O SEGREDO DO LIVRO- Na fazenda...

CAP.5 – MAIS UM ENCONTRO NA FAZENDA

Lá estavam eles novamente na fazenda, cavando, queriam encontrar o tal livro. Paulo Henrique era o mais robusto, tinha os cabelos claros como o de sua mãe e era o que mais dedicava na busca. Nesse dia, resolveram acompanhá-los mais dois amigos da escola que se interessaram pela aventura: Lindomar e Marcos. Esses dois gostaram da ideia e insistiram para irem juntos. Fernando não queria que eles fossem, não gostava do Lindomar, detestava a presença desse rapaz de cabelos negros e lisos, penteados para trás e de sorriso muito alvo; que tentava conquistar o coração de Regiane, sua colega de escola , que ele gostava e se corroía de ciúmes.

- Fala uma coisa para mim, Augusto, você falou que o Coronel matou um porco, eu fiquei pensando... Por que ele matou um porco? – perguntou Lindomar.

- Eu já disse.

- Não, você não disse – Retrucou Marcos. – Eu também estava prestando atenção , você não disse porque ele matou o porco, só disse que ele matou e enterrou.

- É que “o coisa ruim” disse que queria o sacrifício de uma criança, eu já disse isso, e ele não quis matar, por isso ele enganou o diabo, colocou um porco no lugar ...

- Credo! – Assustou Fernando

- Cara, essa história está ficando demais – Disse Marcos.

- Então era verdade que a mãe dele matava crianças, porque o coisa ruim pedia... – Sugeriu Bruno.

- Pode ser... Dizem que o livro foi escrito com sangue humano – Falou Henrique, o de cabelos claros, ele costumava cortá-los bem curtinhos e ficavam espetados e tinha algumas sardas no rosto, que lhe dava um ar de moleque, era o mais gordo da turma, tinha um sorriso que parecia estar zombando de todos. Nunca se sabia se estava falando sério ou brincando, por isso sempre costumava emendar com a frase: - É sério...

- Cara que sinistro – Lindomar falou e Fernando o olhou com olhos de não muito amigo.

- O caso é que – Emendou Paulo Augusto, o mais baixo e magro de todos os amigos e com um olhar muito vivo – Acreditando ou não nas coisas do livro, ele encontrou o pai e muito antes do que pudesse imaginar. Percebam que ele chegou à cidade e o pai dele já estava lá. Como se o estivesse esperando. O que vocês acham, será que foi pura coincidência?

- Sei lá cara, não estou gostando desta história, está ficando muito diabólica.

- Fernando, não me diga que você vai cair fora? – falou Bruno.- Pensa comigo, ele encontrou o pai, ficou rico... Se for verdade...

- Pessoal vamos cavar, vocês estão só enrolando, ninguém cavou nessa parte do chiqueiro.

- Calma Henrique, estamos cansados, pensa que é fácil trabalhar tanto – Retrucou Fernando.

Aquela tarde eles passaram cavando, mal pararam para comer, quando terminaram as escavações no chiqueiro já estava começando a escurecer e resolveram que iriam embora. Lindomar e Marcos moravam em outro bairro e resolveram que iriam de ônibus, Paulo Henrique e Paulo Augusto estavam próximos de seu bairro. Fernando e Bruno tiveram que pegar a trilha sozinhos para irem embora, e estavam tranquilos até que surgiu um vulto negro e assustador, apareceu de repente, eles começaram correr e o vulto na escuridão correu atrás, cercou-os e eles saíram da trilha. Foi desesperador, se perderam um do outro. Bruno pegou o caminho certo e conseguiu chegar ao bairro e Fernando desembestou a correr feito um louco, nem sabia onde estava, nem via mais o vulto, mas mesmo assim corria. Avistou mais a frente um casebre com luzes de lamparina acesas, o cachorro começou a latir, ele correu em direção à porta e bateu desesperadamente, saiu um velho casal e o acolheu. Ele explicou o que estava acontecendo, muito assustado e sem fôlego, mesmo assim não parava de falar e contar o ocorrido, contou também o que estavam fazendo ali.

- “Meu fiu, num pode mexê co essas coisa” – Disse a bondosa velha, dando-lhe um copo de água numa caneca de lata.

Fernando olhou em volta e viu que o casebre era muito pobre, feito de madeira e latão, fazia barulho com o vento batendo na lata, tinha um fogão de barro bastante escuro de carvão e alguns móveis de madeira rústica, feito à mão, talvez pelo próprio casal. Tinha uma lamparina, que alumiava o cômodo, o suficiente para tirar o rapaz daquele breu que encontrara lá fora.

- “Se ucê subesse o que tem por trás desse livro, jamais procurava por ele”- Disse o velho, um senhor magro, com um cigarro de palha no canto da boca e um chapéu encardido também de palha.

- Eu não quero mais mexer com isso, meus amigos que estão obcecados por essa história...

- “Ucê num magina quanto o coroner se arrependeu”...

- O senhor conhece a história?

- “Muito mai du que ucê magina e também muito mai do que gostaria. A única coisa que conseio é que se afaste disso enquanto é tempo, já deu prá tê uma idéia do mar que pode causá, não deu?”.

- Eu nunca mais quero ir naquela fazenda...

-“ Fale pru seus amigo ficá longe. Nóis trabaiô lá, nois era jovem, conhecemos o coroner. Ucê precisava vê, dava até dó quanto aquele homem sofreu na mão du coisa ruim. Ele achou que tinha inganado o capeta, só que dispois pagô um preço caro por isso. Ninguém engana o tinhoso. Ucês tão mexendo com fogo”.

- Eu só quero ir embora...

- “Véio, cumpanha ele até o bairro”.

O rapaz olhou para aquela mulher enrugada, bem velhinha, mas com uma voz firme e bondosa.

- Mas não tem perigo? Eu estou com medo...

- “Ucê num pode passá a noite aqui, seus pai vai preocupá, eu conheço bem essas banda, pode ficá sossegado”.

- Está bem.

- “Vamu entonce, antes que fique mai tarde”.

-“ Minino, si cuida viu” – Falou a velha senhora.

Fernando e o velho saíram pela trilha, estava ventando gelado. O rapaz sentia medo. Foram calados, de vez em quando falavam alguma coisa para quebrar o silêncio, mas nenhuma conversa se engrenou, pois o medo dominava os sentidos do rapaz.

Ao chegarem à cerca, rapidamente Fernando se despediu do velho e correu para a casa do Bruno, que era a mais próxima, o amigo, assustado, disse que estava esperando um pouco e que se ele não aparecesse ia chamar os pais e comunicar o ocorrido. Depois de conversarem, cada um foi para sua casa, ainda atônitos com o ocorrido.

Capítulo 6 - Algo estranho

No dia seguinte, tentando convencer Bruno para parar com as buscas, contou o que o velho casal havia falado. Ficaram muito curiosos em conhecer mais daquela história toda que o casal parecia conhecer muito bem. Resolveram ir até o casebre. Pegaram a trilha, o rapaz lembrava o caminho, pois havia observado que era beirando o riacho, então bastava seguir o curso da água. Foi o que fizeram e chegaram a uma cabana visivelmente abandonada há muito tempo. Fernando logo deduziu que com certeza não era a que procuravam, então andaram mais e estranhou o lugar, não poderia ser tão distante. Não havia andado tanto assim na noite anterior. Voltaram e novamente chegaram à cabana abandonada, resolveram entrar, com cuidado, pois estava bastante destruída. O rapaz ficou pálido ao ver o fogão à lenha, era exatamente o que havia visto na noite anterior. Achou que podia estar meio confuso com todos os acontecimentos, preferiu ir embora.

- Fernando, tudo isso está mexendo com a sua cabeça, veja bem, com certeza a cabana deve ser do outro lado do rio. Era noite, estava escuro, você assustado... Não deve ter reparado o caminho.

- Nós já havíamos passado o riacho Bruno, lembra?

- Sim, mas você pode ter voltado para trás sem perceber. No susto.

- Tá, então vamos voltar por trás do riacho. Mas eu sei que era mais perto.

- Vamos fazer o seguinte, a gente volta outro dia que você estiver com a cabeça mais fria, minha mãe quer que eu vá ao mercado para ela e se eu demorar vai fechar.

- Tudo bem, a gente volta amanhã.

Fernando estava confuso e Bruno achava que o amigo estava enganado com o caminho, mudaram de assunto. Falaram do campeonato de futebol do bairro, não haviam treinado nos últimos meses e precisavam se dedicar mais.

Capítulo 7 – O casebre

No dia seguinte Bruno faltou à aula, não estava muito bem. Fernando foi visitá-lo à tarde e queria muito que o amigo o acompanhasse novamente pela trilha, porém viu que ele não estava bem, ardia em febre. Resolveu, após a visita, ir sozinho procurar o casebre. Passou pela cerca e seguiu a trilha beirando o riacho pelo mesmo caminho do dia anterior, pois estava intrigado, sabia que era daquele lado do rio. Estava cansado, a trilha era longa, quando já pensava em voltar avistou o barraco, estava com a porta aberta e o velho estava sentado numa cadeira fumando o cigarro de palha. O rapaz teve a nítida impressão de que era o mesmo local que havia visto o casebre abandonado, com certeza estava confuso, resolveu aproximar-se.

- Olá. Eu vim agradecer o senhor.

- “Num tem di que fiu” – respondeu o velho puxando a fumaça do cigarro.

-Eu não perguntei o nome do senhor.

-“ É Dito, fiu, é Seu Dito, minha muié é Dona Maria. Mai ucê num devia tá por essas banda aqui não”.

- Eu vim ontem, mas é estranho, eu não achei sua casa.

- “Ah”. – resmungou Seu Dito.

- Eu vim com meu amigo, eu queria que vocês contassem o que sabem sobre a história do coronel. Ele não acreditou muito em nada. Ele acha que o que vimos na noite foi só uma impressão de noite muito escura. Mas eu vi bem. Não falamos nada para os outros. Acho que eles vão rir da gente.

- “Fiu, ucê tem que si afastá de tudo isso – Falou Dona Maria vindo lá de dentro e assustando o moço – Todas essas coisa são maligna e muito perigosa. Ucê tem que procurá um padre e se benzê”

- O que foi que aconteceu com o Coronel depois que ele encontrou com o pai dele?

- “Vixi fiu , essa história é longa! O coroner vendeu a arma para o tinhoso, só que ele quis inganá e ao invés de uma criança, ofereceu um porco. Ele recebeu tudo que pidiu e foi tudo rápido, quando encontrô o pai, que logo o reconheceu por serem iguarzinho e ao saber que foi criado pela bruxa, o homem quis compensá por todos os ano de miséria e sofrimento e logo o encheu de dinheiro. A irmã dele também havia sumido e a mãe morreu de desgosto”.

- Estranho, pelo que sei a irmã estava no exterior.

- “Nunca teve. As pessoa achava que sim, eles num falava muito da minina. Procuraram bastante, mai preferiram num comentar. Na verdade, o coroner, ligando os fato na cunversa co pai, suspeitou que a minina que apareceu morta no rio, era a irmã dele. Mas isso ele nunca teve certeza. Ele só lembrava que logo depois do sumiço das cinco criança, sua mãe, ou melhor, a mulher que raptou ele chegou cuma menina que logo desapareceu e ela o proibiu de falá arguma coisa, mas ele nem tinha cum quem falá, ninguém o ouvia. Na época era muito criança e a menina era um pouco mais veia que ele”.

- Nossa!

- “Quando ele contô para o pai que achava que era a irmã que havia aparecido morta no rio, o pai quase endoidô, tinha a esperança que a fia tivesse viva. O coroner ainda contou que ela chorava muito e era linda, pálida e magrinha com belos cabelos cor de ôro. O homem não teve dúvida que era sua fia. Passô todo o dinheiro para o fio e se matô enforcado numa árve. Foi terrível. Mai uma vez o coroner Anercides estava sozinho e dessa vez rico, absurdamente rico. Só que o dinheiro também era mardito, pois esse livro foi encontrado pelo pai do coroner, quando ele ainda era jovem e pobre, e o livro deu riqueza e poder . Ele se casô e logo contratô a babá que o roubô, levou o livro e o fio. E depois veio buscá a minina, diz que foi o tinhoso que pidiu a minina. Queria o minino, disse que lhe pertencia pelo trato feito,mai a veia bruxa havia se apegado ao suposto fiu e não quis dá e sugeriu a troca. Por isso que eu falo prucê, se afaste desse livro, ele só traz desgraceira”.

- Eu não quero mais saber disso não.

- “É mió assim, convença seus amigos de se afastá, o livro está esperando e vai fazê de tudo para ser encontrado, ele precisa de sangue”.

- Eu falei para eles se afastarem. Mas vou falar de novo. Estou pensando em trazê-los aqui, quem sabe vocês podem convencê-los.

- “Não fiu, nóis não pode convencê ninguém, só ucê que pode”. – Falou o velho Dito que até então estava em silêncio com o cigarro apagado no canto da boca.

- Mas eles não vão acreditar em mim, me acham medroso e vão pensar que estou inventando tudo. Fale uma coisa . O coronel não teve filho?

- “Não, quando ele enganô “o coisa feia” enterrando um porco no lugá de uma criança ele pagô caro. O diabo foi pegá a arma da criança e viu que não havia arma nenhuma, estava tudo vazio, porco não tem arma, e o tinhoso se enfureceu e então resorveu que ficaria com os fiu que nascessem, foram levado os sete fios que sua muié gerô no útero e por fim levou ela também, todos morria no ventre com sete mes. O Coroner sofreu muito, ele amava a muié. Ele a conheceu quando ainda era muito pobre e sempre contava essa história, que quando se apaixonô por ela era um miserável carregador de porcos, sujo e fedido, ela nem oiô. Depois de um tempo ele vortou rico e poderoso, logo após a morte de seu pai. Ele só vortô naquela cidade por causa dela, mas ela não quis saber dele, não. Ela não sabia que ele era o rapaz dos porcos, ninguém na cidade sabia. Mas mesmos assim ela gostava de outro.

- Mas e aí?

-“ E aí, que conta as más línguas, que ele recorreu novamente ao tinhoso e deu mais um porco em troca, como se fosse uma criança. Ele achava que estava sendo esperto, mas o tinhoso já sabia e fingia que não percebia nada. Aí a moça de uma hora pra otra se derreteu em amores por ele .Ele só contô pra ela que era o rapaz dos porco quando estavam noivo, sua família falida não se opôs ao casamento. Que foi para eles a salvação, pois estavam na miséria”.

- Mas ele continuou mexendo com o livro?

- "Por mais cinco vez, quando ele faliu, quando ficou doente e algumas outras vez que queria alguma coisa.

Aí a muié já estava perdendo os fio, mas ele não sabia que eram levados pelo tinhoso. Ele só percebeu no sétimo. Pois dava exatamente a conta dos porco que ele havia enterrado".

- Minha nossa! E o que ele fez?

- “Dizem que foi tirá satisfação com o diabo e esse levou sua muié também. O coroner de raiva enterrô o livro, mas nunca se livrô da mardição. Morreu seco, pele e osso. Não comia mais de tanto sofrimento. Ele comprô toda a terra que viveu na infância, é onde está a fazenda. E o rio é esse aqui, hoje é um pequeno riacho. Essas terra tão abandonada e ele nunca teve herdeiros, os empregado fugiram do local com medo de mardição, tudo nessa terra seca. Prantação num vinga, animais adoece e criança cria bicha na barriga e fica barriguda.

- Toda essa terra era dele?

- “Sim, é a perdê de vista”.

- É muita terra.

- “E eu aconseio ucê a ficá bem longe dessas terra. São amaldiçoada. O livro está enterrado nela. Mai mudando de assunto. Vamos comê uns bolinho qui fiz?

- Adoro bolo!

Fernando esqueceu das horas e quando viu já estava escurecendo. Era tarde de inverno e a noite caia rapidamente. Despediu-se assustado e correu em direção à sua rua. No meio do caminho já escuro avistou novamente a sombra que o havia perseguido antes. Era assustadora. Apareceu como um vulto de uma pessoa, mas ao mesmo tempo era densa, conforme se aproximava ouvia-se um barulho de um vento forte. No susto ele caiu no chão e se arrastou aterrorizado, conseguiu levantar de novo e correu como um louco conseguindo chegar à sua casa.

(continua...)

Raquel Delvaje
Enviado por Raquel Delvaje em 29/06/2013
Reeditado em 02/07/2013
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