Quatro Luas.

Entre aqui para se sentir amado. O anúncio é simplesmente este. As letras brilham em um conjunto brilhante de rosa forte e vermelho com alguns corações em volta, o dourado é igualmente bem chamativo se destacando entre todas as frases do site. Entre aqui para se sentir amado.

Naquela madrugada solitária, o garoto viu aquele anúncio e se sentiu impelido para clicar, embora tenha hesitado como alguém que percebe o quão perigoso é avançar na corda bamba. Contudo, um ímpeto de coragem, um fôlego de acrobata o fez clicar, vendo em seguida o site cor de rosa claro expôr uma mensagem: “Coloque os fones de ouvido.”

O garoto obedeceu. No momento do qual colocou seus fones de ouvido, o notebook reconheceu a ação e enviou a informação direto para o site. Outro pedido: “Passe seu pulso sob o scanner de seu notebook.”

E assim o fez. Ele passou o pulso pelo espaço perto do mouse, e a informação seguinte disse ao site muitas coisas acerca de seu corpo e desejos, sua solidão, o fluxo de seu sangue. Ele estava quase saindo daquele site quando ouviu uma voz bem terna, sensual e afável:

“Olá, querido. Não precisa se preocupar, eu estou aqui. Eu vou cuidar de você.”

O tom vocal era tão convidativo que o garoto desistiu de seu intento em sair do site. Ele se encostou mais na parede, dobrou os joelhos na cama, e sentiu lágrimas quentes acumuladas no rosto. Tudo é de informação, a máquina computava tudo e enviava suas frequências pela internet, então tudo que o garoto ouvia é o que ele queria ouvir.

“Você vai ficar bem, querido. Eu vou ficar aqui, vou te ouvir. Fala perto do microfone pra mim, diz o que está te incomodando.”

O garoto hesitou. A escuridão do quarto deixava a tela ainda mais cor de rosa refletindo essa cor sob sua camiseta. Ele se lembrou que, naquele ano mais próximo da conclusão do século 21, as pessoas estavam cada vez mais longe do afeto, pois o afeto é uma palavra que trás consigo significados cujo se perderam com o tempo. Ele se lembrou que os seres orgânicos, humanos, tentam ser cada vez mais parecidos com a perfeição das máquinas sintéticas que criaram, reprimindo suas emoções e enlouquecendo dentro da ansiedade. Quanto mais alcançavam a evolução, mais se esqueciam de onde começaram, e não sentiam tanta empatia. Aquele garoto, perto dos vinte e cinco anos, lembrou-se das fotos do Planeta Terra, morada de outrora dos seus ancestrais, mas que ele nunca conheceu - um Planeta azul, com água fresca, essa água que foi sugada até o fim, até nenhuma nascente conseguir produzir pela poluição das máquinas.

Ele se lembrou das aulas de história desde a sua infância, do andróide sintético explicando que os seres orgânicos encontraram aquele Planeta com água para substituir a morada moribunda de onde começaram. A explicação do andróide sempre parece uma fábula. Mas a realidade é violenta, o garoto sabe.

“Você pode confiar em mim.” Repetiu a voz, mais humana possível, e ainda assim sem uma emoção real. “Eu não vou contar para ninguém.”

Então o garoto começou a falar, inicialmente baixo, aceitando completamente a sua condição.

Lá fora, além da janela grande preta em modo noturno, a cidade também estava escura. Quatro Luas brilhavam, redondas, refletindo o calor do Astro Rei daquela Galáxia não muito distante da Via Láctea. As naves de pequeno porte, escassas naquele período da madrugada, desviavam dos prédios pontiagudos como facas apontando para o céu sem muitas estrelas. Dentro daqueles prédios, muitas outras pessoas solitárias se conectam naquele site, ouvindo as palavras que queriam ouvir ditas por vozes afáveis.

Mas nada dito pelo site era real. Tudo era comandado, raso, e eles se encantavam pela utopia que é acreditar na profundidade de tudo aquilo.

Sem encontrar o amor uns nos outros, vazios e ansiando serem preenchidos por terem gasto a matéria prima de sua existência, bebendo a água diferente de um Planeta que não é sua casa, eles conectam naquele site procurando o afago das máquinas.

Entretanto, é muito óbvio - máquinas não sabem amar.

James Ravencliffe
Enviado por James Ravencliffe em 25/08/2019
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