O CASAMENTO...

Já estava atrasada. Era tarde para quem teria que começar a trabalhar cedo. Então corri o quanto pude para chegar no ônibus. Percebi a cidade estranha, todos quietos, cabeça baixa... Alguns ousavam e olhavam em minha direção, e nada mais...

Cansada, cheguei até o ponto e vi o ônibus passar. Não consegui alcançá-lo e percebi que se fosse esperar o próximo, me atrasaria mais ainda. Comecei a enfrentar meu caminho a pé.

Cheguei então ao escritório e todos trabalhavam quietos. Lembrei-me da grande briga de ontem, e permaneci calada para evitar mais encrencas.

Iniciei meu trabalho como eles... Quieta.

A tarde passou e algumas pastas foram colocadas a minha frente como se eu não estivesse ali, notei que todos deveriam estar me odiando e algumas lágrimas até caíram dos meus olhos, pois não era esse o resultado que eu queria, mas infelizmente foi tudo que consegui.

Ouvi um senhor no balcão me olhar e dizendo:

- Ei, psiu. Venha até aqui.

Olhei com curiosidade e ele acenou para mim, me chamando pelo dedo.

Perguntei:

- Eu?

- Sim, você! – ele me respondeu.

Caminhei e ele me olhava dizendo:

- Por um acaso você ta se sentindo bem?

- Sim, esta tudo bem, porquê? – perguntei.

E ele se aproximou dizendo:

- É que quando eu fiz isso, fiquei muito perturbado. Demorei em ter uma chance. Fingi igual a você, menti a mim mesmo que estava tudo normal, mas com o tempo tive que aceitar, e viver aqui, refazendo todo meu ciclo é meu castigo!

Fiquei parada na frente daquele senhor, talvez um pouco pálida e perguntei:

- Me desculpe, meu senhor, mas sobre o que o senhor está falando. Por acaso é sobre o meu trabalho? É sobre o que aconteceu ontem?

- Sim! É sobre isso que estou falando. Mas fique tranqüila, você vai se acostumar com isso. Perdi muitos anos de minha vida, nem sei mais as contas, nesta nossa dimensão, não sei nem em que dia estou, mas faz muito tempo que estou na mesma situação que você!

Parei por instantes e olhei o escritório todo.

- Quem é que falou para o senhor sobre a briga de ontem? – Indaguei.

- De que briga? Não estou falando de nenhuma briga! – Ele respondeu.

E então, comecei a ficar intrigada.

- Do que então o senhor está falando?

E ele sorriu:

- Está explicado. Você não sabe!

- Não sei do que?

- Do seu suicídio! – ele me respondeu com franqueza.

No mesmo momento, em minha mente vieram as imagens da discussão, por causa da dívida em que sem querer meti o escritório todo ao preencher alguns papéis a fim de comprar computadores novos (que estavam a preço de pechincha) que eram na verdade roubados. A briga que foi quando o diretor decidiu que todos os salários, de todos os funcionários teriam um desconto por causa da minha irresponsabilidade, e isso serviria de exemplo para todos. E vi então, a carta que escrevi exemplificando a minha dor por causa do que houve, e então me vi pulando... e senti o sufoco em minha garganta... a ponto de queimá-la com a corda se esfregando na pele.

Então ouvi:

- Pessoal, acabo de receber um telefonema da polícia. A Débora se matou.

Olhei o escritório e vi todos abalados com a noticia e não entendi o porque de eu ainda estar ali...

No mesmo instante... O senhor que conversava comigo disse:

- Daqui algumas horas você voltará a sua casa, irá escrever uma carta... E pulará da cadeira...

No mesmo instante, duas lágrimas caíram de meus olhos...

E os fechei esperando minha nova vida, onde eu me casei com a morte!