A MARCA DA MALDADE

Desde o começo não fui com a cara dela.

— Não vai ser um trabalho muito fácil.

— Pago o que for preciso. Dinheiro não é o problema.

Era de manhãzinha, eu tinha acabado de sair de casa para comprar pão na padaria, andava pela calçada, distraído, bocejando como um bode velho, foi quando o avistei. Lá estava ele dando sopa. Olhei em volta. Cheio de gente na rua. Botei a mão no bolso e peguei a ferramenta.

Mas não pense que foi fácil. O sujeito pára o carro na rua com o vidro aberto e dificilmente tranca a porta, crente que nenhum maluco vai abordá-lo. É ai que entra o meu trabalho.

A grã-fina já estava pegando no meu pé. A conheci numa exposição de carros antigos. Na ocasião eu admirava um Corcel ano 68, um dos primeiro modelos fabricados no Brasil. Como o Mustang, foi batizado com o nome de um cavalo. Foi quando essa grã-fina se aproximou e disse que queria dar um carro de presente para a coleção do marido, que estava louco por um chevi GP ano 77.

Desde o começo não fui com a cara dela.

— Não vai ser um trabalho muito fácil.

— Pago o que for preciso. Dinheiro não é o problema.

— Por que a senhora não compra um Audi?

— Ele já tem.

— Último modelo?

Importado direto da Alemanha, ela disse, olhando para mim como se eu fosse um coco de cachorro, mas não era uma cara de nojo não, essas donas não tem nojo de coco de cachorro, elas amam os seus cachorros.

Uma vez vi uma dona dessas passeando com seu cachorro pela exposição e quando o poodle fez coco, ela naturalmente retirou um lencinho e escondeu o coco do cachorro dentro da bolsa. Essas donas não têm nojo de nada. Essa cara que elas fazem é de superioridade, se acham superiores ao coco.

Era de manhãzinha, eu tinha acabado de sair de casa pra comprar pão na padaria, andava pela calçada, distraído, bocejando como um bode velho, foi quando o avistei. Lá estava ele dando sopa. Senti um aperto no peito. Sem dúvida, era um chevi GP 77. Estava caindo aos pedaços. Ninguém quer roubar carro velho. Olhei em volta. Cheio de gente na rua. A policia tá cagando para esse tipo de roubo. Restauro os carros na oficina, que montei no fundo da minha casa, e vendo para os colecionadores. Negocio garantido. Está cheio de carro velho por ai dando sopa, maltratado por donos relapsos. Botei a mão no bolso e peguei a ferramenta. Bang. Bang. Dois tiros na cabeça do tiozinho que tentou arrancar com o carro.

Mas não pense que foi fácil. A criançada no banco de trás começou a berrar. A esposa gorda saltou do banco da frente, para fora do carro, como um porco assustado. Trabalho do cão. Bang. Bang.

F Mendes
Enviado por F Mendes em 03/05/2014
Código do texto: T4793147
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