A ÚLTIMA BATALHA...

A canção das espadas acontecia quando aço, chocava-se com aço...

Imann pensou estar prestes á perecer...

Mas seu orgulho não aceitaria isso jamais...

Gália, ano sexto.

Um homem abriu os olhos no inferno. Finalmente um sinal de vida, no lugar que agora mais se parecia com uma necrópole á céu aberto.

Imann estava tonto deitado no chão de terra, olhando para os corvos, voando em círculos no firmamento. Pensou nas possibilidades atuais de sua situação, talvez numa forma de continuar mantendo imóvel seu corpo cansado. Ele ainda sentia dor, mas a raiva, que sempre fora seu combustível durante várias batalhas ao longo de sua vida, havia desaparecido. Ele percebera sua mente infestada de memórias, inundada de lembranças...mas nada de raiva.

As lembranças eram como intrusos em sua mente, e o conduziram á força até certos detalhes que, passavam despercebidos por Imann, como se estivessem soterrados por uma massa de concreto.

Ele viu sua infancia de novo...

Viu o quintal onde brincava com o cavalo de seu avô...

Contemplou o inicio de sua fase adulta, quando havia feito um juramento junto aos templários...

Imann pôde novamente apreciar o saboroso gosto de sua primeira vitória no campo de batalha...

Em seguida, sua viagem nostalgica levou-o de encontro ao amargo gosto da traição, quando os líderes religiosos nos quais ele havia jurado proteger com sua espada, com a vida se assim fosse, voltando-se contra Imann e seus fiéis cavaleiros...

Memórias...memórias...

O bravo guerreiro, cansado de todas elas se sentou. Estar deitado ao solo não conbinava com sua tragetória gloriosa. Nesse momento, ele contemplou o inferno pela primeira vez. Havia uma infinita extensão de morte por todos os lados...até onde sua visão alcançava. Eram corpos de homens mutilados por instrumentos cortantes, corpos queimados no calor da batalha, corpos atravessados por flechas que haviam escurecido o cèu. A bandeira de sua pátria estava atirada na lama, manchada com o sangue daqueles que ousaram protegê-la.

Imann viu seus inimigos deitados...mas ele não poderia sorrir, pois seus cavaleiros estavam á fazer-lhes companhia. Ele reconheu cada rosto sem vida de seus homens, voltados para a dor da derrota, da vergonha, todos mergulhados num sono de morte, dormindo eternamente.

Talvez Imann teria dado á ordem para que eles se levantassem, certo de que todos os bravos cavaleiros o obedeceriam como sempre fizeram. Contudo, a visão da morte daqueles que ele próprio admirou em silêncio por toda a vida, fora demais para sua alma.

O guerreiro não conseguia gritar. Não insistiu, porque a raiva que sempre o impulsionava, havia o deixado...assim como seus companheiros.

O esforço fora imenso, para que Imann ficasse de pé...

Um rio de corpos pairava lento em sua frente...

Os corvos e chacais aproveitavam o enorme banquete...

Pessoas procuravam seus familiares...

Gatunos roubavam o que encontravam de valor entre os mortos...

Há alguns metros de onde Imann estava, ele avistou sua espada. Sua mais fiel companheira. Estava agora abandonada, sozinha, longe dos punhos fortes de seu mestre, que quando juntos, formavam uma unidade perfeita para matar.

Ele partira cambalente com o propósito de socorrer sua arma, porém fora interrompido por uma situação ainda mais urgente, na qual Imann não poderia deixar de lado: Ele reconheceu o corpo de Drax, seu melhor amigo. Estava deitado sobre outro corpo, e uma enorme lança atravessava ambos os homens. Atirado sobre ele havia um dos ladrões que tentava retirar um amuleto do pescoço de Drax. O amuleto que fora um presente de Imann para o amigo.

Finalmente houve uma familiar pontada de fúria, enrijecendo os músculos do guerreiro. Ele partiu apressado na direção do corpo do amigo, intencionado á esgoelar o vagabundo larápio.

O guerreiro saltou na direção do homem. Pensando estar prestes á praticar o elemento surpresa, uma vez que o ladrão não havia percebido sua aproximação. Suas duas mãos esticadas como garras de um falcão, atravessaram o pescoço do ladrão, como se ele não existisse. Imann espatifou-se no chão do outro lado. O vagabundo terminou de retirar o amuleto, e saiu andando tranquilamente em busca de outros objetos de valor, sem sequer notar a presença furiosa de Imann.

- Devolva o cordão dele, desgraçado!!!!! - gritou o guerreiro derrotado ao solo. O homem ignorou novamente, como se não ouvisse.

Aturdido, Imann não compreendera o que havia se passado. Ele simplesmente atravessara o corpo do homem, como se ele fosse transparente.

Novamente de pé, ele olhou para trás, para o percurso que havia feito. Então, um arrepio terrível lhe envolveu os poros de sua pele. Imann estremeceu. Estava olhando agora, para o local onde esteve deitado, comtemplando incrédulo seu próprio corpo, deitado no mesmo lugar, imóvel, e sem vida...

"O que está acontecendo comigo?"

Nesse momento, um homem surgiu ereto entre os mortos. Caminhava na direção do guerreiro de forma tranquila, como se estivesse andando em um jardim de flores. Era um homem alto, de pele clara como a neve, tinha os cabelos longos e encaracolados. Ele usava um manto branco que ofuscava os olhos que quem se atrevesse á olhar.

- Saudações, bravo Imann. - disse o homem ao se aproximar dele - finalmente é chegada a tua hora...

- Quem é você? - perguntou o guerreiro ainda assustado com sua atual situação.

- Sei que deves estar com a mente perturbada, uma vez que tu sempre foras um homem sem fé.

Imann não dissera nada em resposta. Sua consciência parecia aifrmar-lhe exatamente o que os olhos testemunhavam. E como tudo em sua vida só lhe era entregue mediante a luta, ele travou uma batalha árdua contra a própria realidade:

- Vá embora daqui! Desapareça!

- Não tenha medo de mim, bravo Imann.

- Saia daqui!!!

- Eu quero livrá-lo das chamas do inferno. Por favor, permita que eu o salve. Eu ja vi o inferno uma vez, Imann. E não desejo que homem algum também o veja...

- Quem é você?

- Eu me chamo Ariel. Sou o arcanjo dos mortos, o coletor de almas perdidas. Tua alma se perdeu após a sangrenta batalha. - o anjo fez uma pausa. Ele observou uma repentina mudança que fez com que os céus começassem á escurecer. Então dezenas de vultos negros alados intrometeram-se ao redor deles.

- Não temos muito tempo, Imann. Eles estão vindo buscá-lo.

Novamente o guerreiro nada disse mergulhado em seu orgulho. Ele levou as mãos á cabeça. As palavras do anjo faziam com que as neblinas que escureciam sua mente, dissipassem como numa ventania feroz. Ele conseguiu trazer as lembranças de seus últimos instantes de vida. O exato momento em que o inimigo triunfara sobre ele.

Eram incessantes trocas de golpes...

Quase todos defendidos por duas espadas...

O choque do aço lançava faíscas sobre os bárbaros...

Imann, versus um poderoso adversário...

Em volta deles, a batalha estava no seu auge...

Os guerreiros lutando sob a chuva forte que os cegavam...

Previsões de uma luta interminável...

Então o adversário de Imann esquivou-se de seu golpe mortal...

A espada do guerreiro, que jamais havia falhado...

Passou por cima do corpo do inimigo abaixado...

Ele contratacou com determinação e firmeza...

E a espada adversária, atravessou o peito de Imann...

depois disso...só houve escuridão nos olhos do guerreiro.

- Imann!! Imann!!

O guerreiro abriu os olhos. O anjo estava parado em sua frente, lhe sacudindo os ombros numa insistente busca em ser ouvido:

- Rápido, Imann!!! Os demonios vieram buscá-lo!!

- Demonios? - perguntou Imann, de volta á consciência.

- Sim, Imann. E se você não vier comigo, terá que ir com eles.

- Onde estão todos??

- Não importa agora, Imann. Vamos sair daqui!!!!

O firmamento estava tomado por uma tonalidade lúgubre. Os vultos estavam muito perto de Imann. Um deles saiu das sombras, e se aproximou de Ariel:

- Deixe-o, Ariel. Você não pode interferir no livre arbítrio.

- Afaste-se, imundo!! Essa alma não lhe pertence.

- Ele se decidiu, Ariel. Não quer ir com você...

O guerreiro estava cabisbaixo, como se pouco importasse aquela disputa por sua alma. Seu olhar apontado na direção do vazio. Estava diante de sua segunda derrota: a luta para não aceitar a realidade. Percebeu que era inevitável. E mesmo agora, depois de tudo acabado, a vergonha pela queda lhe trouxera mágoa, tristeza, e um desejo enorme de auto-destruição.

- Por favor, não se entregue, Imann. - implorou o anjo.

O guerreiro caiu de joelhos...

As trevas envolveram sua alma...

Ariel nada podia fazer...

Os demonios lhe abraçaram...

O guerreiro não lutou, não fez resistência ao abraço...

Ariel retornaria sem a alma do Guerreiro. O azul do céu voltou a normalidade, as nuvens brancas reapareceram. O anjo ficou atonito, sem saber qual seria a verdadeira razão, que levou á uma alma, por mais perturbada que fosse, a negligenciar sua súplica.

Jamais alguém havia sido louco o suficiente, para recusar tal oferta de salvação.

A verdade, era que anjos não conheciam o orgulho humano.

E o bravo Imann jamais havia conhecido a derrota.

(Michel, Metallica)

Metallica
Enviado por Metallica em 15/05/2009
Reeditado em 18/05/2009
Código do texto: T1596118
Copyright © 2009. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.