Redenção, Caminho Para o Paraíso (Prólogo)

Eduardo era um jovem estranho para os padrões éticos e morais da cidade de São João Del Rei. Usava somente preto, ouvia bandas de metal que iam do profano, como Cradle of Filth, ao romântico, como Angra. Geralmente escondia as cabelos, que eram negros e cacheados, com um lenço preto, e estava sempre com semblante sério e triste. Não era para menos, pois estava em uma cidade da qual não era bem-vindo, em uma missão que já não sabia se valia a pena, e nem mesmo seu nome verdadeiro não poderia usar. Seu nome verdadeiro era Erakel, e ele não era humano, como todos pensavam, mas sim um anjo. Bem, fora um anjo, agora era um demônio, um anjo caído, banido do céu por seus pecados. Ironicamente, o maior de seus pecados foi se apaixonar por uma humana, sentimento que, em momento algum, lhe causou arrependimentos, mesmo após a morte de sua amada.

Eduardo estava andando tranquilamente pela Avenida Leite de Castro, seguindo em direção ao centro da cidade, pensando em algo para fazer. Era pouco mais de uma da manhã, de uma fria noite de julho. Já estava cansado de passar os dias pensando em Amanda. Queria poder vê-la novamente, sentir seu perfume, o toque suave de sua pele, o gosto do seu beijo. Dois anos já haviam se passado desde que ela morreu, e nunca ele se atreveu a se envolver com outra mortal, ou qualquer criatura que fosse. Seu coração era de Amanda. Ele desceu dos céus para ficar com ela, e agora ela estava morta. Por que Demiurgo o castigava dessa forma? Ser expulso do céu já era tormento o suficiente, ser chamado de demônio era um martírio insuportável, mas viver sem Amanda, bem, isso era quase impossível.

Mal podia se recordar da última vez em que se importou com sua própria vida em uma batalha, quando se importou em fazer algo que pudesse fazer com que Demiurgo olhasse novamente para ele com olhos de perdão. Podia apenas esperar pela hora de dormir, para ao menos sonhar com sua amada, o único conforto que possuía, mas parece que até mesmo isso estava lhe sendo proibido. Há noites não sonhava com ela. Pensou em subir até a Cidade de Prata, e perguntar por que estava sendo torturado dessa forma, mas sabia que seria inútil. Não adiantava nada procurar respostas em um lugar onde jamais seria aceito novamente. A Terra agora era seu lar, e São João Del Rei a cidade que jurou proteger, tudo apenas por causa de uma promessa...

"Amanda e Erakel estavam sentados em um campo, junto ao leito de um rio de águas minguantes. Era uma tarde de sol maravilhosa, ele arrepiava-se apenas de ver o olhar de felicidade de sua amada. Estar ali, com ela, era mais importante que estar na Cidade de Prata, que enfrentar demônios, que caçar magos demonologistas. Estar com ela era ter os céus nas mãos, era sentir-se o próprio Demiurgo.

Amanda olhou disfarçadamente para Erakel, como se pudesse adivinhar seus pensamentos, e, nesse momento, deixou transparecer um leve tom de infelicidade. Ela sabia em que seu amado estava pensando, e sabia que isso era errado. Mesmo banido dos céus, sendo marcado como demônio, aquele fora o homem que a salvara, que a protegera indefinidas vezes. Ele era e sempre seria o seu anjo, não importando o que acontecesse. Quando os olhos de Erakel encontraram-se com os seus, ela disfarçou um sorriso.

_Querido, me promete uma coisa?

_Claro, tudo o que você quiser, meu amor _ disse o anjo, com uma vez tão serena que acalmava até mesmo o vento que soprava.

_Eu nasci em um lugar chamado São João Del Rei... _ disse com certa tristeza nas palavras _ era uma cidade fantástica, com belas igrejas, gente feliz, festas... mas agora, é uma cidade violenta, com gangues por todos os lados, gente morrendo assassinadas dentro de casa...

_Sinto muito, meu amor... _ Erakel agora deixava as dores aparecerem em suas palavars.

_Me promete que quando você for perdoado, vai pedir a Deus que proteja aquela cidade? Promete pra mim?

_Claro que prometo meu amor, mas por que você mesma não pede a Ele isso, tenho certeza de que Ele vai lhe ouvir e atender.

_Eu sei, mas é por que prefiro que seja assim, pois dessa forma, você vai ter de voltar aos céus para cumprir a minha promessa, e assim você não perderá as suas esperanças."

Essas lembranças marcavam o coração do anjo de uma forma tão dura, que ele quase parou onde estava e se sentou ate começar a melhorar. Doía lembrar de sua amada, e doía mais ainda saber que não estava cumprindo com a sua promessa. Não poderia voltar aos céus, mas podia ao menos proteger a cidade que Amanda tanto amava. Já tinha alguns aliados na cidade, pessoas que até mesmo se aventurava a chamar de amigos, de confidentes. Mas, entre eles, havia um especial, um que gostava acima dos outros, que confiava acima dos outros, alguém que era como ele, um caído por amor, por uma humana. Aquela parecia ser mais uma das longas noites que não paravam de aparecer, e só havia uma maneira de fazer com que o tempo passasse mais rapidamente: cumprindo sua promessa, protegendo a cidade, e era isso que pensava em fazer agora.

Olhou para o relógio, já eram quase duas da manhã, e estava atrasado. Havia combinado com o outro caído de se encontrarem na Praça da Estação, pois ele havia informações de uma pessoa que há tempos ele procurava, e agora finalmente encontrara. Se o caído estivesse correto, encontraria, ainda essa noite, o assassino de Amanda, e ele jurou aos céus que, se um dia encontrasse o desgraçado, o faria implorar ao próprio Lúcifer para levar sua alma antes que pudesse acabar tudo o que havia planejado para sua vingança.

Eduardo Setzer Henrique
Enviado por Eduardo Setzer Henrique em 05/09/2006
Reeditado em 05/09/2006
Código do texto: T233355