A Bailarina, Romance, Cap. VI

No interior do elevador Marluce já se achava outra. Parecia que a proximidade de casa colaborara na sua recondução ao estado quase que normal. A cabeça ainda girava um pouco. Mas ela sabia que não poderia dar chance a que seus pais fizessem maiores perguntas. Alegaria dor de cabeça e cansaço. Afinal, já eram quase onze horas e ela dormia sempre mais cedo em dias de semana. Agora era hora de pensar no ocorrido no bar. Principalmente depois que a garrafa tombou sobre a mesa. Ela não sabia se tinha fingido não perceber ou se tinha de fato não percebido. Mas como esquecer da mão de Ingrid pressionando-lhe a vagina sobre a calça jeans? E da boca da professora aproximando-se da sua. Isso tinha acontecido realmente. Pensamentos interrompidos pela porta do elevador que se abriu de repente.

A porta de casa já estava aberta.

-Que badalação, héin?, Marluce ouviu a voz de sua mãe logo que entrou.

-Não podia deixar de ir. Afinal, foi por causa dela que conquistei essa oportunidade de dançar no Corpo de Baile do Municipal.

-E por causa de você também. Se não tivesse competência, o diretor não te chamaria, prosseguiu a mãe de Marluce.

-Qual a razão desse encontro, minha filha?, perguntou o pai. Eu nem sabia.

-A professora achou que deveríamos comemorar a minha convocação, ou seja, a oportunidade que estou tendo de ser solista. Acho que é também uma forma de ela se redimir. Na verdade ela nunca deu muita importância a mim. Era sempre Eleonora, respondeu Marluce, achando-se com mais firmeza na maneira de falar. É uma espécie de compensação.

Embora procurasse manter distância, Marluce não impediu que sua mãe reconhecesse o cheiro de bebida no ar.

-Tô vendo que foi badalação mesmo, filha! Whisky ou o quê?

-Ah, mamãe, corta essa. Tô cum sono. Não vou nem tomar banho.

-Não vai comer nada?

-Não precisa. Nós fizemos um lanchinho. Boa noite pra vocês, despediu-se Marluce, fechando-se em seu quarto.

Lençol fino cobrindo o corpo que vestia apenas uma camiseta de malha e um calção de jersey. O calção era o ponto em comum que Marluce tinha com as jogadoras de futebol. Lutava para não sucumbir ao sono, o que a impediria de voltar aos pensamentos interrompidos no elevador. Tudo num dia só. Primeiro o cara me arrocha no camarim e esfrega em mim aquela coisa grande e dura. Depois a Ingrid quase me beija e me acaricia no meio das pernas. E o pior é que permiti tudo isso. Ou será que não quis evitar? Ela já devia estar querendo isso há muito tempo, porque se demorou bastante alisando o meu joelho. Será que eles tinham combinado tudo? Afonso tentaria me seduzir no teatro. E ela, quando estivéssemos sozinhas? Não, não podia ser assim. Fantasia demais. Na verdade tudo acontecera em função do ocorrido com Eleonora. Senão, não teríamos chegado até aqui. No entanto, Marluce começava a perceber que agora fazia sentido toda aquela aproximação anterior entre Ingrid e Eleonora. Que ensejavam os comentários das outras alunas da academia, embora sempre discretos. O Afonso me beijou, mas beijou também o Marcel. E talvez até com mais intensidade. Que loucura, meu Deus. E no meio daquela confusão, o sono chegou forte. Não admitiria ser adiado.

Ingrid acordou com o barulho da campainha. A faxineira perdera quase vinte minutos na porta do apartamento, esperando ser atendida pela patroa. Ingrid surpreendeu-se em ter acordado tão tarde. Dormira bem. O que não era habitual em dias de semana. Surpreendeu-se também ao se ver diante da empregada protegendo-se com um fino lençol, que mal cobria suas pernas – o rosto amassado, os cabelos desfeitos, parecendo não estar inteiramente despertada. Conseguiu perceber os olhos de Hélida percorrendo todo o seu corpo, a partir dos pés descalços sobre o tapete. A reação observada no rosto da faximeira, a partir do leve movimento dos lábios, lembrava a de um disfarçado deboche ou pilhéria. Hélida nunca vira a patroa vestida daquele jeito.

Ingrid não teve ânimo para conversar com a faxineira. Seriam válidas as instruções da semana passada, embora ela tivesse certeza de que havia outras. Voltou logo para a cama. Que se mantinha ainda um pouco aquecida pelo calor do seu corpo. Imaginou que fosse dormir num minuto. Mas o que viu foi a proximidade dos lábios de Marluce na mesa do bar. Deveria estar sonhando já? Não ou sim? Por que agora os olhos de Hélida subiam por seu corpo, acompanhando sua mão direita ao longo da parte interna de suas coxas. Apalpou com certa violência a vagina sobre a calcinha, deixando que o dedo médio penetrasse um pouco a fenda naquilo que o tecido permitia. Mas o calor da cama quente ainda não foi suficiente para lhe realçar o entusiasmo. Ergueu-se de repente e entrou rapidamente no banheiro, acionando o registro de água quente, bem mais quente que a cama. Era só o que me faltava. Sucumbir agora, não. É preciso reagir.

Ingrid levaria uns quarenta minutos para chegar à casa de Eleonora. Marluce ocupou seu pensamento durante todo o tempo que gastou para se vestir. Ela deve estar pensando que toda essa minha atenção é decorrente do convite e da paparicação do Afonso. E é. Eu não tinha reparado nas qualidades dela. Só via Eleonora. Que agora Ingrid começava a perceber que não queria ver tanto. Que talvez aquela fosse uma visita protocolar.

Chegaria por volta de 11h e procuraria sair às 12h30, antes de o almoço ser servido.

-Como vai a nossa primeira bailarina, D. Eunice?

-Está reagindo melhor, professora. Já deu as suas primeiras saidinhas, respondeu a mãe de Eleonora.

-Olha só! Que bom. É preciso mesmo pegar uma corzinha.

-Ficar como você, que está queimadinha, apesar do pouco sol que tem feito, observou Eleonora.

-Como tenho a pele clara, queimo logo. Você também, disse Ingrid.

-Vou deixá-las um pouco. Tenho que terminar o almoço, interveio D. Eunice.

A mãe de Eleonora saiu do quarto, fechando a porta atrás de si. Agia sempre assim porque imaginava que professora e aluna se sentiriam melhor e com mais conforto para conversarem coisas que os pais não precisassem saber. Eleonora ocupava a cadeira da sua escrivaninha, de frente para Ingrid, e esta a beira da cama de Eleonora.

Tão logo D. Eunice saiu, Ingrid levantou-se e se aproximou de Eleonora. Suas mãos afagaram o rosto e os cabelos negros da aluna.

-Já está conseguindo sair normalmente?

-Normalmente não, Ingrid. Ainda tenho medo quando vejo um cara qualquer caminhando na minha direção ou mesmo do outro lado da calçada.

-Chegou mesmo a ter algum tipo de apoio psicológico?

-Papai chegou a pensar nisso, como te falei. Mas eu mesma fui contra. Sempre achei que podia superar sozinha isso tudo. E acho que estou conseguindo.

-Claro que sim. E seus pais têm sido muito amigos e atenciosos com você.

-E você também. Apesar de ter sumido um pouco daqui.

-Não é assim, Leo. Percebi que seus pais ficaram muito aflitos e se acercaram logo de você durante os primeiros dias após aquela merda toda. Não ficaria bem eu ficar no meio. Poderia representar um empecilho, de certa forma. É claro que senti muito não poder lhe atender com todo o carinho que você merece. Tenho sentido sua falta.

-Será que tem mesmo? Não me substituíram também nesse setor?

-Quê é isso, Leo? Uma pontinha de ciúme?, perguntou Ingrid, segurando as duas mãos de Eleonora e fazendo-a erguer-se da cadeira.

-Não é ciúme. É que você tem mesmo que dar atenção à menina, respondeu Eleonora, já de pé. Quem vai acompanhá-la junto ao diretor?

Percebia-se facilmente no rosto de Eleonora o descompasso entre o que ela dizia, aparentemente de forma natural, e a expressão do que ela sentia, revelada pelo sorriso sem graça e os olhos sem brilho. Imediatamente Ingrid tomou-a entre os braços, estreitando-a contra si, mantendo as duas as cabeças afastadas, olhos nos olhos.

-Bobinha. Você acha que eu poderia me interessar mais por alguém do que por você?

Eleonora não respondeu. Preferiu acompanhar com os olhos a aproximação da boca de Ingrid até sentir os lábios da professora nos seus. O beijo foi lento e delicado a princípio, tendo depois se tornado impulsivo e violento pela avidez demonstrada pelas duas. Que comprimiam desavergonhadamente seus corpos, as mãos de Ingrid ora na cintura, ora nas ancas de Eleonora, cujas pernas se abriam na tentativa frenética de se esfregar na outra. Eleonora esperou a interrupção do beijo, para facilitar a respiração, e trancou a porta, embora soubesse que sua mãe não a abriria. Chamaria por elas da cozinha. O pai não viria almoçar em casa.

O vestido de alças de Ingrid já estava no chão quando Eleonora aproximou-se de novo da professora. As duas sabiam que não teriam muito tempo. Mas não queriam perder a chance de acabar com aquela trégua a que se viram forçadas depois da tentativa de seqüestro de Eleonora. Livrando-se do bermudão folgado que vestia, sob o qual não havia mais nada, Eleonora sabia que atraia os olhos da professora para os densos pelos negros que tinha entre as pernas. Percebia também que os ruivos pentelhos encaracolados de Ingrid se libertavam pelas laterais da calcinha. O umbigo róseo perfeito. Os seios rijos, de bicos largos e cheios, mal contidos pelo soutien, delicadamente retirado pela aluna. Eleonora começou por eles.

Como uma criança, mamou o mais demoradamente que pode nos peitos da professora. E ao tempo em que o fazia, lembrava-se de que nada tinha a ver com a maneira angelical com que devia chupar os peitos de D. Eunice quando era ainda bebê. Ingrid, de olhos fechados, deliciando-se com a voracidade da boca de sua aluna, não pode notar a inscrição na camiseta de Eleonora, única peça que ela mantinha no corpo: “É nóis na fita”. Possivelmente estranharia o fato de a aluna não mostrar aversão por determinada linguagem, privativa por certo daqueles que a tinham agredido. Ou seria uma maneira de aceitar a realidade, surgindo daí a possibilidade de uma recuperação emocional ou moral mais acentuada? Ingrid reparara apenas no bermudão, quando entrou no quarto. Sob o qual não devia haver nada, como constatou depois.

As duas não caíram sobre a cama, como era de se esperar, ou como esperava uma delas. Foram se agachando vagarosamente, até chegarem ao chão, apoiando-se uma na outra, as costas de Ingrid contra a beira da cama de Eleonora. Que procurava manter a boca ocupada alternadamente com cada um dos seios da professora. Dobras das pernas grossas da ruiva, joelho da perna de bailarina da morena-clara molhando-se no meio das pernas de Ingrid. A boca de Eleonora alcançando o pescoço de Ingrid, que se inclinava levemente em busca de apoio na beirada da cama. A respiração das duas se tornando sôfrega e intensa, enquanto mais embaixo, com o movimento dos joelhos, as pernas se entrecruzavam até que as matas ruiva e negra se misturassem, num encaixe perfeito, mantido com todo o cuidado para que não houvesse a menor mudança de posição – os lábios das duas bucetas se beijando, os grelos se esfregando. Era a foda que se iniciava.

Aluizio Rezende
Enviado por Aluizio Rezende em 14/10/2011
Código do texto: T3275410
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