O suicida

Era noite chuvosa de domingo. Saí da casa de minha namorada lá pelas 10h. Geralmente ficava lá ate meia noite, mas neste dia havíamos brigado feio e ela disse que estava tudo teminado. Era relacionamento de anos e planejávamos nos casar. Quando ia passando por certa ponte algo me perturbou a atenção. Havia uma figura alta e muito magra a quase se jogar de cima da tal ponte. Fiquei em dúvida daquilo. E ia passar direto quando o homem chorava e se lamentava muito. Era como se estivesse sendo atraído a ele.

Então lhe chamei:

- Ei meu amigo! É você mesmo. Não faça isso! Cara!

- Não venha não, que eu pulo! To falando serio! Pulo mesmo! Ninguém vai sentir minha falta.

- Claro que vai! Falei com entusiasmo sem saber se estava certo ou não. O que eu não queria era ver a cara daquele sujeito estampada no jornal local. E me lembrei da importância da inclusão de uma pessoa. Prossegui.

- Qual é o seu nome, amigo?

- Francisco.

Mas então veio um senhor de feição arrogante. Aí eu pensei: que bom. Não estou mais sozinho com esse louco.

O senhor deu um rosnado para limpar a garganta e disse para ele:

- Se eu fosse você pulava logo.

- Que isso meu senhor? Está louco? Não mande ele pular,não!

Falei indignado.

- Por que não? Se ele tá querendo. Que pule logo!

- Olha que eu pulo mesmo, gente!

Aí que lhe perguntei:

- Mas porque você quer pular dessa altura toda?

- Minha vida tá uma desgraça! Minha mulher me traiu e me deixou. Minha filha tá grávida de um vagabundo. E pra completar eu perdi o emprego.

- Cara! A vida dele tá uma merda mesmo...

- Heim? O que foi que disse?

- Ah, nada, não.

Mas o senhor olhando insistentemente ao relógio continuava:

- Vai pular ou não? Decide logo que eu to atrasado. Já era pra eu estar em outra situação. Nunca vi lugar igual a esta cidade pra ter gente indecisa, viu!

- O senhor não tem vergonha de ficar instigando uma coisa dessas, não? Na sua idade deveria era estar cuidando não destruindo.

Não demorou nada e apareceu um pastor. Chegou assustado dizendo que fora enviado ali para salvar uma alma para Deus.

- Ah! Só me faltava essa agora, um pastor. Agora ele não pula mesmo!

- Isso, meu filho é porque ate você conhece o poder da palavra.

- Sei é da embromação, isso sim.

- Rapaz, não fala assim do pastor, não!- retruquei já indignado.

Aí o velho senhor direcionou a conversa ao pastor:

- Ei, acho que te conheço! Você não é aquele homem que tinha um bar e depois fez uma igrejinha no local?

- Bem. Isso é coisa do passado. Agora minha vida mudou e por isso estou aqui... ate você tem jeito. Por que não tenta?

- E viver de aparências?! Nem pensar!

- Por que me diz assim?

- Veja aquele homem deprimido. Está prestes a pular. O que você vai fazer?

- Nada posso fazer que não seja da vontade de Deus. Mas enfim só preciso que ele diga que aceita Jesus no coração. Irei dormir com a consciência tranquila.

Não aguentando mais toda aquela lorota fui questionar o velho:

- Escuta aqui! Para que serviu todos os anos que viveu ate agora?

Aí ele me disse:

- Meu jovem. Realmente estou velho. Já vi de tudo neste mundo. Parece só haver sofrimentos e injustiças. Mas amei e fui amado e se você olhar em si mesmo descobrirá porque ainda vale tentar. Uma nova vida pulsa dentro e sentir o sorriso de uma criança é a melhor recompensa da vida.

Aquela voz soou como eco dentro da minha cabeça. De repente assustando-me com o silencio não vi mais o tal que queria pular da ponte.

- Cadê o Francisco?!

Corri para a beirada e não vi ninguém. Olhei por todos os lados e nada. Desesperei-me. Virei-me para perguntar a eles, mas quando fui abrir a boca não tinha ninguém comigo.

Como se estivesse delirando ou em um sonho fiquei desolado. E ainda pouco tonto afastei-me da beirada bem devagarzinho. Desci do patamar e sobrevivi.

Geovani Silva
Enviado por Geovani Silva em 08/08/2014
Reeditado em 02/04/2015
Código do texto: T4914024
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