MANÉ MEDALHÃO

MANÉ MEDALHÃO

Era sexta feira maior. Fulgêncio já idealizava uma das suas. Sem muito o que fazer, pensou em algum tipo de brincadeira. Talvez um susto em alguém... um trote. Combinou com a esposa Floripa e com o filho o que poderia ser feito. Ambos toparam na hora. A filha ficou encarregada dos afazeres da casa.

Como escultor, o homem teve uma idéia. Fazer um judas e colocar na casa de um amigo. Havia uma torinha de uma madeira na casa. Trouxeram-no até o ateliê e começaram o trabalho. Fizeram uma estátua perfeita. Primeiro esculpiram o rosto, depois o corpo e as pernas. Os artistas: a mãe, o pai e o filho.

Para finalizar faltava só o traje. Esse ficou a cargo da mulher. Vestiram o tal com uma calça, camisa e paletó. Colocaram uma corrente em forma de colar. Encheram-no de medalhas, colocaram uma grande no centro. Gravaram com a ponta de um prego o nome: MANÉ MEDALHÃO. Calçaram uma bota. Um chapéu preso com um barbicacho. Prenderam uma cuia de chimarrão completa.

Quando foi à noite, levaram o “judas” no portão do amigo. A esposa deste levantou cedo no sábado. Viu a estranha figura. Chamou o marido e os filhos e o atiraram no rio. Já sabiam quem era o autor.

Os dias se passaram. Quando ninguém mais lembrava daquela façanha, soube-se de uma notícia interessante. A vários quilômetros dali numa determinada localidade. Uma imagem fora encontrado por alguns pescadores. Diziam que estava fazendo milagres. Pessoas começaram a chegar de vários lugares. Alguns curiosos, outros por fé mesmo. A fama estava correndo rápido.

De noite o homem não conseguiu pregar os olhos. Passou a noite acordado, preocupado. Lá pelas tantas chamou a mulher e os filhos pra resolver aquela situação. Logo ao amanhecer, pegaram o jeep, e foram até onde se encontrava o tal de “santo”. Chegaram perto do meio dia. Foram falar com o velho padre João, o pároco de lá.

A imagem encontrada na curva do rio, não estava mais com as botas. Os demais apetrechos estavam intactos.

Ao contar a história para o vigário, este desmaiou. Um baita susto. Foi tudo inesperado. Com algumas técnicas básicas de primeiros socorros aplicados, logo voltou. Depois de recuperado, tomou um copo d'água, padre João ouviu-os atentamente. Saíram da igreja e foram falar com o prefeito. Este esbravejou porque a pequena cidade estava conhecida nacionalmente devido ao fato. Ao ser revelado toda a verdade, com certeza cessaria a vinda de turistas. As vendas cairiam diminuindo a arrecadação de impostos. Com a ajuda do vigário, teve que concordar. Marcaram uma reunião em praça pública com o povo. A explicação...

As pessoas reunidas no dia e hora marcado. Após uma breve palavra das autoridades presentes, foi a vez de Fulgêncio. Este pegou o microfone e começou o discurso e a pedida de desculpas. Explicou sobre a imagem, que teria sido ideia e fabricação dele e da família... falou à multidão presente, mas com medo de levar uma surra da população... mas criou coragem e disse a verdade... caprichou no discurso...

“Senhores e senhoras... é com muita tristeza e vergonha que estou aqui para revelar-lhes um segredo. Alguns meses atrás, numa sexta feira santa, fizemos uma brincadeira. Construímos essa escultura, esse boneco de madeira e levamos na casa de um amigo. Demos um nome pra ele, que os senhores já vão saber. A sua mulher, nossa amiga, o arremessou no rio. As águas o trouxeram pra cá, até que foi encontrado por moradores daqui. Sinto muito, porque alguns depositaram sua fé cega na estátua. Este que aqui está... este “santo”, não é “santo”. Este é o nosso... MANÉ MEDALHÃO...”

(Christiano Nunes)