O Motivo

George Luiz - O motivo

Ivone acionou o controle remoto que fazia o portão abrir-se. Os dois painéis de aço deslisaram silenciosamente e ela entrou com seu carro. Na sala de estar,seu pai lia um romance.

- Íris Murdoch, papai ?

- Sim, querida. Uma grande escritora que você ainda não leu, não sei por que.

- Mas vou ler, papai. Quero saber a razão de seu entusiasmo.

- Meu, de sua mãe e de vários amigos nossos.

- Tudo bem. Não faça eu me sentir culpada. Você sabe o quanto eu tenho trabalhado essas últimas semanas.

- Isso mesmo, Ivone ! Não deixe seu pai pressionar você.

- Oi, mamãe. Você entrou tão silenciosa. Nem percebi.

- Sua mãe anda relendo Agatha Christie, filhinha. Quando isso acontece, ela passa a se esgueirar entre as sombras. Não anda, desliza pela casa.

- Tolice ! Apenas não arrasto os pés com displicência como você. Bem, a Gladys já me avisou que o jantar está pronto. Vamos ?

- Essa nossa cozinheira, querida, tem um nome meio inapropriado para o exercicio de suas importantes funções. Gladys! Realmente ! Por que não Maria ou Ja-cinta ?

- Ora, sempre achei Cândido um nome totalmente em desacordo com a profissão de advogado. E, no entanto, você sempre teve muito sucesso em sua carreira.

- E de candido, ingênuo, esse urso sonso não tem nada, não é, mamãe ?

- Nada mesmo, querida !

- Ah, vocês duas ! Por que eu não tenho um filho homem ?

- Chega de conversa doutor ! O jantar acaba esfriando. Vamos logo.

Alguns dias depois, Marcos Vergueiro consultava, preocupado, seu saldo bancário numa caixa automática. Decididamente andava gastando mais do que deveria. Com os juros extorsivos dos cheques especiais, era preciso se controlar mais um pouco.

Ao sair da agencia, esbarrou de leve numa moça fazendo com que ela deixasse cair um ou dois livros. Precipitou-se para pega-los.

- Me desculpe, por favor, sou um desastrado !

- Calma ! Não se culpe assim. Eu também estava distraída. E aposto que você está preocupado com os juros do seu cheque especial...

- De fato, mas quem não fica assim ? Esses juros são imorais.

- É o que meu pai sempre diz e ele é advogado.

- Deve ser um advogado de alto nível para ter uma filha tão elegante como você.

- Ora, obrigada. É bom ouvir um elogio assim no inicio de um dia de trabalho.

- Não vai me dizer que trabalha no banco ?

- Eu ? Quem me dera. Sou uma esforçada química industrial.

- Uma química ? Fantástico ! E se eu lhe convidar para beber um suco ? Promete não colocar sem que eu perceba, algum veneno letal em meu copo ?

- Se você esperar enquanto tiro um extrato no caixa automático...dependendo do meu saldo, posso tentar me vingar em você ou não...

- Fechado ! Tire seu extrato. Eu espero aqui fora.

Ela é linda ! Que encanto de garota ! Eu esperaria aqui na calçada uma semana, que semana! Um mês aqui por ela !

Ivone retornou com uma expressão tranqüila no rosto bonito.

- Pronto ! Você não corre o risco de beber um suco enve-nenado.

- Que alivio ! Que tal o barzinho ali da esquina ?

- Vamos lá.

A partir daí, eles começaram a se falar quase diariamente ao telefone. Acabaram marcando um cineminha e dali para o na – moro foi um pulo.

- Bendito cheque especial ! Se não fosse por ele eu não teria conhecido você.

- Não se esqueça de acrescentar os juros, Marcos. E as taxas bancárias...

-

No estacionamento das Industrias Reunidas Quimix , Ivone entrou em seu carro. Tinha se demorado um pouco mais, as voltas com uma fórmula de beneficiamento de um produto. Colocou a chave na ignição e deu a partida. Tinha saído do estacionamento quando sentiu a pressão de uma lâmina em seu pescoço delicado.

- Não se vire nem grite ! Dirija normalmente ou morre !

- Eu...

- Cale a boca ! Não fale !

Pelo espelho retrovisor, Ivone viu o rosto de um homem cober-to por uma espécie de máscara escura com duas aberturas para os olhos.

- Isso, piranha ! Pegue aquela rua ali, a direita. Não tente fazer qualquer bobagem ou corto seu pescoço. Ali, está vendo aquele cara parado junto do poste ? É meu parceiro. Vamos pega-lo.

Ivone estava agora amarrada e amordaçada, presa na mala de seu carro. Os dois criminosos estavam nos bancos da frente. Um deles conduzia o veículo em direção ao Recreio dos Ban-deirantes. Tomou uma rua escura e muito pouco movimentada e parou o carro. A mala foi aberta e Ivone retirada com brutali-dade.

- Vamos ver sua carteira. Humm, sessenta e poucos reais, uma micharia... E seus cartões de banco ? Dois, não é ? Vou tirar o esparadrapo de sua boca para você me dizer as senhas. Já sabe ,se gritar , morre. Se me der senhas erradas também. Fala logo !

Já de posse das senhas, o bandido preparou-se para por Ivone outra vez na mala. Foi interrompido pela aproximação de uma patrulhinha da PM.

- Cara! Pintou sujeira !

- Vamos nessa, rapaz !

- E a mina ?

- Vamos deixar de presente pra eles, mas antes...

Os dois policiais militares, viram, a uns vinte metros de distân-cia, um dos criminosos cortar a garganta da moça antes de partirem ,os dois em velocidade. Pararam a patrulhinha para a socorrerem. Foi inútil. Em menos de cinco minutos, Ivone es-tava morta.

A sala do doutor Afrânio Moreira, na delegacia de homicídios estava calma aquela hora da noite.

- Parece que nossos fregueses estão de folga hoje, Gon-çalves...

- Deixa quieto, chefe. De repente eles acordam.

- Bom, eu vou para casa. Teresa anda reclamando dos meus horários.

- Dona Teresa é uma santa, chefe. Ter o senhor como ma-rido...

- Que diabo você está insinuando, Gonçalves ? Ela é uma mulher muito feliz.

- Mulher de tira nunca é muito feliz, doutor Afranio... É que

nem mulher de obstetra... crimes e bebês não têm hora certa para acontecer.

- Vejam só que filósofo você está ficando. Já pensou em escrever um ensaio sobre o assunto ?

- Eu não, chefe. O senhor é o intelectual aqui.

- Está certo, mas agora, tchau para você.

Teresa gostava de proteger as horas de repouso do marido. Mas,aquela manhã, ao ler as manchetes sobre o horrível crime de morte ocorrido na madrugada, resolveu chama-lo as sete e meia.

- Veja aqui, Afrânio. Um homicídio muito feio. Mataram uma jovem química industrial, Ivone Medeiros.

- Deixe eu ler.

- Essa onda de crimes no Rio parece que está piorando.

- Ë verdade, querida. Acho que vou tomar um chuveiro e partir para a delegacia.

- Ah, não vai não. Primeiro vai beber seu suco e comer duas torradas com manteiga. Que diferença isso fará pa-ra essa pobre moça que morreu desse jeito trágico ?

Assim, passavam das oito e meia quando Afrânio chegou à delegacia, onde Gonçalves já o esperava.

- E aí, Gonçalves ? Quero todos os dados sobre a morte dessa pobre moça. O que diz a perícia ?

- Morta por um instrumento cortante,chefe, provavelmente uma faca pequena ou um canivete. Perdeu muito sangue pela jugular. Morreu, segundo os dois PMs, em menos de cinco minutos.

- Impressões digitais ?

- Muito ruins, parece.

- Documentos dela ? Dinheiro, objetos pessoais ?

- Segundo os pais dela, a moça nunca levava dinheiro grã-údo na carteira, chefe. Levaram cartões e talões de che-

que.

- Uma química, não é ?

- Isso mesmo, doutor. Os pais e o namorado estão em estado de choque.

- Bem, vamos nos organizar e investigar tudo com o maior empenho, não há nada mais que possamos fazer.

Na sede da Quimix, o clima era de consternação. Afrânio e seu assistente foram introduzidos à sala do doutor Tiburcio o diretor executivo.

- Bom dia senhores, sentem-se por favor. Doutor Afrânio, não é ?

- Eu mesmo, e este é o inspetor Gonçalves. Então, doutor o que pode me dizer que auxilie a nossa investigação ?

- Francamente, estamos tão chocados aqui. Ivone era uma excelente, uma brilhante química industrial e uma figura humana inesquecível. Só tinha amigos na empresa.

- Bem, precisamos conversar com os colegas mais ligados a ela em termos de trabalho e também com o responsável pelo estacionamento.

- Perfeito. Vou chamar os dois outros químicos que traba- lham no mesmo projeto que ela.

- Chame-os separadamente, por gentileza.

- Muito bem. Chamarei primeiro Jonas Cardoso. Se quiser pode usar a sala de reuniões. Acho que é a mais adequa-da.

- Obrigado, doutor Tiburcio.

Jonas Cardoso era um homem de meia idade, de tempera-mento aparentemente tranqüilo. Cumprimentou Afrânio e Gonçalves e sentou-se numa das poltronas em volta da me-

sa pesada e retangular.

- Que coisa terrível, senhores ! uma colega maravilhosa. Jovem, extremamente capaz e dedicada ao seu trabalho. Uma perda muito séria para a Quimix e muito dolorosa para nós que éramos seus amigos.

- Sabe se ela costumava voltar para casa sempre sozinha?

Nunca dava carona para algum colega ?

- Honestamente não saberia dizer. Mas claro que é bem possível. Ivone era uma pessoa gentil e prestativa.

- Mas o senhor, nunca a viu fazer isso ?

- Nunca.

- Obrigado, doutor Jonas.

Gilberto Ramos era o outro químico que trabalhava com a vítima. Era um homem de seus trinta e poucos anos, magro, inquieto, tinha um tique nervoso, apertava o lóbulo da orelha direita com seu polegar e indicador freqüentemente. Não parecia muito a vontade sentado junto aos dois policiais.

Contudo, suas respostas às mesmas perguntas, só fizeram confirmar o que já tinha dito seu colega mais velho.

- E aí, chefe ? Esse cara parece esconder alguma coisa. E como é nervoso...

- É um pesquisador, Gonçalves Esse pessoal as vezes tem esse jeito um pouco esquisito.Bom, vamos descer ao es-tacionamento.

O encarregado do estacionamento era também um homem de trinta e poucos anos.Chamava-se Otaviano de Souza e estava há dez anos na empresa. Estivera de folga na noite da véspera. Não, não tinha um substituto.Havia dois manobreiros e o mais antigo respondia por ele nesses casos. Conhecia a vítima de vista. Só trocara com ela bons dias e boas noites. Chamou os dois manobreiros por solicitação de Afrânio. Ambos disseram que a vítima era uma moça muito educada.Tinham visto Ivone sair do estacionamento. Sim, ela estava sozinha. E foi só.

De volta à delegacia, Afrânio e Gonçalves confabularam.

- E aí, chefe ? Temos que encontrar alguma pista.

- Em primeiro lugar eu gostaria de saber como,onde, quan-do os assassinos a abordaram. Não podem ter sido caro-nas porque ela foi vista saindo sozinha do estacionamen-to.Teria sido num sinal de transito? Ela não teria tentado fugir? A não ser que...

- O laudo da perícia sobre o carro acabou de chegar,chefe.

- Ah, ótimo, traga-o aqui, Gonçalves.

O laudo era mais ou menos o esperado. Não houvera luta no

Interior do veículo. Fios de cabelo da vítima mostravam que ela tinha estado presa na mala do carro. Tinha sido tirada dali com violência, um pequeno fragmento de tecido tinha se rasgado, de sua manga, a vítima estava usando uma blu-sa de mangas compridas.Havia muito poucas impressões digitais. Algumas da vítima e duas de um homem.

-Ah ! Essas impressões digitais de homem, Gonçalves. Te-mos que investiga-las a fundo. Quem sabe com um pouco de sorte...

Dizem que os grandes goleiros de futebol sempre têm sorte. Os grandes investigadores criminais também. As digitais fo-ram identificadas. Pertenciam a um conhecido assaltante. Só que não era um assassino Sua ficha criminal não tinha a-cusaçòes de homicídio, nem mesmo de tentativas.

- Deve ser o outro, Gonçalves. Esse aí, provavelmente foi um cúmplice.

- E agora, doutor ?

- Vamos tratar de prende-lo e acusa-lo da morte da moça.

Quando for apertado ele vai dar o serviço todo. Não vai querer ser condenado por homicídio doloso. Vamos espa-lhar as fotos dele por todos os órgãos e canais possíveis.

- O namorado da moça está aí esperando para falar com o senhor.

_ Está bem. Faça-o entrar.

- - Obrigado por me receber, doutor Afrânio. Sou Marcos, o namorado de Ivone.

- Sente-se, Marcos. Acho que é inútil dizer o quanto eu sin-to pela morte de sua namorada. A maioria das pessoas a-cha que somos profissionais empedernidos, despidos de bons sentimentos...

- Não, doutor ! Sei que o senhor é um homem bom.

- Obrigado, acho que sou mesmo.

- Vim aqui para lhe perguntar se o senhor já tem algum indicio, alguma pista.

- Até dez minutos atrás não tinha. Agora, posso lhe dizer que já sei quem é um dos criminosos.

- O assassino ? O miserável ?

- Penso que seja o cúmplice, no caso. Mas, através dele chegaremos ao autor do homicídio.

- Então este cúmplice já está preso ?

- Ainda não. Mas já expedimos uma ordem de captura. É uma questão de tempo.

- Sei que não posso ter Ivone de volta, viva, mas gosta – ria demais que o seu carrasco pagasse por sua cruelda-de !

- Me diga uma coisa, Marcos. Sabe ? Eu tenho uma teoria, chame-a de intuição, se quiser, que o roubo não foi o real motivo desse crime bárbaro. Acho que o assassino não é um criminoso profissional.

- Mas, então, doutor Afrânio, qual foi o verdadeiro motivo ? Só roubá-la ?

- Talvez você pudesse me dar uma idéia.

- Eu ? Mas conheci Ivone há apenas dois meses. Ela nun-ca mencionou qualquer pessoa que lhe quisesse mal. Acho mesmo que nem tinha.

- Bem, não se preocupe com isso. Vamos agarrar esse ca-ra e dar-lhe um tratamento especial. Ele vai cuspir tudo.

- Vai mandar baterem no homem, doutor ?

- Não. Meus métodos são mais sutis. Vou apavora-lo emo-cionalmente.Você não faz idéia de como esses bandidos, por mais durões que possam parecer, são covardes.

Quatro dias se passaram. Na manhã do quinto dia, o inspe-tor Gonçalves entrou com uma expressão de triunfo na sala de seu chefe.

- Pegaram o homem, doutor Afrânio !

- Pegaram ? E onde está ele ?

- Está vindo para cá num camburão, doutor !

- Muito bem ,vamos montar nossa cena de teatro para ele. Você começa a interroga-lo. Eu só entro no segundo ato.

- Deixe comigo, chefe !

João Teixeira, vulgo “ Alicate “ era um bandido perigoso. Agora, sentado numa cadeira sem conforto, as mãos alge-madas atrás de suas costas, olhava com aparente desafio para o inspetor Gonçalves.

- É isso aí, Alicate. Esta vez você está muito mal mesmo. Não vai ter advogado que tire você dessa. Suas digitais na mala do carro da vítima, só faltam alguns detalhes para você ser indiciado e julgado por homicídio doloso, duplamente qualificado.

- Eu não matei ninguém, chefia. Foi o outro cara.

- Que cara ? Os homens da patrulhinha disseram que você estava sozinho com a vítima.

- Mentira ! E a arma do crime ? Evaporou ?

- Vamos ver isso depois. Agora o delegado vai falar com você.

- Quanta honra, chefia...

O delegado Afrânio entrou na sala.Olhou para o criminoso com uma expressão quase de indiferença. Caminhou até a frente dele e olhou para um papel impresso que tinha em uma das mãos. Falou com voz incolor:

- Pensei que você fosse mais inteligente, rapaz. Olhe isso aqui, Gonçalves.

Gonçalves fingiu ler o que estava escrito no papel.

- Poxa, doutor, nosso amigo aqui está ferrado mesmo.

- O que é isso ? Estão querendo me baratinar ?

- Não é preciso, amigo. O homem que contratou você para esse servicinho porco, está livrando a própria cara e lhe entregando. Os homens da patrulhinha pensaram inicialmente, que você tinha agido sozinho, mas seu companheiro mordeu a nossa isca. Já confessou tudo. Foi fácil, porque ele não é um criminoso profissional como você.

- Isso é grupo, chefia. O senhor está inventando essa his-toria.

- Acha mesmo ? Vou ser franco com você. Eu já desconfia-va que fosse um funcionário da empresa e agora está tu-do confirmado. A diferença é que ele vai pegar uns dez a

doze anos por assalto e você uns trinta por homicídio. U-ma injustiça , não acha ?

- Não acredito nisso, chefia, o senhor está blefando.

- Ouça, Alicate, o doutor aqui só fala quando tem certeza. Esse papel na mão dele é a confissão do outro cara. Uma cópia, mas o original já está no cartório da delegacia.

- Bom, Alicate, pensei mesmo que você fosse mais es-perto. Pode engaiolar nosso pássaro, Gonçalves. Ele não quer cantar. Vai ter que pagar pelo que diz que não fez. Eu vou para minha casa almoçar.

- Bom almoço, doutor Afrânio !

- Espere, doutor !

- Esperar ? Vai nos contar alguma coisa ?

- Esse homem de quem o senhor está falando, quem é ele?

- Tem um sobrenome comum, Souza...Isso lhe diz alguma coisa ?

O rosto de Alicate contorceu-se de raiva. Ele disse, quase gri – tando :

- O desgraçado ! Então ele quer que eu pague pelo crime

que ele cometeu ! Não ! Isso não vai ficar assim !

- Que tal nos contar tudo direitinho ? É o seu destino que está na balança da justiça, rapaz.

- Está bom. Eu vou contar tudo.

- Espere ! Vamos tomar seu depoimento na forma da lei. Chame o escrivão , Gonçalves.

A delegacia de homicídios iniciava uma nova manhã de traba-lho. Agora havia dois homens, os dois responsáveis pela mor- te de Ivone Medeiros, detidos, em duas celas distintas. Na sa- la do doutor Afrânio, ele e o inspetor Gonçalves conversavam.

- Chefe, as vezes o senhor chega a me dar medo.

- Que bobagem é essa, Gonçalves ?

- Mas, chefe, como o senhor deduziu que o assassino era esse Otaviano de Souza. Isso é coisa de feiticeiro !

- Mais respeito, Gonçalves. Só usei, como sempre, minha experiência e meu razoável cérebro.

- Mas atirar assim no escuro.O Alicate tinha que confessar depois daquilo. E o motivo do crime ?Como o senhor de-duziu ?

- Imagine-se no lugar do assassino,Gonçalves. Uma garota

muito bonita, bem educada...você a vê diariamente. Ela lhe trata com cortesia, mas não lhe dá a mínima bola. Um dia você decide que vai possui-la de qualquer jeito, a força se for preciso. Aí traça um plano. Combina com um criminoso conhecido, um assaltante, seqüestrar e roubar a moça. Entra casualmente na empresa em seu dia de folga, desce cautelosamente até o estacionamento numa hora de bastante movimento, na saída dos funcionários e com uma chave falsa entra no carro dela.Espera no escu-ro, agachado atrás do banco do carona, usando uma más

cara negra com dois furos para os olhos. A moça, cansa-da pelo dia de trabalho árduo,sai do estacionamento e toma o caminho de casa. O resto nós sabemos como foi.

- Tudo bem, chefe, ma como o senhor determinou que o motivo do assassino não era roubar a vítima ?

- Esse Otaviano tinha mais de dez anos de empresa, Gon-çalves. Era um homem de confiança. Muito bem remune-rado. Pedi para ver a ficha dele depois que estivemos lá a primeira vez. A direção da empresa tinha total confian-ça nele.Conclui que o homem não era um ladrão. Ele certamente iria violentar sua vítima enquanto o cúmplice sacava o dinheiro nos dois bancos. Mas a patrulhinha apareceu...

- Bem, chefe, o senhor solucionou com muito mérito mais um caso difícil.

- Menos, Gonçalves, menos...

Na casa de Ivone Medeiros aquela noite, seu pai apanhou um livro de Íris Murdoch na estante. Sentou-se junto a seu abajur favorito para começar a ler. Não foi muito longe, Na quinta li-nha as lágrimas, em profusão, detiveram sua leitura.

George Luiz
Enviado por George Luiz em 05/12/2008
Código do texto: T1320538
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