível há algumas décadas, visualizar diretamente a superfície de um mundo fora do Sistema Solar, havia sido viabilizado pelo uso de engenhosidade, tecnologia, e do Sol, como lente gravitacional, ampliando a luz emitida por um planeta distante até que fosse possível vislumbrar detalhes como mares, lagos e cadeias de montanhas. Caso existissem, naturalmente.

Finalmente, após longas horas de processamento gráfico nos poderosos computadores da agência espacial, as primeiras imagens da superfície de Soror começaram a preencher as telas do controle da missão. O planeta havia sido fotografado no quarto crescente, e na metade iluminada, era possível vislumbrar massas de nuvens, como as da Terra, e também uma extensa calota polar na parte superior, o contorno de um continente, e um oceano pontilhado de ilhas. A maior destas ilhas, situada pouco acima do equador de Soror, chamou imediatamente a atenção de todos no controle da missão.

- Vocês estão vendo o mesmo que eu? - Indagou um dos técnicos responsáveis pela telemetria da sonda.

- Isso é pareidolia... - minimizou um cientista. - A capacidade da mente humana em reconhecer padrões, onde não há nada na verdade...

Mas todos ficaram com a imagem daquela ilha gravada na mente. Parecia quase proposital que estivesse ali, num ponto que certamente chamaria a nossa atenção. Eu não me lembrava de nenhuma formação daquele tamanho na Terra, que lembrasse claramente uma caveira com duas órbitas escuras, acima de uma ilha num estranho formato de "X" - como se fossem dois ossos cruzados.

Soror parecia querer nos dizer, que era melhor manter distância dela.

- [03-08-2019]