Comitê de recepção

Como seria de prever, quando o alarme do piloto automático soou, não havia ninguém de plantão na cabine de comando do "Lur Berria". O imediato, Iuliu Nistor, foi o primeiro a chegar, assumindo o posto do navegador. A comandante Uxue Yharrassary veio em seguida, usando o mesmo macacão de serviço com o qual fora deitar-se.

- Situação? - Questionou ela, ao entrar no recinto atravancado de painéis e mostradores.

- O piloto automático nos colocou em curso para a UC-4 - foi a resposta. - Vai assumir o controle manual agora, ou quer dar mais um tempo para ver se respondem?

- Vou dar um tempo - replicou Uxue, instalando-se no assento do piloto.

Um rebocador sem carga era um veículo muito mais fácil de manobrar do que após recolher os tanques criogênicos da usina de captação, e pelo menos ao longo dos primeiros 30 km da descida, Uxue podia se dar ao luxo de apenas seguir a rota programada; só iria intervir caso surgisse algum imprevisto.

- E a tempestade, como está? - Indagou, enquanto nuvens amarronzadas deslizavam pelas janelas de observação.

- Intensidade diminuindo, mas ainda temos ventos de 80 km no entorno da UC-4.

- Está no limite, mas se não houver rajadas, não devemos ter problemas para atracar - avaliou ela.

Finalmente, assumiu o controle do rebocador e foi cuidadosamente baixando entre as nuvens de hidrossulfeto de amônio rumo ao topo da camada superior de nuvens de água, sobre a qual equilibrava-se a UC-4 como uma imensa boia laranja flutuando num tanque.

- Escolheram um bom lugar para se esconder - comentou Uxue, enquanto fazia as correções finais de rota. E para o imediato:

- Avise que estamos batendo na porta.

Iuliu Nistor ajustou o microfone do headset e transmitiu uma mensagem de saudação.

- UC-4, fala o rebocador "Lur Berria"; pedimos que informem o vetor de atracação.

Um alto-falante na cabine crepitou com estática.

- "Lur Berria"? Nós não os esperávamos nessa rotação.

- Verificamos que a tempestade está se afastando. Por favor, transmitam o vetor de atracação - insistiu o imediato.

- O carregamento ainda não foi finalizado, justamente por conta da tempestade - respondeu o operador da usina. - Imaginamos que iriam compreender e aguardar.

Uxue e Iuliu entreolharam-se. Em seguida, Uxue posicionou o microfone do headset e entrou na conversa.

- UC-4, fala a comandante Uxue Yharrassary. Se Euterpe Marquelain estiver ouvindo, estamos aqui apenas para cumprir o nosso contrato com Mustaba bin Kamis; não viemos nos meter em nenhuma confusão que envolva a Marquelain Meatzaritza e ele.

Houve um curto silêncio no transmissor; por fim, a voz do operador fez-se ouvir novamente:

- "Lur Berria", a postos para o vetor de atracação, setor A2.

Um espaço sinalizado com luzes verdes piscantes acendeu-se no topo da usina de captação, uma estrutura cilíndrica com mais de 60 metros de comprimento, suspensa do grande aeróstato laranja por uma rede de cabos trançados de nanotubos de carbono. Novamente sob controle automático, o rebocador aproximou-se vagarosamente, disparando seus retrofoguetes até que o engate do tubo de passagem acoplou-se à escotilha da usina. Finalmente, um sinal luminoso surgiu no console diante de Uxue: uma conexão pressurizada fora estabelecida e podiam entrar na usina.

- Vamos ver o que está acontecendo - convocou Uxue, erguendo-se do seu assento.

A dupla desceu para o convés inferior e dali para a escotilha que dava acesso ao tubo de passagem. Em poucos minutos, entraram na câmara de descompressão do setor A2 da usina. Dois seguranças armados da Marquelain Meatzaritza estavam à espera deles, e entre eles, Parmenion Lasterra, o chefe de operações da UC-4.

- Algum problema? - Indagou Uxue.

- É o que vamos descobrir - retrucou Parmenion, braços cruzados.

- [Continua]

- [26-01-2022]