Venezianas Verdes, Cap. 38, Epílogo

Bernadete, pela duração do vôo, sabia que deveria estar em casa por volta de cinco ou seis horas. Poderia comprar o pão quentinho e fazer um lanche sozinha. E ter tempo, até à hora de dormir, pra pensar em tudo o que tinha vivido e acontecido. Praticamente no intervalo de uma semana. A vontade ingênua de beliscar-se para saber se tinha sido verdadeiro. Amanhã faz sete dias que tudo começou.

Pediu que o táxi lhe deixasse na pracinha onde compraria o pão, o presunto e alguns docinhos. Exatamente como no domingo passado. Mas o motivo era também poder passar na calçada e olhar aquelas venezianas verdes. E adivinhar o que elas lhe diziam. Dessa vez lancharia sozinha.

- Duas bisnagas, por favor, meio quilo de presunto e 300g de brigadeiro.

Talvez tenha sido isso o que comprei no domingo. Amanhã chamo o Juliano e lanchamos de novo. Sei que ele vai gostar. E eu também. Afinal foi o que ela recomendou. Não quer dizer que eu não possa mais tê-la. Pelo contrário. Pode ser que seja apenas um necessário pano de fundo.

Admirada com o que poderia ser uma frieza a que não estava acostumada, Bernadete atravessou mais uma vez a rua sem se preocupar com algum carro que pudesse estar passando. Não tem mais Audi A6.

Mas não precisou andar muito na calçada do outro lado para se surpreender com uma viatura policial estacionada em frente ao portão de ferro da casa de Eulália. Sentiu-se violentada. Um policial saia com um laptop e a torre de um outro computador. Mais atrás vinha um homem de terno com uma prancheta fazendo algumas anotações. Instintivamente diminuiu seus passos. Quando passou em frente ao portão de Eulália, evitou olhar o interior da casa ou a sua varanda. Procurava mostrar desinteresse pelo que estava havendo. Fixou-se apenas, ao seguir adiante, nas venezianas verdes. Sentindo que uma lágrima pelo menos escorria por sua face.

Ao chegar à casa percebeu que seu portão não estava trancado. Deve ser o Juliano. Às voltas ainda com as ligações ameaçadoras? Na varanda viu que as janelas estavam fechadas. Teve que acionar a campainha. Sabia que devia haver alguém em casa. A porta foi aberta quase que instantaneamente.

- Oi, Berna! Mas que surpresa!

- Juliano! Tudo bem por aqui?, ela perguntou, colocando sua pequena mala no chão para beijar-lhe uma das faces.

Só então notou a presença de Amaury, que timidamente se levantava do sofá.

- Oi, Amaury. Tem futebol hoje?, brincou Bernadete.

- Nada disso, Hoje, não. É apenas uma visitinha.

Bernadete, embora tivesse tentado, não pôde disfarçar a surpresa de ter encontrado o amigo de seu marido por ali. E também notou a forma meio desajeitada com que foi recebida e cumprimentada por ele. O que lhe pareceu mais compreensível a partir de sua pressa em se retirar.

- Bem, acho que vocês têm muito o que conversar. Sempre se tem muito o que falar num final de tarde num domingo. Volto noutro dia. E aí virei com a Laura.

- Poxa, isso me deixa até meio triste. Eu chego e você sai! Fica mais um pouco, Amaury.

- Só vim pra ajudar o amigo. Ele tem reclamando muito da ausência da esposa, explicou Amaury, sem saber se tinha falado o que não devia.

Bernadete fez questão de conduzi-lo à porta. Depois ficou vendo-o afastar-se. Não soube explicar o pensamento absurdo que tivera de repente. Será que eles tinham estado de mãos dadas? Em seguida olhou na direção contrária. E mais uma vez procurou deter-se nas venezianas verdes. De onde estava não podia vê-las inteiramente. Muita coisa junta. Teve vontade de esboçar um sorriso sem vontade. Desses que a gente acha amarelado.

Voltou pra dentro de casa. Juliano a esperava de braços abertos e com um largo sorriso. Esse, sim, definitivamente não amarelo. Emocionada, jogou-se em seus braços. E se beijaram demoradamente.

F I M

Aluizio Rezende
Enviado por Aluizio Rezende em 04/03/2010
Código do texto: T2119002
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