UM ESTRANHO FELINO. Final.

A jovem olhava fixamente dentro do baú.

- "Liberte-se minha filha..."

A jovem virou-se assustada ao ouvir aquela voz suplicante ecoando pela casa. Não viu ninguém! Mas... tinha a certeza de que era a voz de sua mãe.

- Mãe! - exclamou, mais de susto do que como uma exclamação.

A gata soltou um miado ameaçador do lado de fora da casa. A jovem correu até a janela. A gata olhava ameaçadoramente para algo invisível. Os gatinhos estavam encolhidos junto à parede, numa defensiva natural. A gata pulou pelo ar, como se desse um bote certeiro em alguma coisa e caiu pelo chão. Parecia que lutava ferozmente com algum fantasma.

- Santo Deus! O que está acontecendo aqui! - exclamou a jovem, sem saber o que fazer.

- "Faça um circulo com alho e sal grosso em volta da casa... passe arruda por todos os cômodos!"

- O que! Por favor, apareça! Mãe... é a senhora! O que está acontecendo aqui!

Imediatamente começou a procurar pela casa os ingredientes que aquela voz havia lhe dito.

- "Na dispensa... primeiro o círculo de sal grosso, depois o alho... arruda do lado de fora da casa perto do alpendre.. despenque o alho e faça o círculo."

Mesmo amedrontada, sem saber onde estava as coisas daquele pedido estranho, saiu pela casa à procura delas. Quando encontrou o sal grosso, arrastou o saco até ao terreiro, furando-o com uma faca e o arrastou apressadamente em volta da casa, fazendo um círculo em torno dela. A gata ia na sua frente em miados ferozes, tentando não permitir que algo estranho e invisível passasse para dentro do círculo. A jovem correu para a dispensa. Apressadamente, arrancou várias réstias de alho penduradas na parede. Pelo caminho, começou a despencá-los, imitando o círculo de sal, jogou cada grão de alho em torno da casa.

Olhou perto do alpendre, praticamente depenou o pé de arruda e fez o mesmo em torno ao círculo de sal e de alho, passando os galhos de arruda pelo chão, deixando algumas folhas pelo caminho! Três círculos com uma distância, talvez, de meio metro um do outro em torno da casa. Depois, esfregou os galhos de arrudas por toda a casa.

A gata olhava fixamente do outro lado das três linhas do círculo. Seguia do lado de dentro do círculo alguma coisa se movendo do lado de fora dele. Contornou todo toda a casa como se vigiasse algo invisível, tentando atravessar os três círculos.

- "Não precisa ter medo... está protegida! Mas não ultrapasse os círculos" - disse a voz novamente.

- Mãe... o que está acontecendo! Onde está meu pai! Onde vocês estão! Apareçam!

- "Você ainda não pode nos ver... por enquanto. Os gatos percebem algo invisível em torno deles... fique de olho nela... os felinos são muito sensíveis... E você e esta gata eram como carne e unha... ela não saia do seu colo."

- O que está acontecendo! Droga!

- "Feitiço! Há um crucifixo de prata no quarto... ande com ele e aponte para aquela coisa... leve a gata com você, ela saberá onde a coisa está! Quando tiver certeza onde aquela coisa está... mire onde os olhos da gata estiver mirando e atire com todas suas forças o crucifixo naquela coisa... ele é pontudo no alto da cruz e cravará naquela coisa... e o sangue dela será contaminado com a água benta em que o crucifixo foi benzido e aquela coisa irá embora e você se libertará."

- Libertar de quê!

- "Das trevas! Você verá a luz..."

Apressadamente a jovem percorreu a casa em busca do crucifixo. Apanhou-o apressadamente e correu para junto da gata, que olhava fixamente para fora do circulo como uma estátua. A jovem ficou atrás da gata. Quando o felino se preparou para saltar em algo estranho, arriscando sua sorte, a jovem jogou com toda força o crucifixo para fora do círculo, em algo que não tinha a menor idéia do que era.

Assustada, viu o crucifico no ar, preso em alguma coisa que se movia aos berros e um filete de sangue no ar, escorreu para o chão. Havia acertado o alvo. Uma ventania se formou naquela instante. Fechou os olhos e cobriu o rosto por causa da poeira. Quando pode ver novamente, depois da calmaria, o crucifixo estava pelo chão e a gata em volta dele.

- Venha, minha filha... venha para a luz... seu pai está esperando por você.

- Mãe!

- Sim! Agora você pode me ver... todos nós morremos naquele desastre e você sumiu para outros mundo e fez muita maldade por aí... Eu rezei muito por você... seu espírito não aceitou a morte. Você voltou ao mesmo lugar de sua morte... achava que ainda estava viva... Venha!... Tudo acabou! Vamos para luz!

E saíram de mãos dadas por entre uma neblina com um facho de luz que lhes indicava o caminho.

Fim.