Solitária...

A tela do computador, sua companhia desde cedo, já a hipnotizava, como se entrasse em transe, seu cérebro nem funcionava mais, ia em piloto automático seguindo o que seus dedos digitavam ou o que sua mãos clicava com o mouse. Estava sozinha, nem notava mais o silencio da casa a seu redor, que era interrompido de tempos em tempos pelo latido do seu cão, que certamente tinha visto um mosquito e latia.

Foi tomar banho, pois já começava a sentir um pouco de sono e sabia que se esfriasse mais um pouco ia ficar mais e mais desanimada em se molhar. Entrou no banheiro, ligou o chuveiro, pouco antes de entrar ficou se observando no espelho, as olheiras, o lápis preto borrado, os negros cabelos um pouco desgrenhados, a sexta-feira tinha sido um tédio, ou melhor o tédio de sempre. Seu namorado estava estudando àquela hora... Sua criatividade devia estar perdida em meio às sinapses de seu cérebro, a vida de seus olhos tinha sido sugada pela tela do computador, certamente....

A água quente escorria por seu corpo, o vapor atenuava a luz da lâmpada, com os olhos fechado pensava em tudo, e em nada, tentava sentir algo, mas naquele instante tudo parecia parado demais...

A luz se apagou de repente, se assustou muito, grudou na parede, a água que caia do chuveiro ainda estava quente, talvez tivesse sido a lâmpada que queimou... Tentava acostumar os olhos à escuridão, pretendia terminar o banho antes de sair às cegas enrolada na toalha, não queria sair cheia de sabão com risco de cair no escuro. Com os olhos ainda fechado sentiu que a água parecia mais espessa, com a textura do xampu, seria o medo responsável por tal mudança sensorial? Levou a mão ao nariz, sentiu cheiro de ferrugem, conhecia bem aquele cheiro: sangue! Saiu correndo, pegando a toalha pendurada no boxe, o corpo embebido daquele liquido grotesco incomodava, mas a toalha não foi o suficiente pra secá-la. Abriu a porta do banheiro, estava tudo escuro, menos o estabilizador do computador, que mantinha sua pequena luz acesa, pensou então que se aquilo estava ligado... O computador então ligou de repente, quebrando a escuridão, na tela inicial pôde ver então, com aquela luz que em seu corpo não tinha nada de sangue, o cheiro sumiu também, sua nudez era até bela sob aquela luz. Uma tela se abriu então:

-Você é linda!

Sentindo medo e ao mesmo tempo uma gostosa sensação deu um passo para trás, a internet estava ligada sim, mas aquilo estava sendo escrito em uma tela totalmente estranha! Enquanto tentava racionalizar aquela situação maluca se viu indo ate o interruptor, inútil, não acendia. Sentou ali, olhando para aquela frase, abaixou os olhos e ficou se observado, não era linda, apesar de seu corpo ser magro e esbelto, com quadris largos, seus olhos chamavam sim muita atenção, mas nada a ponto de ser chamada de linda... se levantou, deu as costa para o computador, pretendia ir para o quarto tentar tatear ate encontra algo para vestir, quando uma mão invisível tocou seu corpo, se arrepiou, estava sozinha em casa, mas como era bom ser tocada com tanto carinho! Parou, fechou apenas os olhos e sentiu uma mão aveludada acariciando-a, era loucura tudo aquilo, certamente um sonho, pretendia acordar? Talvez não...

Quando o sussurro de uma voz masculina chegou a seus ouvidos ela nem se importou:

-LINDA!

O coração disparado já dava sinais de seus descontrole, estava a mercê de uma força alem de seus conhecimentos. Quando teve novamente a sensação de ser envolvida por um liquido viscoso, não se importou, estava entregue àquela lassidão mórbida, como se sua alma planasse em nuvens e seu corpo fosse sugado para uma sepultura. Sentindo filetes de seu sangue escorrerem pelas pernas, sentindo seus pulsos abertos, e um frio cortante entrando pela fresta de uma janela distante, caiu, de joelhos, abriu os olhos, queria vê-lo, as mãos dele ainda a envolviam, e nem se assustou ao ver as asas negras dele, pois a achava linda e era tudo o que importava. Ele lambia as mãos cheias de sangue, a acariciava com volúpia, quando a fitou tinha esmeraldas reluzentes em suas órbitas, a beijou com o doce veneno da morte nos lábios. Se entregou como a um amante, não lutou, apenas se deu com uma única certeza, ele a achava linda!

T Sophie
Enviado por T Sophie em 17/08/2007
Reeditado em 16/04/2010
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