Venezianas Verdes, Cap. 20

A casa estava como fora deixada no final da tarde do dia anterior. Menos de 24 horas até agora. E, no entanto, os acontecimentos, tão intensos quanto diferentes, davam a idéia de que tinham passado semanas. Segunda-feira a chegada de Juliano em casa de madrugada, isto é, no início da terça-feira. Na terça de manhã o choque de saber que fora traída por Juliano (seria a primeira vez?), junto com o falecimento da amante no quarto do motel em que estavam. No início da noite da mesma terça-feira a inesperada situação amorosa com a mulher que fazia os seus vestidos. O que Bernadete só podia creditar ao estado de fragilidade emocional decorrente do que ficou sabendo pela manhã.

E agora, quarta-feira, iria tomar um banho, comer alguma coisa e se aprontar para a entrevista, à uma da tarde, que teria com o dono da clínica onde trabalharia como fisioterapeuta. Mais do que nunca agora o início de suas atividades teria que acontecer a partir da próxima segunda-feira. Para que com o tempo a poeira começasse a baixar...

De qualquer modo, não convinha desistir do emprego depois de tudo o que fora feito para a sua conquista. E também não havia muito o que temer, pois tratavam-se de hábitos novos em sua vida (ir e voltar ao trabalho de segunda a sexta) de que ninguém, a princípio, teria conhecimento. Nem mesmo Eulália ficara sabendo. Não tivera tempo de lhe contar.

A lembrança do nome da costureira fazia-a ruborizar-se. Como pude acordar de manhã nos braços de uma mulher? Meu nariz encostado num de seus seios. Retendo ainda a fragrância do perfume dela. Ou a obscenidade do seu cheiro. Sentiria medo, ao se despir para o banho daqui a pouco, de ser levada a pensar na boca de Eulália beijando-lhe a testa do joelho, mordendo-lhe a batata da perna e depois embrenhando-se em seus pelos encaracolados à procura dos lábios que eles mantinham escondidos. Como fora possível tudo isso? Não se lembrava de ter havido experiência semelhante. Não se lembrava de qualquer atração parecida ao longo de sua vida. Seria uma forma subliminar de se vingar de Juliano? Mesmo sabendo que ele podia estar correndo risco de vida?

Agora pensava em acabar com isso. Foi apenas uma experiência. Fruto da circunstância criada pela tibiez emocional. Mas como? Não posso ficar aqui sozinha. Não tenho a quem procurar, a não ser ela. Não fica bem ir pra casa da mãe do Juliano depois de ter dito que queria ficar sozinha. Na verdade ela mostrou-se amiga. Na verdade Bernadete sentia que Eulália tinha sido também um pouco mãe, com aquela determinação e comando de quem sabe o que está fazendo. Não apenas por ter liderado, na maior parte do tempo, a iniciativa entre as duas. Mas pela sua postura no direcionamento das ações. De dizer o que tem de ser feito. Na verdade Bernadete, embora lutando para não admitir, desejava ir à entrevista com o dono da clínica e depois voltar rapidinho para a casa da costureira.

Aluizio Rezende
Enviado por Aluizio Rezende em 12/02/2010
Código do texto: T2082718
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